Revelações

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— Por que você está tão séria, mãe?

Sarah olhou de canto para Guilherme e lhe ofereceu um sorriso doce, antes de voltar a encarar os próprios dedos repletos de anéis. Ela estava na mesa de jantar, na companhia de Guilherme e à espera de Maria Júlia. Próximo à ela, havia algumas caixas com álbuns e presentes de sua vivências antigas compartilhadas com Juliette, que ela mesma havia fotografado, revelado e guardado com todo apreço que ainda possuía.

Os olhos de ambos se ergueram quando a porta de entrada foi aberta e Maria Júlia adentrou com a mochila em mãos. Estava prestes a subir, mas quando viu sua mãe e o irmão reunidos na mesa, parou subitamente. Recordou imediatamente do alerta que Sarah fizera antes dela sair.

Desde o dia anterior que sua mãe estava completamente séria e de poucas palavras. Maria Júlia nunca a viu assim. Seu peito ainda doía por tê-la magoado e principalmente, tê-la feito chorar. Sim, ela ouviu o choro de sua mãe enquanto a mais velha conversava com seu tio, Gilberto. Maria Júlia queria expôr tudo, ser franca e sincera. Mas precisava de respostas primeiro. Respostas sobre a sua outra mãe.

— Finalmente você chegou! Já faz meia hora que a mamãe está séria e calada.

— Foi mal, acabei perdendo o primeiro ônibus. — Ela sentou vacilante na cadeira, olhando de soslaio para a mãe — E então?

Sarah suspirou, se endireitando na cadeira.

— Eu vou contar algumas coisas pra vocês que eu, bom, nunca contei. — Iniciou, tentando evitar um nó que se formava na garganta. — Sinto muito não ter contado, mas eu tive bons motivos para fazê-lo.

— Você matou alguém, mãe? — Guilherme apoiou o queixo no braço, encarando a loira com dúvida. Porém, Sarah apenas riu, negando com a cabeça.

— Nada de matar ou roubar nessa história, filho. Na verdade, é sobre uma outra pessoa que você nunca conheceu. — Ela sorriu ternamente, fazendo um carinho nos cabelos castanhos do menino — Há nove anos atrás, eu era casada com uma mulher. E essa mulher se chama Juliette. Juliette Freire Andrade, se ela não alterou os documentos ainda. — Sarah suspirou, encarando a mesa de vidro — Foi com ela que eu tive a Maria Júlia. Aliás, foi ela quem gerou você. — Olhou para a primogênita. — E ela também é a sua mãe, Gui.

— Minha mãe? — O menino apertou a mão da maior, recebendo um aceno positivo de Sarah — Mas como? Eu nem a conheço.

— Você é muito novo para entender algumas coisas da ciência, está bem? Mas, bem. Se você olhar uma foto dela, verá que você é o mais parecido com ela. Isso porque fui eu quem gerei você, porém com os óvulos dela.

— E eu? — Maria Júlia indagou.

— Você foi uma verdadeira mistura. — A loira sorriu sem humor — Meus óvulos e os óvulos dela. Por isso você tem alguns traços da sua mãe, contudo, os meus acabaram imperando. Seus olhos, sua personalidade, tudo isso.

A primogênita assentiu.

— E cadê ela, então?

— Bem, é uma longa história, Gui. Mas vou tentar explicar da melhor forma possível. — Sarah fez uma pausa e respirou fundo — Eu conheci a Juliette na infância. Na época, fui eu quem chegou um pouco mais tarde na Paraíba, local onde ela morava. Entrei na mesma escola e fizemos a mesma série, o quinto ano. Desde então nós não nos largamos nunca mais. — A mais alta sorriu nostálgica — Não sei dizer em que momento eu me apaixonei por ela, mas quando vi, queria tê-la para sempre comigo. E não era uma paixão de amiga, não quando eu quis muito beijar ela.

— Eca, mãe!

Sarah e Maria Júlia riram.

— Prosseguindo com a história, nós morávamos em um interior de João Pessoa bem conservador. Nossos pais eram amigos, sim. Mas o local, em si, era super religioso. Não havia uma pessoa que fosse lésbica ou gay, que não fosse julgado naquele lugar. Até mesmo nossos pais falavam.

Depois do Para Sempre | SarietteOnde histórias criam vida. Descubra agora