33 - Café de Mãe

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Lucas desceu da balsa e aguardava na fila de espera para embarcar em um táxi. O dia ensolarado e absurdamente quente beirava aos 34ºC, fazendo o suor lhe escorrer pelo pescoço e pelas costas. A fim de diminuir a mancha que ia se formando nos ombros e axilas da camisa, ele carregava a mochila na mão.

Além de suado, Lucas estava cansado. A cabeça doía e os olhos queimavam pela falta de sono, e nem os óculos escuros inibiam o incômodo causado pela claridade. Não foi um pesadelo durante o sono que o manteve acordado dessa vez, mas o pesadelo da vida real.

Mais uma gota de suor fez sua nuca coçar, ou talvez fosse um mosquito. Ele levou a mão ao pescoço e esfregou a região, se sentindo meio idiota por não ter ido de carro, já que agora, com a merda toda espalhada pelo ventilador, não precisava mais ficar se escondendo. Garcia o alertara que já sabiam onde ele estivera hospedado, então ele não precisava mais ficar andando de Uber para todo lado.

Lucas fez questão de deixar a pousada e avisar seu paradeiro ao parceiro, assim Garcia poderia comentar na delegacia que aquela história com Ana não passara de um boato. Isso iria protegê-la de qualquer associação, e poria uma pedra em cima da história deles.

A fila do táxi andou, e Lucas finalmente embarcou, agradecendo aos céus pelo ar-condicionado do veículo. O trajeto até a casa da mãe não costumava ser demorado, mas o caminho tortuoso e esburacado prolongava o tempo do percurso e revelava o descaso das secretarias públicas com a região.

No passado, o Guarujá era conhecido por abrigar mansões, casas de veraneio e empreendimentos imobiliários de alto padrão, no entanto, ao longo do tempo, o perfil socioeconômico da cidade mudou por conta da especulação imobiliária, da supervalorização de terrenos e da expansão do turismo de massa. Isso mudou significativamente a paisagem da cidade, mas não necessariamente onde a família de Lucas vivia, a região norte do Guarujá.

O bairro onde Lucas cresceu sempre foi modesto, com características residenciais simples em relação às regiões litorâneas. Ali, ele se sentia em casa, como em nenhum outro lugar. Quando desembarcou do táxi, sua mãe já o aguardava no portão.

– Meu filho, que saudades! – ela o abraçou e o beijou no rosto.

– Oi mãe. Senti muito sua falta também. É bom estar aqui.

Eles cruzaram o portão e ele cumprimentou Luís, o irmão mais novo, com um aperto de mão seguido de gestos esquisitos.

– E aí, moleque! O que anda aprontando?

– Ah, cara, tô pirando com a facul. Tá muito complicado, o ITA é muito puxado, quase não durmo mais. Ainda bem que já tô no final do curso.

– E você dormiu em algum momento do curso? Quando não está virado de estudar, fica de bar em balada. Toma jeito, moleque!

– Beleza, beleza... E você foi um santo na faculdade, certo? – Luís brincou, sarcástico.

– Lógico que fui! – Lucas riu e deu um soquinho no ombro do irmão – com auréola e tudo!

– Sei, sei... fiquei sabendo como você era especialista em auréolas...

– Cala a boca! – Lucas sussurrou, abafando o riso – a mãe vai ouvir!

– Eu já ouvi! – Helena gritou da cozinha enquanto preparava um café preto.

– Você vai pro inferno puxado pela língua! – Lucas ameaçou Luís, que saiu de perto rindo.

A idade dos irmãos era irrelevante quando se tratava de Helena. Não importava se eram adultos, casados ou até pais, ela continuava tratando-os como garotos que precisavam aprender a se comportar. As situações em família eram hilárias por conta disso.

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