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PARTE 1: A PRISÃO DE CORAIS

Terra | Tempos Antigos

A maresia brinca com os cabelos de Alma Hawlett, que segura-se com firmeza em um dos postes da proa. Seus cabelos negros, com mechas acinzentadas — em contraste com sua aparência jovial —, encaracolados artificialmente, estão completamente soltos. Seu colo exposto, carregando um lindo colar dos rubis mais brilhantes do continente, que combinavam especialmente com suas vestes delicadas de cores belas como as nuvens. Sem o espartilho, devido a gravidez, ela sentia suas costas mais instáveis do que o normal. Todavia, aquilo não importava tanto; logo seu herdeiro — ou herdeira — estaria em seus braços. Ela olha para trás quando pensa nisso, diretamente para seu marido, Damon, que papeava com gosto sobre futilidades acompanhado de uma boa taça de vinho tinto e seus dois mais queridos amigos, Héktor e Vangelis.

Damon, irmão mais novo de Bartolomeu Hawlett, se apaixonou por Alma desde que foi lhe apresentada pela primeira vez; como esposa de seu querido irmão. Em cinco meses, Alma se divorciou de Bartolomeu por pura insatisfação, encontrando, enfim, conforto nos braços de Damon Hawlett. Conforto o suficiente para gerar, certamente, uma ou duas crias da mais pura genética: a união de dois Hawletts de sangue. Alma não é uma mulher que costuma se arrepender de suas ações, e ela ama Damon como nunca amou Bartolomeu.

— Cavalheiros — saúda ao se aproximar da mesa.

— Alma! — Vangelis Zarvos, que definitivamente já havia passado de sua primeira e segunda taça, a cumprimenta levantando a peça de cristal. — Sente-se conosco, minha amiga.

Legítimos, em sua maioria, costumavam ser mais abertos a companhias femininas sem que tal coisa gerasse escândalos. Mas a época não garantia tal coisa como antes já garantiu. Por isso, uma das partes prediletas de Alma, com aquele grupo, era sua cumplicidade e respeito. Não um respeito em que a tratassem como idiota; pelo contrário, eles a temiam. Alma nasceu para ser temida.

Ela aceita o convite e logo Héktor puxa uma quarta taça e a oferece, com menos vinho que as outras — porque ela estava grávida. Após o primeiro gole, seus ombros relaxam e ela suspira. Considera um verdadeiro deleite desbravar os oceanos.

Desta vez, eles viajam para o Norte, acompanhados dos Williams, aliados humanos. O grupo os protege e trocam conhecimento sobre a vida, como fizeram com muitos outros grupos de mortais que já viram ir e vir. A vida de um mortal nunca será longa e próspera o suficiente para que realmente evoluam. O que é trágico, já que muitos dos mortais que conheceram ao longo da vida possuíam um coração puro e muito potencial. Os Williams, agora, cuidavam do leme. Héktor observa o horizonte com vigor.

Há pouco tempo, tornou-se líder das tribos Helus e Bellarose, acabando com uma rixa que existia há tanto tempo que talvez deva até ter nascido com as mesmas. Seu coração se enche de esperança e adrenalina quando pensa no peso de seus sobrenomes; nos poderes que porta; no que seria e será capaz de fazer no futuro. A viagem, na verdade, era justamente a negócios. Ele procura por uma página branca em seu diário, e rabisca alguns pensamentos momentâneos antes que sumam de sua memória.

— Qual será o nome, se for menino? — Pergunta Vangelis, como se fosse a primeira vez que perguntasse. De qualquer forma, ele estava bêbado e certamente não se lembra da resposta. Alma sorri, posicionando as mãos sob a barriga que já se mostrava avantajada, quase instintivamente.

— Olivier. Ainda assim, não tenho certeza se é um menino — pisca.

— Alma disse que, há algumas semanas atrás, sonhou que traria uma menina ao mundo — constata Damon Hawlett. — Talvez tenha sido apenas um sonho.

— Talvez não — reprime, convencida.

— E qual seria seu nome, afinal? Pensei que não houvessem ideias para nomes femininos — lembra Vangelis, enchendo a taça novamente. Héktor o impede de levá-la à boca, arqueando uma sobrancelha, e o Feiticeiro faz careta.

— Surgiu um, na verdade — instiga Alma.

— Ora — pestaneja o Feiticeiro, rendendo-se ao ultimato de seu amigo quanto a quantidade de vinho que já consumiu —, qual será, então?

— Joah. Joah Hawlett.

Quebradora da MaldiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora