XV

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Eu esperava encontrar um sedã prateado para que pudesse desembuchar tudo o que havia entalado em minha garganta ao mesmo tempo em que desejava que Jayden tivesse tido um surto de consciência e dado meia volta para se desculpar. Porém, em minha frente, um monstrinho marsala perolado estava parado um pouco em cima do meio fio e em minha direção vinha um homem alto e de ombros largos, que não havia sequer se preocupado em bater a porta do carro ao sair.

De repente assim, meu pesadelo havia se transformado num sonho em um passo de mágica. Apesar da rua escura e a garoa forte que caía em minha frente, meus olhos não precisavam se esforçar muito para identificar quem se tratava. Não era difícil reconhecer aquela silhueta, principalmente quando a conhecia tão maravilhosamente bem.

– Flávia! – sua voz envolveu meu corpo trêmulo como um sopro de vento quente, juntando os frangalhos que meu âmago havia virado.

A familiaridade era algo mais que bem-vindo em uma situação completamente fora do comum como aquela. Assim como o dono daquela voz que havia conseguido acalmar um pouco da tormenta de dentro de mim.

Mais do que rapidamente ele retirou o pesado casaco de couro que usava e sem hesitar o colocou sobre meus ombros, me protegendo daquele vento frio e da garoa leve que havia começado a cair. A jaqueta ainda guardava o calor de seu corpo, mas mais do que isso, nela continha a perfeita combinação do almiscarado de seu perfume e pós barba, misturado ao seu delicioso cheiro de pele limpa, que alastrou uma onda de calor que me envolvia de dentro para fora.

– Céus, eu sequer acreditei quando a vi de longe. O que faz aqui sozinha, meu anjo?

Eu não sabia o que responder, minha mente não conseguia formar um pensamento coeso que fosse e o homem em minha frente me olhava preocupado, provavelmente temendo que eu tivesse entrado em uma espécie de transe ou choque. O alívio era tanto que sentia que meu corpo era capaz desfalecer com qualquer reação que tivesse.

– Guilherme, eu... – eu tentei proferir algumas palavras, explicar o que estava acontecendo e dizer o quão feliz estava em vê-lo, mas minha voz embargava com o nó em minha garganta. Me impedindo de prosseguir.

As lágrimas que pareciam rir de mim desde o momento em que havia deixado o hotel, finalmente escorreram pelo meu rosto e traziam consigo uma penca de soluços que sacudiam meu peito.

– Hey... – um suspiro fundo fez seu peito inflar de alívio ao ouvir minha voz e no instante seguinte, Guilherme já me tinha em seus braços. Envolvendo meu corpo com o seu, me aninhando em seu peito largo e quente. – Está tudo bem, eu estou aqui!

E ali, naquele casulo feito de Guilherme, eu me permiti desfalecer. Agarrada a sua camiseta de algodão, chorando aos prantos e temendo que aquele homem de alguma forma sumisse dali.

Talvez alívio não fosse a sensação certa que estar naqueles braços conhecidos trouxera para mim, ou melhor, não era apenas alívio. Era como se eu pudesse finalmente voltar a respirar, era como voltar à superfície e dar oxigênio aos meus pulmões após quase se afogar.

– O que aconteceu? Alguém a machucou? Foi o imbecil do dono do bordel de novo, não foi?! – Guilherme perguntou preocupado, pressionando-me com mais força contra si. A minha resposta às suas perguntas foi dada com um acenar negativo com a cabeça, ainda que não tivesse tanta certeza se não havia mesmo sofrido algum dano.

Fisicamente eu estava bem, inteira, mas a humilhação que sentia havia deixado meu interior aos cacos.

– Só me tira daqui, por favor... – eu pedi sob meu fôlego, reunindo forças para falar em meio aos soluços.

– Agora mesmo, anjo. Vamos para o meu carro, você está uma pedra de gelo!

Guilherme conseguiu nos guiar até seu carro sem separar meu corpo necessitado por seu contato do dele, nos distanciando apenas o tempo suficiente para que ele tomasse seu lugar no banco do motorista. O calor de seu carro não apenas fizera meu corpo relaxar com o aconchego conhecido como também a diminuir as batidas frenéticas de meus dentes pelo frio que sentia.

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