TREZE

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Tudo acontece lentamente, como se cada parte da minha pele demorasse em processar a quantidade exacerbada de água que nos rodeia. Minha pele queima pelo frio e a aversão e o pânico tomando conta de mim. Sinto as mãos de Peter segurando meus ombros e chamando meu nome enquanto seguro minha respiração e talvez eu tenha me esquecido de como nadar. Meus olhos ardem fechados porque quero chorar e já quero voltar para a superfície mas é impossível.

O silêncio que bloqueia meus ouvidos é familiar aos meus traumas e eu tento nadar para cima mas não consigo porque as mãos de Peter ainda me seguram e quero gritar para que ele me solte e para que abortemos esta missão porque serei psicologicamente incapaz de prosseguir nas atuais circunstâncias. O lado racional do meu cérebro grita mais alto do que qualquer outra parte de mim e me impede de acreditar que é fisicamente possível respirar debaixo d'água mesmo que muitas coisas já tenham provado a mim mesma que o impossível é infelizmente uma possibilidade existente em Myliand e meus pulmões ardem com a falta de ar.

O ciclo está se repetindo.

Callia, você precisa respirar — ouço Peter dizer. Sua voz soa abafada pela água e eu gostaria de dizer que não não não eu não consigo respirar POR FAVOR ME TIRE DAQUI E ME DEIXE SUBIR.

Eu não vou sobreviver.

Se eu inspirar, a água irá invadir meus pulmões como quando fez da última vez e então eles queimarão inundados até que eu me sinta morta.

Eu vou morrer.

Tento chutar Peter para longe, me desvencilhar de seus braços a qualquer custo mas ele se recusa a se afastar e seu toque é firme demais para que eu consiga fazer qualquer coisa se não aceitar meu destino e encarar a morte como fiz da última vez.

Será que ele não percebe que vou morrer?

Eu preciso resistir, eu preciso dizê-lo que a superfície me fará melhor mas não consigo me obedecer e não consigo olhar em seus olhos e implorar para que me solte e ele continua suplicando para que eu respire mas eu não consigo respirar porque é impossível e eu preciso voltar para a caravela.

Está frio demais.

Quando já é impossível obedecer meus próprios comandos e o instinto natural se possui de meus movimentos, meu corpo respira fundo.

Era como se mil pensamentos coubessem em um milésimo de instante e eu tivesse tempo para pensar sobre a morte e minha vida e me preparar para a água tomando conta de mim, tirando meus sentidos e minha vida lenta e cruelmente na frente de meu irmão.

Porém nada disso acontece.

Por um momento, me pergunto se estou mesmo debaixo d'água. A confusão apodera-se de mim e abro os olhos com o cenho franzido e a respiração irregular e tensa. Vejo Peter na minha frente, seus olhos arregalados tentando encontrar os meus desesperadamente, esforçando-se para entender o que diabos acabou de acontecer. Olho em volta.

Água.

Nós estamos debaixo d'água.

Consigo enxergar perfeitamente.

Vejo-me hiperventilando e isso piora meu desespero.

Eu consigo respirar aqui?

Estou sonhando?

Claro que não, tola...

Peter chacoalhou meus ombros, obrigando-me a olhar em seus olhos novamente.

— Callia. Foco.

— Como... como eu...

— Se você se descontrolar, nós podemos nos afogar de verdade. E você não quer isso, certo? — Ele fala comigo com calma, fazendo uma breve pausa entre cada uma das palavras. Seu tom seco passivo-agressivo usual deixa sua voz completamente e ela assume um tom neutro que acho que nunca ouvi antes. Faço que não com a cabeça. — Foi o que eu pensei. Então inspire fundo, devagar. Vamos, você pode confiar em mim, vamos fazer juntos. Inspire.

Quebradora da MaldiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora