Eu sou o arrepio

Capítulo 38

9 anos atrás...

Acordei absurdamente cedo para um final de semana. A verdade é que eu nem havia dormido.
Era sábado, 18 de dezembro, o dia em que minha banda favorita tocaria na cidade. E para uma garota de 15 anos, o seu primeiro show era como um baile de debutantes à céu aberto.
Não havia nada mais empolgante.

Levantei da cama e depois de um banho rápido, entrei saltitando na cozinha, cantarolando uma das minhas músicas favoritas. Meu pai estava sentado à mesa sozinho, e esse foi o meu primeiro susto do dia.
Todos os dias tomávamos café da manhã juntos, o papai, a mamãe e eu.
Por que aquele teria de ser um dia diferente?

- Pai - eu digo afastando uma cadeira e sentando em sua frente - Onde está a mamãe?

Ele mexe a colher em seu café e me olha depois de um tempo. Só então percebo seus olhos avermelhados e um pouco inchados, como se tivesse chorado a madrugada inteira.

- Está tudo bem? O que aconteceu? Onde está a mamãe? - eu não queria parecer assustada, mas era ridículo não agir dessa forma.

Fazia algum tempo que meus pais passavam por uma crise, o que eu achava normal para um casamento, estranho era a forma que a mamãe ficava depois dessas possíveis discussões. Distante, distraída, as vezes até agressiva.

- Está tudo bem Chloe, sua mãe está no banho, ela acordou um pouco indisposta - ele respondeu me tranquilizando.
- E o senhor, o que está sentindo?
- Eu? - ele ri um pouco - Só um pouco cansado também, a semana foi longa.

Mentira! Na noite passada eu ouvi uma das muitas discussões que eles tinham, mas dessa vez não durou tanto tempo. Ouvi minha mãe gritar algo, meu pai rebater, alguma coisa quebrar e então tudo ficou em silêncio.
Eu sabia que eles sabiam que eu ouvia tudo, mas não me sentia à vontade o suficiente para perguntar o que estava acontecendo. Era o casamento deles, eu não fazia parte daquilo, eu não podia me intrometer de forma alguma. O que me conformava era que nunca houve agressão física de ambas as partes e no dia seguinte, tudo estava bem.

- Seus tios estão chegando para o almoço - diz mudando de assunto - Sua vó está com saudade.
- Ah claro, almoço em família do sábado - dou risada - Estou ansiosa para ver a vovó também.

Segundos depois, a mamãe entra na cozinha enrolada num roupão. Seu rosto é o mesmo, mas os círculos escuros abaixo dos olhos denuncia que ela não teve uma boa noite de sono.

- Do que estão falando? - ela diz logo depois de beijar minha testa.
Observo os olhos do meu pai ganharem um brilho diferente, aquele brilho diferente que está sempre ali quando ele a vê. E então eu percebo que não importa as dificuldades, discussões e brigas de um casamento, se houver amor de verdade, amor esse que eu sei que existe entre os meus pais, tudo valerá à pena.

- Do fantástico almoço em família aos sábados.
- Você não me parecia tão empolgada a dois segundos atrás - meu pai diz fazendo a mamãe rir.
- Pai! - eu grito e me faço de aborrecida, mas é impossível, acabo rindo da risada que os dois dão - Não diz isso na frente da mamãe, ela adora a salada de acelga que a tia Jenny faz.
- Você também acha horrível? - ela pergunta fazendo cara de nojo - Ainda bem que não sou a única.
- Vocês são terríveis - meu pai diz e se levanta da mesa, dando um rápido beijo na mamãe e um beijo em meu rosto - Sua vó está me esperando.
- Dirija com cuidado, querido - mamãe diz e então meu pai deixa a cozinha.

Terminamos nosso café da manhã e voltando a olhar o rosto da mamãe, sinto uma onda de preocupação me invadir.
- Mãe, você parece doente. Está tudo bem?
- Claro, Chloe. Só estou com um pouco de enxaqueca, você sabe que ela me deixa destruída, não se preocupe com isso. Então - ela respira fundo e segura minha mão - Hoje é o grande dia! Empolgada?