(Marília's POV)
O período da saudade é difícil e doloroso.
E também é longo, preenchido com noites em claro e olheiras profundas escondidas sob grossas camadas de maquiagem. É estranho ter um corpo ao seu lado todas as noites, que acorda com você pelas manhãs e um dia, de repente, você só acompanha a vida dessa pessoa por fotos. Como um machucado que só dói por alguns dias, mas que esteve ali na pele por um tempo.
Nada te acorda verdade a não ser quando você acorda sozinho. No final das contas, talvez seja essa a maior consequência das minhas escolhas e atos.
- No que você está pensando?
Maraisa e eu subimos no telhado da minha casa para ver o sol se pôr após um impulso movido às lembranças de nossa adolescência. Temos uma ampla visão de todas as casas em volta e até mesmo um pouco do longo horizonte de São Paulo acendendo mais conforme a noite cai.
Devido a chuva de ontem, o céu laranja está se tornando rosa e lilás gradativamente, mudando a cor das sombras lançadas sobre o rosto de Maraisa a cada minuto que passa com o sol abaixando.
- Já sentiu que uma parte sua parece incompleta? - dou uma pequena pausa antes de continuar. - Que algo está errado e que tomou uma decisão diferente da que deveria de fato?
- Isso é sobre a decisão de voltar?
- Acho que no primeiro segundo, quando estive de volta aqui depois de um longo tempo, eu tive a falsa sensação de que estava certa... Matei a saudade dos meus familiares, da minha antiga casa, dos meus costumes passados. - Isa presta atenção em cada palavra que digo e acena para que eu possa continuar. - Só que agora tudo parece um bolo de incertezas e inverdades, eu não sei mais o que pensar.
Maraisa estica as pernas e passa a mão no shorts da Adidas cobrindo metade das suas coxas.
- Você sabe que nunca é tarde para voltar a trás. Decisões tendem a nos deixar confusos, mas você tem a escolha de mudá-las quando bem entender se é isso que você quer. - devagar, aproximo-me. - Você é dona das sua vida e das suas próprias escolhas, não deve se esquecer disso.
Paciente e calma como sempre. O que é invejável.
- Eu deixei uma filha para trás, uma vida que eu poderia construir com alguém que eu amo... É assustador me dar conta disso. - Isa ergue o braço e o coloca em volta do meu ombro, fazendo com que eu deite a cabeça em seu peito e, de bônus, consiga uma visão melhor do horizonte mesclado em tons sublimes.
- Pensei que tivesse comentado que eles te esperariam por uma eternidade se fosse preciso. Eles não vão sair de lá. - diz e sorri de lado, fazendo uma covinha aparecer na bochecha esquerda.
- Vou manter isso em mente.
- Hoje é o reencontro na casa da Valentina... Posso desmarcar com o pessoal caso não estiver se sentindo bem. Podemos ficar aqui na sua casa, estourar uma pipoca e maratonar filmes trash de terror. - Isa ri e encolhe os ombros. Me aninho mais a ela agradecendo aos céus por ter alguém tão compreensível e leal por perto.
Se eu pensasse com o meu lado emocional, aceitaria esse plano sem pensar duas vezes. Mas não estou, e o pensamento racional de me divertir ao menos um pouco me anima de verdade. Acho que preciso um pouco disso novamente, no fim das contas.
Uma pausa de toda aquela bagunça não faria nada mal.
- Não, tudo bem. Estamos marcando desde a semana passada. - respondo e estalo um beijo molhado no seu rosto. - Eu vou.
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Rever meus amigos do colégio é uma experiência nostálgica e, ao mesmo tempo, agoniante.
Nostálgica porque é bom vê-los novamente. Aos dezesseis, tudo que eu mais gostava era encontrá-los para surfar ou conversar bobagens sem fim. Onde éramos uma fábrica de sonhos, repletos de possibilidades que, com nosso esforço, poderiam se tornar reais.
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Flashlight ● adaptação Murilia
Romansa⚠️ATENÇÃO: esta história é uma adaptação!⚠️ Uma proposta irrecusável para salvar a vida de seu irmão é o suficiente para que Marília Mendonça, uma fotógrafa destemida, conheça Murilo Huff, um jovem policial que teve seu coração partido inúmeras veze...