* Uma garrafa não vai me tornar um monstro *

7 3 0
                                    

       Eu tirei a mão da cabeça e me sentei no sofá.

     Eu não tinha certeza se conseguiria arrancar a chave dele todo machucado do jeito que eu estava.

      Um único gole não faria eu ser aquele monstro. Eu não teria opção.



       Ele sorriu e se sentou do meu lado.



- Isso aí, filhão! - Ele passou a mão no meu ombro.




       Eu não conseguia olhar para ele, então olhei para o chão.





       Ele estendeu a garrafa para mim.



- Vire tudo. Vai lá filho.


   
       Eu olhei para ele.

- Tudo? Pai, tudo não, por favor.


- Eu disse tudo! - Ele apertou o meu ombro.


          Eu peguei a garrafa e senti um nó se formar na minha garganta.


       As minhas mãos tremeram e eu comecei a suar.






- Rápido!






      Eu fechei os olhos e coloquei a garrafa na boca.

  
         Eu tentei me concentrar e dizer a mim mesmo que aquilo não significava nada.


          Uma garrafa não vai me tornar um monstro.

       Uma garrafa não vai me tornar um monstro.

       Uma garrafa não vai me tornar um monstro.


       Uma garrafa não vai me tornar um monstro.


       Uma garrafa não vai me tornar um monstro.





Uma garrafa não vai me tornar um monstro.

       Uma garrafa não vai me tornar um monstro.


       Uma garrafa não vai me tornar um monstro.




       Uma garrafa não vai me tornar um monstro.






     Eu tomei o primeiro gole e tentei acabar com a garrafa o mais rápido que consegui.




- Isso filho! Viu, não foi difícil. É ótimo, não é?



           Eu senti uma  vontade imensa de chorar.

              Eu não consegui olhar na cara dele.



- Eu preciso ir ao banheiro.


    
      Eu me levantei e me tranquei correndo dentro do banheiro.


     
     Eu comecei a chorar e a entrar em desespero.




      Eu me ajoelhei ao lado do vazo sanitário e enfiei o dedo na garganta forçando o vômito.


      Eu comecei a vomitar e fiz isso repetidas vezes, até ter certeza de que não teria nem um resquício de bebida no meu estômago.





- Abra essa porta agora!




      Meu pai começou a socar a porta.


      Eu não queria abrir, mas ele iria derrubar a porta, então eu saí do banheiro.


         Eu continuei sem olhar para ele.


- Que estômago de bixa!


         Ele me puxou pelo colarinho e soltou na sala.





- Eu não quero uma bixa dessas na minha casa!



             Eu fiquei quieto, com medo de que ele decidisse me bater.


   Ele foi para o meu quarto.



- O que o senhor está procurando, pai? - Segui ele tropeçando nos meus próprios pés.


- Te expulsando da minha casa! - Ele começou a pegar as minhas coisas e jogar elas em uma mala.

           Uma fúria enorme surgiu em meu peito ao ouvir suas palavras.

  
- Já chega, pai! O senhor não pode me expulsar de casa assim do nada! - Gritei e tentei tirar a mala da mão dele.




       Ele me empurrou, dando um soco no meu estômago com tanta força que eu me senti enjoado, tropeçando nos meus próprios pés e caindo.




   - Eu vou te dar dois minutos para sair daquela porta, antes que eu faça você sair daqui de ambulância!




        Aquele nojento iria preferir beber todos os dias ao envés de pedir desculpas ao seu próprio filho?


      Meus olhos se encheram de lágrimas.






- O senhor não  vai fazer isso. O senhor não vai trocar a vida do seu filho por bebida, não é? - Eu me levantei.



- Eu mandei você se levantar e sair da minha casa! - Ele jogou a mala no chão.


         O meu mundo desabou. Sem a minha mãe e com um desconhecido nojento. Um homem que não tinha responsabilidade consigo mesmo. Um monstro medonho e asqueroso.

   
        Agora só me restava ela, e mais ninguém.

- Obrigado por me mostrar o que é o inferno de verdade. A bebida vai te matar, e ao contrário da minha mãe, o senhor irá morrer sem ninguém. - Eu peguei a mala e sai do quarto.





              Ele rosnou irritado.





        Enquanto eu mancava pela sala, senti o seu alito de bebida atrás de mim.



            Eu me virei para ele na mesma hora em que ele iria atingir a minha cabeça com o cinto.


        O cinto pegou no meu pescoço e eu senti ele queimar de novo.

             Eu gritei.


- Eu posso te mostrar o que é inferno de verdade se você não me respeitar!




      Ele me derrubou no chão e me bateu.



       Eu tentei fazer ele parar, mas as minhas mãos ainda tremiam.





-  Pare pai! - Gritei quando consegui achar a minha voz.




             Ele parou e olhou nos meus olhos.






- Saia da minha casa!






        Eu coloquei a mão no pescoço.

 
             A minha sorte era estar com o curativo, pois poderia ter sido pior.



          Ele bateu tão forte que arrebentou o curativo e passou de leve na minha pele.





           Eu me levantei e olhei para ele.





- Você é o homem mais nojento que eu já vi na minha vida.





         Eu peguei a mala e sai, batendo a porta.

Os Desejos Mais Sombrios De Uma Alma Onde histórias criam vida. Descubra agora