Quebradora da Maldição

VINTE E NOVE

Arquipélago das Fênix

LOWAN WYVERN, E NÃO LOWAN HAWLETT. Esta frase se repete em sua mente atordoada durante toda a viagem de volta à Keres, que passa completamente em silêncio, trancado em um aposento qualquer da caravela. Então por que não disseram antes? Por que foi aceito que meu pai era um Hawlett há poucos meses atrás, porém agora ele é um príncipe? Isso tudo mal é a parte mais importante, ou seu pensamento mais frequente da tarde. Talvez seu sobrenome atado ao passado misterioso de seu pai seja sua segunda maior preocupação. Céus, ele não vê o pai há meses. Também não é como se essa parte o importasse tanto, depois que sua última interação tenha sido um tanto quanto memorável.

Contudo, sua preocupação número um é Callia.

Aquelas palavras foram cravadas com mais profundidade do que suas cicatrizes alcançam. Um tiro seria menos doloroso. Você não me conhece. Você não me conhece. Você não me conhece. Se ele repetir mais algumas vezes, talvez ele passe a conhecer a si mesmo. Ao menos é isso que ele espera.

E como Lowan Hawlett está sozinho. Mais sozinho do que nunca, caminhando para um futuro de luxúria e ainda assim nunca esteve tão perdido. Ele poderia deixar sua tentação o vencer agora. Isso soa muito bem para o momento. Que nojo.

O garoto repele o pensamento imediatamente, sentindo o suor frio escorrer de suas têmporas. Não aja como sua mãe. Não aja como sua mãe. Não aja como sua mãe.

"Se você quer colocar uma coroa na sua cabeça e governar um reino, vá. Mas não faça isso por mim. Não me faça sentir culpada por ver você se tornando sua mãe."

Ele certamente está à beira da loucura.

Por que ainda está fazendo isso por Callia? Porque ela sobreviverá. Lowan sabe que já está perdido há muito tempo. Uma coroa não piorará sua situação significantemente. Mas Callia... ela tem o futuro pela frente, ela ainda pode dar a volta por cima e se reinventar. Eles se destruiriam de qualquer forma se continuassem próximos um do outro.

Voltar para Keres é uma sensação completamente diferente de antes. O aroma litorâneo se mistura com o perfume de cravos e canela e a frieza do ambiente em pleno inverno que o invadiu no minuto em que se aproxima do arquipélago. Suas roupas certamente não serão suficientes para aguentar o frio que imerge das montanhas. Não percebera tantos detalhes quando conheceu o lugar pela primeira vez, preso entre o Círculo de Influência de Oriwest com um gosto amargo na boca, após ter sido dopado e acorrentado para morrer, com o corpo exposto por um dos traidores que o acusava para salvar sua pele. Ele não disse a Callia que se lembra de cada segundo em que ela o observou de cima abaixo e engoliu em seco, processando cada uma de suas cicatrizes disformes com medo, fazendo com que ele se sentisse completamente nu. Ele pensava que se fingisse que não se lembrava a memória iria desvanecer com o tempo. No entanto, não foi isso que aconteceu.

Alguém bate em sua porta; ele não se dá ao trabalho de dizer algo. Ele mal se move.

— Nós chegamos — anuncia Merle contida no tom. Olhar para Lowan só lhe causa mais repulsa sobre suas ações. Está mesmo acontecendo, afinal.

O garoto — o filho de Toran — está prestes a assumir um trono que não lhe pertence e Merle está deixando isso acontecer.

Naturalmente, se Berk estivesse vivo, nada disso seria necessário. Talvez ela devesse ter se precipitado e concebido um herdeiro para o futuro iminente. Sua visão fica turva todas as vezes que percebe o quão próximo está o momento de finalmente anunciar a morte de seu pai à público.