43 - Fantasmas

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Na manhã seguinte, Lucas acordou sozinho na cama. Por um breve instante, devido ao torpor do sono, ele se perguntou onde estaria Alice. Observou a porta do banheiro fechada e sentiu-se um pouco confuso, sem lembrar dos últimos acontecimentos, até que a porta se abriu e Ana saiu de lá, enrolada em uma toalha.

Aturdido, Lucas finalmente se lembrou. O momento foi tão chocante para ele que, quando Ana deixou a toalha cair e se deitou ao seu lado, ele não conseguiu reagir.

Ana percebeu a confusão de Lucas assim que saiu do banheiro. Tinha se levantado mais cedo e decidido aproveitar a hidro, um luxo com o qual não estava acostumada. Saíra do banho renovada e cheia de vontade de se enroscar com ele na cama, mas ao entrar no quarto, o viu com o rosto assustado, olhando através dela, como se ela fosse uma estranha.

Mesmo considerando o estado sonolento dele, ela se sentiu repentinamente deslocada e desconfortável. Incerta, aproximou-se e o abraçou, mas ele permaneceu imóvel, sem reação.

Lucas sentiu o abraço de Ana e tentou organizar seus próprios pensamentos. "Que merda foi essa? Por que estava pensando em Alice?"

Imaginou que talvez fosse porque havia dormido na suíte principal da residência depois de tanto tempo. Envergonhado, levantou-se bruscamente e evitou olhar para Ana. Ela não reagiu bem à sua retração e tocou-lhe o ombro de forma contida.

– Lucas, está tudo bem?

Como explicar a ela o que ele estava sentindo? Nem ele conseguia entender.

­– Está sim... está tudo bem. ­– ele mentiu, ainda sem encará-la nos olhos.

­– É óbvio que não está. – Ana sentiu uma pontada de insegurança, pois Lucas evitava olhá-la nos olhos. Desde que se conheceram, ele nunca fizera isso. Pelo contrário, seu olhar sempre fora como um scanner capaz de perfurar a alma.

Lucas tentou encontrar palavras, alguma forma de se comunicar com ela sem fragilizar o que acabavam de começar. Sem sucesso, dirigiu-se ao banheiro e fechou a porta. Ana permaneceu na cama, sozinha e confusa. "Talvez ele não esteja se sentindo bem..."

Lucas trancou a porta e apoiou as mãos na pia. Não havia necessidade de se trancar, mas ele se sentia perdido. Sentou-se na borda da banheira e baixou a cabeça, suas mãos envolveram as laterais do crânio e apertaram, como se o gesto pudesse fazer as coisas se encaixarem ali dentro.

Por um breve momento, entre o sono e a lucidez, era como se o tempo não tivesse passado e ele estivesse em uma manhã qualquer há dois anos. Quando finalmente se deu conta, o vazio deixado por Alice se tornou imenso e opressivo.

Talvez ele não estivesse pronto. A morte de Alice ainda era muito recente, e em vez de permitir-se o luto, chorar a perda e se recuperar, ele se enfiara numa busca insana por culpados e, nesse processo, encontrara Ana, uma mulher incrível por quem indubitavelmente estava apaixonado.

Constatar isso não ajudou em nada; na verdade, esse era o verdadeiro problema. Ele sentia tristeza pela perda da ex-mulher e, ao mesmo tempo, uma necessidade contundente de estar com Ana. Era como se estivesse traindo as duas ao mesmo tempo.

Será que poderia confiar em seus próprios sentimentos? Estaria assim tão apaixonado por Ana, ou apenas pela ideia de que ela poderia salvá-lo de si mesmo? A carência pungente que sentia em relação a Ana estaria fundamentada no esfriamento de sua relação anterior? E o fato de saber que Alice morrera tentando salvá-lo era o que aumentava sua culpa e sua incerteza em relação a tudo?

Por que ele tinha que ser tão mentalmente fodido?

– Lucas, você está bem? – Uma breve batida na porta o fez se mover.

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