As duas semanas que se passaram foram simplesmente as melhores da minha vida. Eu finalmente estava indo bem em cálculo, graças a todas as aulas que Bernardo estava me dando no seu tempo livre. Continuei indo ver seus jogos durante as terças, assim como ia no bar vê-lo tocar nas sextas.
Ele dormiu no meu apartamento algumas vezes e em outras eu me obrigava a expulsa-lo de lá, porque Érika estava começando a perguntar se não era mais fácil ele se mudar logo para o meu apartamento. Aquilo era engraçado, porque não havíamos dado nome nenhum ao que tínhamos. Mas no final das contas, eu ia conhecer os pais dele, porque pelo que parece, a mãe dele estava ansiosa demais por isso.
—Tudo bem? —Indaguei, porque Bernardo havia colocado o cinto de segurança e estava encarando o volante do carro a algum tempo, assim como olhava uma vez ou outra para a chuva que desabava na cidade naquele dia.
—Sim, eu só... —Ele riu, balançando a cabeça negativamente. —Nada. Esquece.
—Podemos ir de Uber se quiser. —Falei, vendo ele esfregar as mãos na calça, antes de olhar para a chuva do lado de fora com a testa franzida e os lábios comprimidos, como se não estivesse gostando do que estava vendo.
—Não, está tudo bem. —Ele suspirou e ligou o carro, lançando aquele sorriso confiante pra mim antes de irmos. —Meus pais já devem estar nos esperando.
Concordei com a cabeça, sem saber ao certo o que dizer. Não tinha muita certeza do que esperar dos pais dele. Nessas duas semanas Bernardo me contou várias coisas sobre eles e sua infância. Não posso mentir, fiquei com um pouco de inveja por ver que ele tinha pais tão amorosos.
No fundo, eu queria ter tido essa sorte também. Não falava com meus pais desde a fuga de Nina. Havia parado de ligar pra eles. Voltei a ir toda semana na psicóloga, que estava me ajudando muito pra falar a verdade. Mas eu tenho a leve impressão que parte disso também é graças a Bernardo e sua paciência comigo. Ele nunca me pede nada. Ele nunca espera nada de mim. Ele fica feliz apenas em me ver sorrindo.
As vezes fico me perguntando se estou ficando louca. Mas quando olho pra ele, sei exatamente o que está acontecendo comigo. Não tenho coragem o suficiente de dizer em voz alta, mas sei que aquilo estava se tornando maior do que qualquer coisa que eu já havia sentido por outras pessoas antes.
Bernardo ficou em silêncio o caminho todo, parecendo tenso toda vez que um carro passava por nós ou a chuva aumentava. Comecei a me perguntar se estava chovendo no dia que ele havia sofrido o acidente. Já havia o visto dirigir outras vezes e apesar de não parecer muito feliz em pegar no volante, essa foi a primeira vez que o vi tenso de verdade.
Os pais de Bernardo moravam em Jurerê, o que me deixou um pouco desconfortável enquanto observava todas as casas enormes e bonitas dali, que eu provavelmente nunca teria dinheiro suficiente para comprar ou sequer alugar a porcaria de um quarto. Mas eu deveria ter imaginado algo assim quando ele citou no que os pais trabalhavam.
—Tudo bem? —Bernardo olhou pra mim quando estacionou o carro em frente a uma casa enorme. Mais no final da rua, eu podia ver a entrada para a praia e então o mar em meio a chuva.
—Eu não pensei que você fosse rico. —Falei, um pouco sem graça, pensando no meu pobre salário do mercado.
—Eu não sou rico. —Ele riu, enquanto eu observava o portão da garagem se abrir. —Meus pais são.
Ele entrou com o carro, estacionando atrás de outro, que provavelmente era de seus pais. Desci do carro, observando o porão se fechar e abafar a chuva do lado de fora. Pela primeira vez desde que entrou no carro, Bernardo relaxou ao tirar o cinto e descer também, abrindo um sorriso pra mim.
—Pronta pra conhecer meus pais? —Indagou, abrindo a porta de trás para pegar sua mochila e a minha, já que estávamos prestes a passar o final de semana ali. Não vou negar, estava um pouco nervosa. Mas também estava animada pra entrar na vida dele e conhecer mais uma parte de quem ele era.
—Não. —Fui sincera, o que o arrancou uma risada enquanto eu dava a volta para encontrá-lo do outro lado. —Mas posso fazer isso com você.
—Não precisa se preocupar, minha mãe já te adora de tanto que me ouviu falar de você. —Ele piscou pra mim, me puxando em direção a porta. —E meu pai não está logo atrás. Eles são super de boa, eu prometo.
Eu pretendia dizer que confiava nele, mas a porta se abriu, quase batendo nele quando uma mulher apareceu, abrindo um sorriso enorme quando viu Bernardo e então eu. O mesmo sorriso do filho e as mesmas covinhas adoráveis nas bochechas.
—Manuela? —Ela veio na minha direção, ignorando completamente Bernardo, que riu com a animação da mãe quando confirmei. —Finalmente eu estou te conhecendo. Pensei que esse desnaturado do meu filho nunca ia te trazer até aqui. —Ela me abraçou apertado, quase tirando todo meu ar. —Seja bem-vinda. Eu sou a Eloísa, mãe do Bernardo.
—Obrigada, é um prazer conhecê-la. —Eu a abracei de volta, vendo a expressão fascinada de Bernardo ao observar nós duas.
—Oi pra você também, mãe. Senti saudades. —Bernardo murmurou assim que ela se afastou de mim, passando o braço ao redor dos meus ombros.
—Se tivesse sentido mesmo, teria aparecido aqui antes! —Ela apertou uma das bochechas dele quando passamos, me levando pra dentro. —O que você gosta de comer, Manu? Vou fazer um almoço especial pra gente hoje.
Eu não demorei muito para perceber de quem Bernardo tinha puxado aquele jeito encantador, doce e gentil. Sua mãe era maravilhosa, me tratando como se eu fosse parte da família. E eu desejei muito poder fazer parte daquela família, nem que fosse por algumas horas.
Continua...
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Todos os "eu te amo" não ditos / Vol. 1
Roman d'amourManuela tem certeza de uma coisa na sua vida, ela não quer ser um peso pra absolutamente ninguém. Ser independe é seu maior sonho e ela sabe que pra isso precisa se concentrar 100% no curso de química que sempre foi o seu maior sonho desde pequena...