Capítulo 31: Eu sinto muito.

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Não voltei pro apartamento depois de deixar meus pais em casa. Preferi dormir lá e aproveitar a volta deles, já que Manu não havia mais falado comigo. Minha mãe estava me olhando de cara feia o jantar todo depois que eu expliquei a situação, resmungado sobre mulheres não poderem usar a roupa que querem porque homens são idiotas.

Eu subi para o meu quarto quando eles foram se deitar, pegando o violão que havia deixado ali para tocar um pouco. Não conseguia parar de pensar no que Manuela havia dito, parecendo tão magoada, que me fazia um buraco se abrir no meu peito.

—Escutei o violão. —Meu pai murmurou, entrando no meu quarto depois de bater na porta. Sorri ao vê-lo deixar uma cerveja na cômoda ao meu lado, antes de se sentar na ponta da minha cama bebendo um pouco da dele.

—Pensei que vocês já estavam dormindo. —Toquei mais um pouco, enquanto meu pai observava.

—Sua mãe desmaiou na cama. Mas eu achei que você poderia querer conversar. —Comentou, me fazendo soltar o violão ao meu lado e pegar a cerveja que ele havia deixado ali pra mim. —Você parecia um pouco tenso no jantar. Sabe que sua mãe não está brava com você de verdade, né? Ela quer conhecer a moça, na verdade.

—Eu sei. Só estou com a cabeça cheia. —Afirmei, dando de ombros, vendo meu pai soltar uma risada.

—Vocês dois brigaram? —Indagou, me pegando de surpresa. Olhei pro meu pai, vendo que ele estava encarando meu pescoço. Me remexi na cama ao perceber isso, sabendo perfeitamente o que ele estava vendo.

—Não, só não nos falamos direito hoje. Ela parecia super ocupada. Vou tentar vê-la amanhã. —Falei, erguendo a mão para esfregar o rosto, um pouco cansado. —Posso te fazer uma pergunta, pai?

—Pode, qualquer coisa. —Murmurou, me fazendo sorrir de leve, antes de pensar um pouco em como chegar no assunto.

—Se uma pessoa diz pra você que é adotado e que veio como um substituto, o que você pensaria? —Indaguei, erguendo os olhos para ver a expressão pensativa dele, com a testa franzida e as sobrancelhas unidas.

—Que os pais tiveram um filho antes, mas provavelmente alguma coisa aconteceu e eles resolveram adotar um. —Meu pai bebeu o resto da cerveja e colocou a garrafa no chão ao seu lado, antes de olhar pra mim com seriedade. —Mas eu gostaria de pensar que um pai e uma mãe não usaria outra pessoa como substituto de um filho. Ninguém merece passar por isso. —Ele ficou de pé, pegando a garrafa do chão e a que estava na minha mão, olhando pra mim com uma expressão cautelosa. —Filhos não são objetos, são um privilégio, Bernardo. Você foi um privilégio.

Meu pai tinha razão. Uma pena que nem todo mundo pensava como ele.

Manuela

O final de semana passou como um borrão esquisito. Não consegui sair do quarto, porque as poucas coisas que me lembrava da sexta a noite me dava vontade de entrar em um buraco e desparecer. Eu achava que não dava para ir mais fundo do poço ainda, mas estava completamente errada. Eu consegui me superar.

Evitei Bernardo o máximo que conseguia, porque não conseguia pensar em como falar com ele. Toda vez que eu pensava em mandar mensagem ou vê-lo, o calor se espalhava pelo meu rosto, porque me lembrava de ter tirado as roupas na frente dele, assim como praticamente implorar para ir pra cama dele.

—Merda, merda, merda! —Gemi, fechando meus olhos com força antes de esfregar minha testa, puxando meu rabo de cavalo. —Se concentra, Manuela. Se concentra, por favor.

—Tudo bem, Manuela? —Ergui os olhos, vendo meu professor me observando do outro lado do laboratório, parecendo preocupado.

—Sim, professor. Eu já estou quase terminando aqui. —Falei, apontando para os tubos de ensaio na minha frente, em meio a minha bagunça na bancada.

—Tudo bem. Eu preciso ir pegar uns papéis no outro prédio. Se você sair antes de eu voltar, por favor, feche a porta. —Ele se encaminho até a saída quando concordei. Mas tinha certeza que ainda estaria ali quando ele voltasse, porque meu cérebro não estava colaborando, assim como todo maldito dia.

Ele saiu do laboratório, deixando a porta aberta. Eu estava sozinha, porque tinha um tempo livre depois da aula de mais cedo e aproveitei para terminar um trabalho sobre ph de algumas substâncias. Precisava testar a maioria delas e ver que cor apresentavam, assim como seu ph, anotando tudo no meu caderno no processo.

Meu coração disparou como um raio no meu peito quando Bernardo entrou no laboratório, usando aquele jaleco branco, enquanto o óculos estava sobre seus cabelos. Meus lábios se comprimiram quando o constrangimento ameaçou me engolir, mas respirei fundo e ergui a cabeça para encara-lo, vendo ele fechar a porta.

—Oi. —Murmurei, abaixando os olhos para os tubos de ensaio na minha frente. Faltava só mais um teste. Se eu fizesse rápido, podia ir embora rápido também.

—Oi, Manu. —A voz dele pareceu tranquila quando se aproximou de mim, observando meu rosto com cautela, como se não soubesse o que esperar de mim. —Atrapalho?

—Não, já estou terminando. É só um teste de ph pra um trabalho. —Dei de ombros, soltando um suspiro baixo, com meu coração entalado na garganta. Queria desesperadamente pular em cima dele e o abraçar, ao mesmo tempo que queria sair correndo daquele laboratório.

—Sabe qual teste eu preciso fazer pra saber se estou sendo ignorado? —Indagou, me fazendo travar, percebendo o quão merda a situação era. Coloquei o tubo de ensaio no suporte, vendo ele adquirir uma coloração verde, antes de erguer os olhos para Bernardo.

—Eu sinto muito.

—Pelo que? —Indagou, erguendo uma das sobrancelhas.

—Por ter ficado bêbada. Por ter implorado pra ir pra sua cama. Por ter tirado a roupa na sua frente... —Meu rosto pegou fogo, me fazendo parar de falar. Arranquei as luvas das minhas mãos e tirei o óculos. —Por qualquer merda que eu possa ter falado.

—Acho que você se esqueceu de algo. —Ele tirou o óculos e colocou sobre a bancada, puxando a parte de cima do jaleco, onde pude ver a marca roxa de um chupão. Puta merda, eu não fiz aquilo. Aquilo não pode ter sido eu. Acho que posso me desmanchar nesse exato momento.

—Bernardo...

—Não quero que você me peça desculpas. Quero que pare de me evitar. —Afirmou, tão sério, me olhando como se pudesse ver cada cantinho da minha alma.

Algo dançou no meu estômago quando ele começou a dar a volta na bancada, se aproximando cada vez mais de mim, com meu corpo reagindo a ele como se fosse a única coisa que eu precisasse naquele momento. Minha boca ficou seca quando ele parou na minha frente, erguendo a mão para colocar uma mecha de cabelo atrás da minha orelha, que havia se soltado do amarrador.

—O que acha de a gente parar de brincar? —Ele me empurrou até eu estar presa entre a bancada e ele, segurando minha cintura e minha nuca, enquanto inclinava o rosto para perto do meu até nossos narizes se roçarem. Meu coração explodiu quando senti a respiração dele contra minha, enquanto seus olhos faiscavam sobre os meus.

—Estamos no laboratório. —Sussurrei, o calor queimando nas minhas veias quando aquela faísca entre nós ameaçou explodir. —O professor vai voltar a qualquer momento.

—Então é melhor nós sermos rápidos, pra ele não pegar a gente. —Ele mordeu meu lábio, fazendo o calor se espalhar pelo meu corpo antes de finalmente me beijar, devorando cada pensamento racional meu quando senti seu gosto e sua boca reivindicando a minha. 



Continua...

Todos os "eu te amo" não ditos / Vol. 1Onde histórias criam vida. Descubra agora