29 - Inevitavelmente

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Eu não era rica, mas graças a todo o trabalho que fiz no último ano, eu tinha um dinheirinho sobrando para parcelar uma viagem.

Não queria ir sozinha, então levei minha mãe. Estávamos em dois momentos solitários de nossas vidas, ela viúva, eu de coração partido.

Além do mais, sempre nos demos bem. Eu costumo dizer que esse foi o único ponto da minha vida em que tive sorte. Nunca foi um problema ter uma filha homossexual, mesmo que ela não entendesse. Sempre fui acolhida, amada e apoiada, meus pais sempre deixaram claro que se eu precisasse de um lugar para me esconder do mundo, sua casa seria o meu refúgio perfeito.

Eu me escondi lá por alguns dias, depois resolvi que nós duas merecíamos mais do que as ruazinhas pacatas do interior.

Sempre a ouvi dizer que se um dia ela tivesse a oportunidade, conheceria Paris. Um clichê, mas agora, eu tinha alguma condição de nos proporcionar isto e foi o que eu fiz.

Esqueci completamente que o hemisfério norte ainda teria quase um mês de inverno. Chegamos em Paris com uma neve fina e alguns graus abaixo de zero. Ganhei de presente de aniversário um nariz congelado e casacos quentinhos para nós duas.

Por isso eu não gosto de ser impulsiva. Se eu tivesse parado um pouquinho para pesquisar, teria atrasado aquela viagem em algumas semanas e chegaríamos ali no começo da primavera. Mas minha gana de passar meus vinte e seis em grande estilo, me fez cometer esse erro de principiante que nunca planejou uma viagem ao exterior.

De qualquer forma, minha mãe estava adorando a experiência e Paris ficava ainda mais bonita sob a neve.

Procurar pontos turísticos que funcionasse naquelas condições e experimentar comidas para afastar o frio, virou nossa meta de viagem e mantinha nossas conversas num local seguro.

Apesar de sempre ter sido acolhida por minha mãe, eu nunca fui de compartilhar meus sentimentos e dramas amorosos. Ela conhecia minhas namoradas e era o máximo que eu fazia. Sempre tive essa coisa de proteger meus sentimentos, sofrer calada e sozinha, internalizar tudo.

Mas claro que ela estava notando que havia algo errado comigo. Eu a notava observando com uma ruga de preocupação no meio da testa, sempre que me via parada e quieta, com o olhar distante. Por isso, procurei manter um alto planejamento de nossa semana em Paris, para não dar margem nenhuma para que ela iniciasse aquela conversa.

Decidimos que a melhor forma de comemorar meu aniversário era com a tão esperada visita ao Louvre.

Descobrimos juntas que não sabíamos nos portar num lugar como aqueles. Museus eram passeios complexos e silenciosos demais para quem respirava música como eu. Mesmo a sinfonia ambiente que era mantida por ali, eu ainda podia sentir o silêncio opressor de se estar num lugar de apreciação.

Mas, por quanto tempo eu tenho que ficar aqui, olhando para a Monalisa, para fazer meu dinheiro ter valido à pena?

— Se for pra sofrer, que seja em Paris, não é?

Me virei de súbito, quando reconheci a voz e o idioma.

Fabi Godoy, vestida num look de frio elegante, de braços dados com um Rafael muito fashionista, alargou o sorriso na minha direção.

Mas qual era a probabilidade disso acontecer?

— Não creio!

Fabi largou o braço do marido se vitrine e veio me abraçar.

— Feliz aniversário, Vicky!

— Mas como é que você sabe? – questionei ao nos afastarmos.

— Aaah, um passarinho verde me contou. – respondeu com um sorriso misterioso.

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