60 - Quarto 312

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Ana caminhava de um lado para o outro dentro da casa. Já havia se passado horas desde que Lucas saiu sem dizer aonde ia, sem sequer mandar um recado para avisar se estava bem. Também não atendeu o telefone quando ela ligou, nem respondeu às mensagens enviadas mais cedo.

11h20 - "Lucas, eu estou preocupada..."

12h45 - "Por favor, venha para casa assim que puder, ou então me liga, preciso saber o que está havendo..."

Ela não conseguia parar de pensar na comoção da última conversa. Lucas tinha saído transtornado, algo muito grave devia estar acontecendo. Ela chegou a ligar para Antônio perguntando se estava tudo bem por lá, e se por acaso Lucas chegara a falar com ele, mas Antônio negou ter tido contato com Lucas. Preocupada, Ana tentou ligar mais uma vez, mas a ligação caiu direto na caixa-postal.

15h27 - "Não importa o que esteja acontecendo, me diga o que é, me deixe ajudar, podemos resolver juntos..."

16h55 - "Lucas, apenas me diga que você está bem. Eu estou muito angustiada!"

O dia terminou sem notícias dele e Ana continuava deixando várias mensagens na esperança de que ele lesse pelo menos uma e retornasse. Ela pensou nas lesões que ele sofrera por ter sido baleado com o colete à prova de balas, e se lembrou de que ele estava sem farda e sem colete quando saiu. Sua mente criou cenários terríveis, um mais macabro que outro, então tentou ligar na DP, mas caiu numa chamada eletrônica de espera sem fim, e ela acabou desistindo.

18h20 - "Lucas, tem algo acontecendo comigo, preciso te dizer. Volta, por favor. Eu te amo..."

No início da noite, recebeu um telefonema de um número desconhecido e atendeu, agoniada.

– Alô, falo com Ana Soares?

Ana teve vontade de chorar ao ouvir o próprio nome completo. O dia todo sozinha em casa sem notícias de Lucas, o dia todo imaginando coisas, e agora isso.

– Sou eu mesma. Quem está falando?

– Boa tarde. Sou o policial Silva, estou ligando para falar a respeito do agente Russo.

Ela demorou um tempo para entender de quem se tratava. Sua aflição era tamanha que por um instante se esqueceu de que Russo era o sobrenome de Lucas. Suas entranhas deram um nó e o ácido estomacal chegou ao esôfago queimando tudo no caminho.

– S...sim?

– O seu nome consta na lista de contatos de emergência. Precisamos que venha até o hospital.

Ela pensou que o coração ia sair pela boca, e se sentiu bem idiota pela pergunta que ia fazer, afinal, podia ter ouvido errado.

– Por quê? – Sua voz saiu infantil demais, como de uma criança assustada.

– Bem, achamos melhor conversar pessoalmente, mas, em resumo, o investigador Russo esteve envolvido em um tiroteio e acabou sendo baleado – o agente aguardou até que Ana absorvesse a informação, então continuou – ainda não tenho detalhes sobre o estado de saúde dele, mas ele está sendo transferido para um outro hospital neste momento.

– O QUÊ? – Um zumbido entupiu os ouvidos de Ana – onde? Como? Para qual hospital o estão levando?

O policial passou as informações a Ana, que sem pensar em mais nada, saiu da casa, correu até a portaria e pediu um táxi para o Hospital das Clínicas de São Sebastião. No trajeto, ligou para Antônio.

– Pai... O Lucas! Ele, ele...

– Se acalma, Ana! O que houve?

– Ele foi machucado em serviço e eu estou indo pro hospital saber mais. Quando tiver notícias eu te ligo ok? Reza por ele, pai... Ele me disse que lesões por bala costumam ser muito graves, até fatais, e ele estava sem o colete, oh Deus... – ela não conseguiu conter as lágrimas.

"Isso não pode estar acontecendo, não, não, não..."

Depois de um trajeto angustiante que o taxista, compreensivo, fez em tempo recorde, ela desembarcou em frente ao Pronto Socorro. Imediatamente, dois policiais com roupas pretas parecidas com as de Lucas vieram em sua direção.

– Ana Soares? – O policial mais novo perguntou.

– Sou eu, onde ele está? – ela quase gritou.

– Eu sou o agente Silva, que falou com você mais cedo. Esse aqui é o agente Tavares. Nos acompanhe por favor – Tavares a escoltou direto até o andar superior. Por estar acompanhada pela polícia, ela não precisou se identificar na recepção.

Durante o trajeto, as mãos de Ana não paravam de tremer. Estava apavorada com o que podia ter acontecido... Não tinha conseguido contar a Lucas que teriam um bebê...

– Ana?

Ana e os policiais voltaram a atenção para um médico residente que estava parado no corredor. Ela se lembrava vagamente dele, da última vez que saíra com os amigos. Tentou se lembrar do nome, sua cabeça estava uma bagunça de sentimentos, medo, angústia... Talvez ele tivesse informações, como era mesmo o nome dele? Silvio... Sandro...

– Sérgio?

– Tudo bem com você?

– Sim, eu...

– Desculpe, doutor, estamos com um pouco de pressa. – Os policiais interrompem a breve tentativa de diálogo.

– Posso ajudar com algo? – Dr. Sérgio perguntou, solícito.

– No momento só precisamos seguir por este caminho, precisamos ver um paciente. Tenha um bom dia – Silva conduziu Ana pelo braço, ela olhou para trás e cruzou o olhar com Dr. Sérgio, que fez um aceno de cabeça, continuou pelo corredor no sentido contrário e desapareceu numa curva mais adiante.

A cada passo que dava, Ana sentia o corpo trêmulo de ansiedade. O peito apertava como se houvesse uma fratura em sua caixa torácica, e ficava cada vez mais difícil respirar. "Meu Deus, que ele fique bem, por favor..."

O policial a conduziu ao andar superior e se deteve diante de uma porta fechada. Quarto 312. Tavares abriu e Ana entrou.

– Espere aqui.

Ana se viu parada no que parecia ser um quarto de internação, porém vazio. Confusa, ela se voltou para o policial, que a surpreendeu segurando-a contra o próprio corpo enquanto pressionava uma gaze embebida em uma substância de cheiro forte e adocicado contra seu nariz. Ela se debateu por alguns segundos, mas sentiu o entorpecimento seguido por uma profunda escuridão, e então, desfaleceu.

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