Capítulo 10

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Eu parei, paralisei na verdade. Me virei para o celeiro para encarar a testemunha da minha fuga. No escuro, mal era possível ver o rosto de Flynt.

Ele notou a mochila em minhas costas, e como eu não disse nada, ele tomou a palavra de novo:

_Vai fugir? – As palavras continham um tom de acusação, reprovação e superioridade. Sabia muito bem o que ele estava pensando: eu era uma adolescente rebelde e infantil que estava fugindo por um ato de rebeldia e não de necessidade, que depois iria me arrepender.

_Você não sabe nada de mim! – Devolvi irritada.

_Espera aí, deixa eu adivinhar: seu pai colocou alguém no lugar da sua mãe e você odeia a sua madrasta. – Ele disse no mesmo tom de superioridade.

Eu apenas balancei a cabeça e um risinho irônico escapou dos meus lábios.

_Você não faz ideia. – Eu disse. Mas o que ele iria fazer em seguida era um mistério para mim. Chamar meu pai? O tio dele? Me impedir de fugir ou ser completamente indiferente?

Ele ergueu as sobrancelhas e sorriu de forma nada verdadeira.

_Ah, qual é! Dá pra ver no jeito que você olha pra ela que você não suporta a mulher.

_Qual motivo eu teria? – Foi a minha vez de erguer a sobrancelha. _Ela é maravilhosa, a mãe que qualquer um pediu para ter. E, além disso, eu nem lembro da minha mãe. – Menti.

_Então por que está fugindo? – Ele jogou para mim a pergunta.

Por que estava fugindo? Bom, eu odiava tudo o que o meu pai estava fazendo, o jeito que ele falava de mim, como agia comigo, como atuava e não era verdadeiro. Odiava Bridget também, tinha algo de muito errado com ela. Percebi logo que cheguei, quando a conheci, mas ignorei os sinais. Agora não podia ignorar mais, não depois de tudo o que aconteceu. Por fim odiava essa vida. Odiava ter todos esses pesadelos, principalmente o de ver a minha mãe morta e não poder fazer nada além de ficar encarando o seu cadáver. Odiava tudo isso.

Mas não devia satisfação nenhuma para Flynt, minha vida não era da conta dele. Tudo o que passava pela minha cabeça era minha propriedade, os motivos eram meus, a vida era minha e ele não tinha motivo nenhum para se meter.

Como permaneci calada ele se pronunciou de novo.

_Qual é o seu motivo, Milla? – A forma como disse o meu nome era um contraste e tanto com a forma como me tratara no hospital. Não havia carinho, não havia cuidado. Era fria. Será que ele era mesmo a mesma pessoa? _Por que vai embora?

Seu tom de voz, além de conter certo desprezo, era ferido, como se o que eu estivesse fazendo o desapontasse muito, o magoasse.

_Não devo satisfação para alguém que acabei de conhecer. – Falei com o mesmo tom de voz dele. Ele pediu isso.

_Você não acabou de me conhecer. – Ele me contrariou.

_Claro que sim. – Sorri. _Conheci você hoje, seu tio me apresentou a você. Agora me deixa em paz!

Então continuei meu caminho pela estradinha que levava até a porteira.

_Isso é mentira! Você sabe disso! – Ele falou alto o suficiente para que eu o escutasse.

Virei a cabeça para trás e respondi sem parar de andar.

_Foi você quem contou ela então.

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