Capítulo 1

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Violet

Muitos anos depois

San Diego, Califórnia - EUA

Sinto a água gelada molhar meus pés e o vento fresco soprar em meu rosto. Solto um suspiro de alívio, estava precisando desse momento. Somente eu e o mar. É nessas horas que eu posso desfrutar de um pouco de paz, é revigorante.

Viver com meus pais não é muito fácil. Eles sugam qualquer sentimento bom que eu tenha. Principalmente agora que as eleições para senador estão se aproximando. Meu pai anda muito estressado, o que deixa minha mãe estressada também, e os dois acabam descontando em mim.

Se eu pudesse, viveria num lugar longe dessa loucura. Tinha que ter uma praia, é claro, um homem gato que fizesse tudo por mim e crianças ao redor. Quero uma família grande e amorosa, tudo o que eu não tive na vida.

Ando mais um pouco pela praia e percebo que já anoiteceu. Infelizmente, preciso voltar para casa. Tiro a areia dos meus pés e calço minhas sandálias. Vou desanimada até a calçada, onde o carro está estacionado. K2 me espera encostado na porta do veículo.

Meu pai não me deixa dirigir. Não sei por qual razão, então ele deixou K2 disponível para mim. Ele atua como segurança e motorista. É um homem alto e musculoso, parece uma muralha de tão grande, e carrega consigo uma expressão séria no rosto. Nunca o vi sorrir, mas sei que posso confiar nele. Não temos nenhum tipo de intimidade, mas sei que K2 sempre estará aqui para me proteger.

- Pra casa, senhorita? - Ele pergunta enquanto abre a porta do carro para eu entrar.

Dou um leve aceno e entro no veículo.

O caminho de volta para casa é tranquilo nesse horário, não há engarrafamento. Escuto as batidas suaves da música que toca no rádio enquanto observo os prédios e as luzes da cidade passando. Penso em tudo. Em o quanto odeio minha vida e o quanto queria ser livre para fazer minhas próprias escolhas.

Chegando em casa, entro pela cozinha e pego uma maçã, em seguida vou andando em direção ao meu quarto. Caminho pelo corredor distraída, até que percebo meus pais discutindo na sala de jantar. Decido ignorar e evitar o confronto. Tento passar despercebida, mas minha mãe consegue me ver quando passo pela porta e me chama.

- Violet, querida. - Paro no lugar e me viro para ela.

- Oi, mãe. - Sei que ela detesta que eu a chame de mãe, porque depois de tantas plásticas que fez, ela parece ser minha irmã mais velha. No entanto, me nego a chamá-la de Salma.

- Tome um banho e depois desça para jantar. Nós temos que conversar.

Olho para meu pai que está sentado na cadeira, massageando as têmporas. Seus cabelos grisalhos estão bagunçados, o que é uma novidade, já que ele sempre anda com eles arrumados.

Papai não me cumprimenta o que é normal. Antes o fato dele ignorar minha existência me machucava, mas hoje não ligo mais. Sua presença é tão insignificante para mim quanto a minha é para ele.

- Tudo bem. - Respondo de maneira singela.

Volto para a sala de jantar, mas dessa vez estou com o cabelo lavado

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Volto para a sala de jantar, mas dessa vez estou com o cabelo lavado. Lavei meus cabelos e fiz uma hidratação neles. Depois, coloquei uma roupa fresca: um vestido azul pastel de alcinha e minhas pantufas. Assim que entro no local, minha mãe me olha de cima a baixo e faz uma careta.

Ignoro seu olhar e me sento à mesa. O jantar é Fettuccine com cogumelos de Paris. Não que isso seja uma comida ruim, mas queria muito comer algo simples, como bife com batata frita, hambúrguer ou pizza. Sempre tem que ser essas comidas chiques com o sabor superestimado.

- Eu já não falei que não é elegante uma mulher se sentar à mesa com o cabelo molhado, Violet? E ainda por cima de pantufas. - Minha mãe reclama, como sempre faz com qualquer coisa que eu faça. - Imagina quando você se casar, o que seu marido vai achar disso.

Tento me controlar para não revirar meus olhos. Quem minha mãe acha que é para falar de casamento?

Todos sabem que meus pais têm um casamento de fachada. Minha mãe era uma mulher pobre que queria crescer na vida, meu pai se encantou pela beleza dela e propôs um acordo. Eles se casaram e mamãe acabou engravidando de mim.

Meu pai é um político republicano, então representarmos uma família tradicional é algo que agrada e angaria mais eleitores. No entanto, ambos têm relacionamentos extraconjugais. Papai vive se engraçando com as secretárias com metade da sua idade e mamãe com alguns seguranças.

Começamos a comer nosso jantar num silêncio desconfortável, até que decido quebrá-lo.

- Eu queria saber quando vou poder trabalhar. Já me formei na faculdade e tem uma empresa que está contratando um consultor de negócios. Pensei em me candidatar. - Ambos me encaram com os olhos arregalados.

Eu me formei este ano em administração na Universidade de San Diego. Gostava muito de lá, porque podia ficar longe de casa o máximo possível. Eu queria poder trabalhar na minha área, mas não porque amo, e sim porque quero ficar distante desse ambiente tóxico. Mas meu pai nunca me deixou trabalhar ou até mesmo estagiar.

- Já conversamos sobre isso, Violet. Você não pode trabalhar. - Meu pai responde impaciente.

- Por que?

- Afinal, por que quer tanto trabalhar, Violet? Nós já somos milionários. - Minha mãe responde. Reviro meus olhos e perco a paciência.

- Nem todo mundo quer ser um desocupado na vida, Salma. - Solto com raiva.

- Violet! - Ela grita ultrajada com minha resposta.

- Chega! - Meu pai interrompe. - Você não vai trabalhar, e ponto. Nossos eleitores querem uma mulher de família e não uma feministazinha de merda que quer ser independente.

Feministazinha de merda só porque quero trabalhar?

- Como assim mulher de família? Eu tenho vinte e dois anos apenas, pai. A mesma idade das suas amantes. Tenho muito o que viver antes de casar. - Provoco.

Meu pai me olha com tanto ódio que acho que se estivesse perto de mim, ele me daria um tapa. No entanto, não perco a pose, encaro-o com deboche.

- Violet, respeite seu pai. Esse tipo de comportamento não será tolerado. Não foi assim que te criamos. - Ela tem a cara de pau de dizer que me criou, sendo que fui criada por babás e empregados.

- Deixa ela, Salma. Violet vai ter que fazer o que eu mando, afinal, quem sustenta ela sou eu. - Ele se levanta. Seu olhar é frio e sombrio ao mesmo tempo. - Você vai se casar com Callum.

- O que? - Acho que não escutei direito. Callum é filho de uns amigos políticos do meu pai. É um playboy egocêntrico que sempre encontro nos eventos beneficentes.

- Precisamos do apoio deles e, para isso, vocês dois vão se casar. Os eleitores vão gostar e assim ganhamos mais votos.

- Eu não vou me casar com aquele idiota. - Falo indignada.

- Vai sim, querida. Não seja ingrata com seu pai, ajude-o a ganhar essa eleição. Vamos ganhar mais dinheiro ainda.

- Você só pensa em dinheiro, mãe? É tão fútil ao ponto de tirar minha liberdade de escolha para benefício próprio? - Enquanto demonstro minha indignação, meus olhos escorrem lágrimas.

- Não seja dramática, Violet. Todos saem ganhando. Talvez Callum até deixe você trabalhar. Agora chega de dramas por hoje, vamos dormir, Salma. - Minha mãe se levanta e segue meu pai como um cachorrinho obediente. Meus pais saem da sala, me deixando sozinha com minhas emoções.

Como duas pessoas que deveriam te amar e te proteger te tratam como mercadoria?

Nota da autora:

- Os republicanos são os políticos conservadores dos Estados Unidos.

A Mulher do ChefeOnde histórias criam vida. Descubra agora