Capítulo III || House of Memories

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Carterville, terça-feira, 28 de fevereiro de 2023.

Querido diário, quanto tempo, não? Tenho saudades de quando escrevia todos os dias, mas os anos passaram, eu cresci, as responsabilidades aumentaram, e com elas meu tempo diminuiu, mas fico feliz por ter mantido o hábito de escrever pelo menos uma vez por ano, no meu aniversário, para contar as novidades.

A verdade é que os últimos 365 dias não trouxeram tantas coisas novas assim. Continuo com Aiden e nosso relacionamento está na mesma, nada de anel de compromisso em minha mão. Não que eu faça questão. Mamãe está bem de saúde, dona Mary Lou é uma rocha. Quem está doente é meu amado Dobby, com quinze anos, bem velhinho, cego de um olho e com artrite, os dias tem sido difíceis para ele. Não quero ter que pensar como será quando chegar a hora do adeus.

Ainda estou trabalhando na loja de carros usados e não vou dizer que é meu emprego dos sonhos, mas ajuda a pagar as contas e é isso o que importa.

Não tenho planos para mais tarde, mesmo estando de folga. Mamãe sempre faz bolo de chocolate, o meu preferido, como se eu ainda fosse uma menininha e talvez saia com meu namorado para comer alguma coisa. Claro, se ele não estiver muito ocupado jogando videogame para me dar o prazer de sua companhia.

Acho que nunca escrevi sobre isso, mas sinto que só faço aniversário de verdade a cada quatro anos, nos anos bissextos, onde o meu dia, 29 de fevereiro, aparece no calendário. Nos outros anos é tudo meio sem graça, como se simplesmente tivessem pulado a minha vez.

Enfim, te escrevo novamente daqui há doze meses, espero que com coisas mais emocionantes a contar.

★★★

Fecho o diário me sentindo meio emotiva, deito em minha cama de barriga para cima e entro no Instagram para responder as felicitações pelos meus vinte e sete anos de vida.

Kimberly postou um story e me marcou. É uma foto nossa abraçadas, tirada quase dois anos atrás, antes dela ficar grávida e ir morar com o Jeff. Depois disso, nossas visitas uma à outra ficaram cada vez mais raras porque ela está sempre muito atarefada com as novas funções de mãe e esposa. Eu entendo, mas sinto falta de ter uma amiga próxima como já fomos um dia.

"Feliz aniversário para a ruivinha que mais amo no mundo todo. Que seu dia seja muito feliz, Cissy. Saudades." — Ela escreveu. Não consigo evitar de ficar chorosa.

Mais alguns colegas postaram stories ou me marcaram em publicações, mas um em especial me chama a atenção — é uma marcação de Jackson, um ex-namorado, do qual meio que fugi. Puxo pela memória todo o fio que me levou até ele.

Meu primeiro namorado foi Aiden, quando eu tinha dezesseis anos e ele fez uma aposta com os amigos para ficar com a ruiva e descobrir se os pentelhos dela eram da mesma cor dos cabelos. Isso mesmo, nada de romântico. Nunca tinha ficado com menino algum porque todo o tempo em que não estava estudando, estava lendo ou sonhando com meu crush, o mestre de marionetes que conheci aos doze anos. O cara mais atraente que já vi. Era meio obcecada por ele, tentava imaginar como ele estava ao longo do tempo, buscava sua imagem nas redes sociais e na internet em geral, mas nunca encontrava nada — o homem era um mistério.

Por isso foi uma surpresa quando Aiden, o piadista do colégio, melhor amigo do garoto mais popular, veio pedir para ficar comigo. Como todas as meninas já tinham perdido o bv havia muito tempo, resolvi aproveitar a oportunidade. Aiden não era tão bonito, mas tinha charme, era bem humorado e dizia gostar de mim, por que não?

As coisas, porém, não aconteceram bem como eu previa. Até pensava que podia ser que rolasse algo mais entre nós, mas eu queria fazer tudo com calma, afinal, nunca tinha nem beijado, mas o garoto era afoito e em poucos dias juntos acabei cedendo e chegamos nos finalmentes. Foi ruim. Não gosto de lembrar porque sofro de vergonha alheia e quando a vergonha é minha mesmo é quase insuportável tolerar. Mas, por incrível que pareça, mesmo já tendo conseguido o que queria e ganhado a aposta — o que eu só tive conhecimento depois, pela boca dos outros, afinal, cidade pequena, sabemos bem como funciona — ele quis continuar comigo, e assim fizemos. Não houve um pedido de namoro oficial. Apenas permanecemos juntos e todos, inclusive nós mesmos, assumiram que éramos namorados.

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