COSMOS E CHAOS - Uma história sobre amor.

CAPÍTULO II - GARÇONETE

-  Eu não acredito que você está indo lavar essa merda desse carro de novo! - Lilian reclamou, com as mãos na cintura. O sol estava rachando e a loira ia andar de bicicleta.

-  Pelo o que eu me lembre o carro é meu e eu paguei por ele. - Ângelo respondeu de forma ríspida - E também vou pagar pela limpeza. - Colocou seus óculos escuros e ligou o carro - Você quer vir? - Ergueu uma das sobrancelhas, torcendo para a prima negar.

- Eu não, eu vou pedalar. - Balançou o guidão, o mais velho deu de ombros e só partiu com o carro, muito feliz de poder ficar sozinho, suas aulas na faculdade começavam no dia seguinte e ele estava super ansioso.

Lilian era obrigada a andar estilosa mesmo quando queria sair desarrumada, então suas roupas de exercícios eram todas lindos conjuntos de marcas que ela já modelou ou promoveu.

- Tia Nê, eu vou sair! - Gritou pela porta e trancou, saiu pedalando meio sem rumo pelas ruas da zona sul, que estavam estranhamente vazias.

Estava com seu MP3 tocando músicas variadas que salvou, andava com a bicicleta tranquilamente pelas ruas, olhando em volta e se perdendo em pensamentos.

Pensava no trabalho, que suas aulas começavam amanhã, estava entrando no primeiro colegial, com 15 anos. Não tinha medo, não era uma aluna impecável, mas era inteligente e ela sabia muito bem que era. Deu um sorrisinho mínimo pensando nisso, era inteligente.

Lilian era linda, inteligente, rica e muito divertida, sabia bem disso. Ela sabia e sabia se aproveitar disso, sabia bem que um punhado de dinheiro comprava muita gente. Se deixou viajar por alguns minutos.

Só percebeu que deixou de guiar a bicicleta quando estava em uma rua que nunca tinha visto antes, com casas bem mais pobres, buracos no asfalto, cheiro desagradável e até um cachorro magricelo que veio a acompanhando e latindo. Ela diminuiu o ritmo até estar parada e desceu, vendo que o animal ainda estava por perto.

- Porra, que sede... - Murmurou, molhando os lábios com a língua - O que houve, amiguinho? - Se curvou um pouco, notando que o cão estava sedento e possivelmente faminto, Lilian passou a mão em sua cabeça e sorriu - Você sabe onde tem um lugar que a gente possa comer, hm? - Continuou agradando o bicho, que se virou de costas e começou a andar, e ela o acompanhou pedalando preguiçosamente - E não é que sabia mesmo?

Depois de poucos minutos e duas quadras pedaladas, havia um bar vazio e uma garota de costas, organizando as bebidas na prateleira.

O bar era feio e só estava iluminado pela luz do sol, mas parecia bem limpinho e organizado, pelo menos.

- Oi. - Lilian cumprimentou baixo, mas ainda assim foi o suficiente para a atendente ter um espasmo e virar de imediato, com a mão no peito.

Quando ela se virou, o coração de Lilian também se acelerou, mas por outros motivos. Ela era linda demais, parecia um anjo.

- Oi, boa tarde! Como posso ajudá-la? - Abriu um sorriso doce e tranquilo, se aproximando mais do lado do balcão onde a loira estava. A moça não parecia nervosa igual ela, que até se esqueceu como falava e respirava e andava por alguns segundos.

- É... - Soltou uma risada meio nervosa, tentando se recompor - Você tem água aí? - Imediatamente se arrependeu, soltando mais um riso nervoso - Q-quer dizer, eu sei que tem água sim... - Estava se complicando mais e mais, agindo como uma esquisita total.

- Você quer gelada ou sem gelo? - Disse, se inclinando para alcançar as garrafas embaixo do balcão, segurando um riso.

- Quero gelada. - Respondeu, começando a corar um pouco.

- Hmm... - Se agachou de fato, voltando para o balcão com uma garrafa bem gelada - Você não é daqui, não é?

- Óbvio que não!  - Sorriu um pouco incrédula - Você não me conhece? - Sua expressão mudou rapidamente para curiosidade e um leve ar de arrogância.

A moça do balcão a observou da cabeça aos pés e subiu o olhar, analisando-a de cara fechada, franzindo um pouco a testa, ficou por mais alguns segundos observando a fisionomia de Lilian. Por fim, concluiu que a desconhecida era apenas uma garota muito bonita, mas não a reconhecia.

- Não, mil perdões...você já veio aqui? Ou me conhece do Freguesia? - Questionou, Lilian até pensou que talvez a garota estivesse tirando uma com a sua cara, mas tinha um ar sincero e inocente na pergunta. E mais, ela ainda estava intrigada com o quanto essa menina era linda. Deveria estar nas passarelas, não num bar.

-  Não, sou a Lilian. - Estendeu a mão.

- Sou a Priscila. - Apertou sua mão de volta - Pode me chamar de Pri, se quiser.

O olhar das garotas se cruzou por alguns segundos, mas por timidez Priscila virou os olhos para o outro lado. Ela se sentia intimidada pela beleza de Lilian, que era muito mais nítida que a sua.

- Priscila, me desculpa ser invasiva assim... - Pri se preparou para um comentário que não seria de seu gosto - Você já pensou em ser modelo? - Perguntou com um semblante sério, mas a morena começou a rir, uma risada doce e gostosa que acabou por fazer Li rir também, sem entender do que estava rindo – O que?

- Não, apenas não. - Balançou a cabeça em forma de negação, ainda com um sorriso no rosto. Seus dentes não eram exatamente retos, mas também não eram totalmente tortos, combinavam com seus lábios. Quando a loira abriu a boca para contestar, ela interrompeu – Bem, só isso?

- Você pode pegar um desses aqui? - Apontou para um salgado que estava exposto, Priscila pegou, enrolou num papel e a entregou. Ela esperou um agradecimento, mas raramente palavras educadas saíam da boca de Lilian.

- Deu... três e cinquenta. - Fez uns rabiscos em um papelzinho e a entregou, era a conta, que a outra pagou rapidamente – Obrigada e volte sempre. - Deu mais um de seus sorrisos educados que deixavam Lilian um pouco nervosa sem razão e acenou, a loira sorriu e acenou de volta enquanto saía, subia na bicicleta e se afastava um pouco do bar.

Ao se afastar, se sentou no meio fio ao lado de seu novo amigo e deu o salgado todo para ele, ela não podia comer aquelas porcarias. O cachorro se alimentou enquanto ela virava a água, deixando um pouco para o animal.

- É, bichinho... - Murmurou, dando a água na boca dele - Bonita ela, você não acha?

Ah, sim! Lilian é uma mulher bissexual. Como ela sempre esteve em contato com a mídia e com famosos, ela soube desde cedo sobre sexualidade e definiu a sua após beijar Elisa, uma garota da sua sala, no armário do namorado dela.

Nunca se importou muito, então se ela não se importa, ninguém deveria se importar e, de verdade, ela não está nem aí para o que falam ou deixam de falar dela, qualquer visibilidade é uma boa visibilidade.

O cachorro latiu um pouco, ela o pegou no colo colocou na cesta da bicicleta. Foram para casa juntos, Lilian com a cabeça em Priscila e, o agora Tobias, com a cabeça no delicioso salgado de salsicha que havia se empanturrado.