Capítulo 7

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Que sede!
Virei para o outro lado e encontrei um travesseiro no meio do colchão. Abri os olhos. As janelas do quarto refletiam uma luz tão forte que a minha sensação era que não existia nenhuma parede ao meu redor. Era domingo, eu havia transado e dormido com o Gabe, e tinha acordado sozinha.
Ma ra vi lha!
Sexo casual sempre funcionou comigo. Nunca fiquei como uma louca me auto desvalorizando por dormir com um homem que eu nem sabia o nome da mãe. Rolou química, não rolou? Então estava tranquilo. E ele havia sido esperto, foi embora antes que eu acordasse. Ponto pro Gabe!
Levantei da cama e peguei o roupão no cabideiro, vestindo-o. Entrei no banheiro e ouvi a porta do quarto abrir.
- Você poderia gemer um pouco mais baixo? Obrigada.
Hanna engraçadinha. Como se ela tivesse mesmo escutado algo que fiz na noite passada. Estava focada demais com a boca em vários lugares do corpo do John.
- Eles já foram embora?
Perguntei com a escova de dentes na boca.
- Chloe, são duas da tarde. Não quis te acordar antes porque o Gabe não deixou, disse que você estava exausta. Ela parou no batente da porta e cruzou os braços.
Cuspi na pia e lavei a boca.
- Duas da tarde? Nunca dormi tanto! Puta que pariu!
- O que vai fazer hoje?
Ela perguntou dando espaço para que eu voltasse para o quarto.
- Não sei. Amanhã começo na construtora, acho que vou analisar a papelada que meu pai mandou pelo correio. Falar nisso, ele ligou?
- Não. Mas a secretária dele sim. Pediu pra que você chegue cedo amanhã. Ela quer te apresentar as dependências da construtora e aos funcionários.
Respirei fundo e caminhei para cozinha. Hanna vinha atrás de mim.
Abri a geladeira e peguei uma garrafinha de água.
- Só me faltava essa! Vou ser a nova chefona. Acha que nasci pra mandar?
- Claro! Você tem o espírito de liderança, Chloe. Vai dá tudo certo, acredite em você e em mim também.
Dei risada e sentei em um dos banquinhos no balcão.
- Quer comer alguma coisa? - ela perguntou - Ou podemos sair pra almoçar fora também. Não vamos demorar, sei que você tem que estudar uns papéis, mas eu to louca pra comer massa.
Olhei para o relógio da cozinha. Daria tempo de almoçar fora e ficar por dentro da Sandler Empreendimentos bem tranquila.
- Claro, vou só colocar uma roupa.
Hanna deu pulinhos de alegria.
Voltei para o quarto, recolhendo a calça e blusa da noite passada no chão colocando-os no cesto de roupa suja. A colcha da cama amassada, me fez lembrar do quanto o Gabe havia sido sexy e engraçado. Intenso e carinhoso. Eu transaria com ele de novo. Sem dúvidas. Fui até o armário e peguei um blusão que ia até metade das coxas. Arregacei as mangas, porque lá fora o calor deveria está de matar. Aproveitei e coloquei uma calcinha tambem. Aquela historia de não gostar de usá-la era verdade. Odiava sentir alguma parte do meu corpo sufocada. Nunca fui muito preocupada com moda. Só queria me sentir bem dentro de qualquer coisa que coubesse. Tinha peitos grandes e coxas grossas, mas não me importava de não mostrá-los por aí. Sou sexy só quando quero. Aguenta essa!
Voltei para sala com os óculos escuros, carteira e chave do carro em mãos.
- Vamos? - Hanna levantou num pulo.
- Oba!!!!

Chegamos ao restaurante italiano vinte e cinco minutos depois. Era um lugar agradável e por incrível que pareça calmo. Mas não naquele domingo. Estava movimentado, as pessoas do outro lado, na orla, andavam de bicicleta, patins e skate. O dia estava lindo, quase me crucifiquei por não ter acordado mais cedo e aproveitado. Adorava o dia ensolarado. Minha mãe costumava dizer "e do que você não gosta, Chloe?"... Atualmente eu só não gostava de médicos misteriosos com telefonemas estranhos.
Achamos uma mesa na calçada, fora do cercado do pátio do restaurante e sentamos.
O Sr. Ferraz, dono do estabelecimento já nos conhecia e não demorou a vir nos atender.
- Olá senhoritas, quanto tempo...
Ajeitei os óculos no alto da cabeça e cumprimentei-o com um aperto de mão.
- Tem razão Sr. Ferraz, faz tempo que não aparecemos. Final de faculdade, sabe como é...
Ele assentiu entregando-nos o cardápio. Dispensei.
- O senhor sabe do que gosto. Vai ser o mesmo de sempre.
- Pra mim também. - Hanna acenou animada.
- E para beber?
Olhei para Hanna que deu de ombros e respondi:
- Vinho. O melhor da casa, por favor. - Trago em 2 minutos, garotas.
O Sr. Ferraz nos deixou a sós e voltou para o restaurante.
Coloquei a carteira em cima da mesa e apoiei as pernas numa cadeira vazia em minha frente.
- Sabe - Hanna começou - olhando assim, você nem parece a futura CEO da maior construtora da cidade.
Revirei os olhos.
- É por que não sou. Eu sou filha do CEO.
Rimos porque sabíamos que era a mesma coisa. Toda empresa estava em meu nome.
- Como foi com o John?
Arrisquei-me a perguntar.
Hanna olhou para o mar do outro lado da avenida e sorriu apoiando o queixo nas mãos.
- Ele é incrível Chloe. Mas decidimos não oficializar nada até que ele se mude pra cá de uma vez.
Ah, tinha esquecido desse detalhe. John e Gabe moravam no sul, estavam por aqui a negócios...
- Então já estão querendo oficializar?
- Não um namoro, pelo amor de Deus. Só o sexo. Ele não transa com mais ninguém além de mim.
- A não ser com a mão dele...
Ela riu horrorizada.
- Chloe, nem todos os homens batem punheta.
- Todos os homens - fiz o gesto com a mão - batem punheta.
No mesmo instante, o garçom aproximou-se de nossa mesa com os pratos e o vinho. Deus, tomara que ele não tenha ouvido o que tínhamos falado.
Olhei para Hanna que fez um gesto trancando a boca. Repeti segurando o riso. Depois que o garçom nos deixou, soltei a respiração.
- Você me mata de vergonha.
Ela disse dando sua primeira garfada no talharim à bolonhesa.
- Ele também bate punheta.
- Eu tô comendo, Chloe!
- Me perdoe. - dei um gole no vinho e me entreguei à delícia da lasanha que estava em meu prato.
- E o Gabe?
- Ele é engraçado. É ótimo na cama também. Somos bons amigos.
E era verdade. Bons amigos de cama, acho que esse é o termo mais apropriado, pensei.
Ela assentiu sem dizer mais nada. Essa era uma das qualidades da minha amiga, ela nunca se metia nos meus rolos e vice-versa. Éramos adultas para ir pra cama e adultas para estabelecer quem voltaria e quando voltaria, sem precisarmos da opinião de ninguém.
- E o Nicolas? Você ligou pra ele, não foi?
Tava demorando...
- Sim, foi uma conversa rápida.
- Ele é muito gentil, Chloe.
Dei mais um gole no meu vinho.
- Até demais. Hanna, você tem algum terninho pra me emprestar? Preciso parecer a chefona responsável amanhã.
Tentei mudar de assunto e funcionou. Hanna era ótima com roupas.
- Claro! Vários deles, de todas as cores. Quando voltarmos te mostro alguns.
Terminamos de almoçar, paguei a conta e decidimos dá uma volta na praia.
Falamos de tudo, da ultima semana e dos meninos que havíamos conhecido. Planejamos até uma nova viagem para Vegas, a ultima vez que fomos, no aniversário da Hanna, perdi a Rand Rover que meu pai havia me dado de presente aquele ano. Nem me pergunte como...
- Hanna, você sabe o que o Nicolas quer conversar comigo?
Aproveitei o momento e perguntei.
Ela me olhou e deu um meio sorriso.
- Não Chloe, ele ainda quer falar contigo? Então porque não faz isso logo?
Parei diante de um coqueiro, encostei-me e contemplei o mar.
- Não sei. Não to com uma sensação cômoda sobre isso. A minha mãe me ensinou a não falar com estranhos.
- A sua e a de todo mundo, menos a minha, que só me ensinou a ficar longe de homem casado.
Olhei para minha amiga parada ao lado e dei risada.
- Ela só quer o seu bem.
- Eu sei. E a sua também quer o seu bem... Sempre quis.
- E eu fui tão egoísta...
- Chloe - Hanna tocou meu braço - por favor, quantas vezes vou ter que te dizer que...
- Eu não tive culpa? - interrompi - Hanna, eu não sei. Não consigo deixar de ocupar parte dessa posição.
Respirei fundo. Ser filha única sempre foi uma delícia. Minha mãe sempre dizia "Homens nunca vão dominar merda nenhuma, Chloe, até pra nascer eles precisam da gente"...
Minha mãe, que ser humano incrível. Você iria adorar conhecê-la.
- Tá pensando nela, não é?
Hanna baixou um pouco a voz.
- Sempre.
- Vem cá. - me puxou num abraço desajeitado - Ela está tão orgulhosa de você. Tenho tanta certeza disso.
Suspirei.
- Eu também.
- Agora vamos pra casa - ela me solta de repente batendo palmas, como um treinador incentivando o atletla - você agora é a chefona e precisa estudar projetos e empreendimentos.
Dei risada e seguimos de volta para pegar o carro.

Assim que chegamos, Hanna me apresentou a terninhos maravilhosos, de todas as cores que tinha, como havia dito. Escolhi por um vermelho sangue. Se era pra chegar dominando, assim tiraria de letra. Logo depois ela dormiu o restante da tarde enquanto eu organizava o que iria levar para o escritório amanhã e estudava alguns contratos. Quando acabei, já passava das oito da noite. Recolhi tudo o que havia espalhado no chão da sala, fechei o notebook e deitei no enorme tapete.
Adorava fitar o teto. Organizar as idéias, esquecer das responsabilidades. Pode parecer loucura, mas o teto branco me ajudava em tudo isso.
Pensei no Nicolas e no que ele estaria fazendo agora. Provavelmente examinando algum paciente ou recolhendo informações de alguma mulher indefesa, como havia feito comigo. Ou simplesmente estivesse sentado com o celular em mãos esperando por minha ligação. A possibilidade me fez rir. Mas também me deu uma ideia.
Peguei o celular, configurei a chamada em restrita e disquei o número.
Dessa vez ele demorou a atender. A possibilidade que ele não atendesse a mais ninguém tão rápido quanto me atendia, me encheu de satisfação.
Na minha melhor voz masculina, e tentando segurar o riso, falei:
- Alô?
Ele respondeu:
- Alô. Quem fala?
- A Deby.
- Olá Chloe, tá tudo bem?
O que? Como assim? Olhei pra tela do celular e franzi a testa.
- Como você sabe que sou eu?
- Você chegou aqui na sexta de madrugada com essa mesma voz aí.
Ah, claro!
- Merda! Você é muito chato. Não sabe brincar.
Revirei os olhos.
- Chloe, estou no meu trabalho, esse é meu telefone particular, e eu não quero brincar com você.
Nossa, isso foi... Grosso!
- Me desculpe. Só estava sem o que fazer e...
- Já decidiu quando vamos conversar?
- Não, e nem sei se quero mais.
Falei na lata. Que tipo de ser humano era tão imprevisível assim? Uma hora gentil e noutra, um pedaço de cavalo?
- Então já que você ainda não sabe a data e nem o local, poderia me deixar trabalhar?
Consegue ver a minha cara? Pois é, nem eu, ela está no chão junto com o restante da minha dignidade.
Tossi pra disfarçar a raiva em minha voz. Eu queria xingar a geração da familia Balster inteirinha. O cara pede meu telefone a minha melhor amiga, me liga, fala que estava preocupado, manda remedinho pra ressaca, fala que continua preocupado e que quer conversar comigo e agora... Simplesmente me trata como se eu fosse uma estranha?
Mas é isso o que sou mesmo, não é? Uma estranha.
- Claro, Dr. Nicolas. E só mais uma coisa, vá à merda!
Desliguei o celular e peguei as coisas no chão. Fui para o quarto, configurei o despertador e me joguei na cama.
A confusão dentro de mim era intensa, e meu único medo era não conseguir dormir. Teria um dia cheio amanhã, e o filho da puta não queria facilitar as coisas.
Se ele achava que eu iria mesmo correr atrás das informações que ele queria me dá, estava enganado.
Eu era a chefona. Ou pelo menos seria. Amanhã.

Eu sou o arrepioOnde histórias criam vida. Descubra agora