Brotherly Love

Capítulo 01

Felipe

Senti uma pancada forte na cabeça que me levou ao chão. Meu pai tinha chegado mais uma vez bêbado em casa e, como de costume, resolveu descontar toda a frustração da sua vida em mim. Antônio é o seu nome. Seu trabalho como pedreiro não lhe garante tanto dinheiro, mas ele tem o suficiente pra beber quase todos os dias.

Desde que eu me entendo por gente, foi assim. Ele sempre me tratou muito mal, e depois de um tempo começou a me bater toda vez que bebia, sem nenhum motivo aparente. Quando não era em mim, era na minha mãe. Eu tinha muito medo dele, era desesperador vê-lo chegar em casa. Hoje, então, ele estava muito pior. Era nítido o quanto o ódio o possuía.

Ele já tinha me chutado diversas vezes enquanto eu agonizava sem ar no chão. Meu pai ia me matar. A sua intenção era clara. Ele não ia parar, não tinha nada que o fizesse voltar atrás na missão de acabar com a minha vida. Eu já estava tão fraco, que nem ao menos reagia. Foi quando ouvi o som de vidro se quebrando e ele parando de me bater. A minha mãe, Ana, tinha quebrado um jarro de vidro na cabeça dele, mas isso não surtiu efeito, ele apenas ficou tonto.

Pude ver o seu olhar maligno se voltando contra ela. Ele foi em sua direção e a pegou pelo pescoço. Eu, sem conseguir me mexer, não pude ajudá-la quando aquele desgraçado começou a bater a sua cabeça na parede. Eu estava tão fraco que nem gritar eu conseguia. Uma dor tão grande me invadia por dentro, que chegava a ser maior que a dor do meu corpo físico. Ver a minha mãe sendo espancada diante dos meus olhos era muito pior do que ser agredido por ele.

Eu estava muito angustiado, ele não parava de bater a cabeça dela na parede... Dessa forma, ele poderia... Ele iria acabar...

- AAAAAAAAAAH -Esse foi o som do grito mais desesperador que já ouvi na minha vida, saindo da boca da minha mãe. Foi quando eu senti seu sangue espirrar no meu rosto e o seu corpo cair desacordado no chão. Meu pai, se é que dá pra chamá-lo assim, pareceu finalmente cair em si e me encarar apavorado. Essa é a última lembrança que eu tenho de toda a cena, antes de finalmente ceder à dor e à agonia que há algum tempo se esforçavam em me fazer dormir.

Acordei em um lugar todo branco e com luzes brancas. Eu estava com muita dificuldade em respirar. De repente, percebi que tinham vários fios conectados ao meu corpo, uma máquina fazendo som de "bip" ao meu lado e um tubo na minha garganta. Comecei a me debater em agonia por causa daquela situação.

- Doutor, doutor! Ele acordou!! -A voz era familiar, mas eu ainda estava tão perdido em agonia, que não consegui olhar quem estava ao meu lado. Um homem de branco entra no meu campo de visão.

- Calma, rapaz! Está tudo bem. -Ele tenta me tranquilizar, mas é em vão. -Eu vou botar umas gotinhas de calmante no soro dele, só pra que ele fique menos agitado e a gente consiga retirar a entubação. -Dito isso, alguns minutos depois, eu acabei dormindo de novo.

Acordo, só que agora sem toda aquela aparelhagem em mim. Demoro um pouco pra abrir os olhos por causa da luz, mas logo me acostumo. Olho pro lado e vejo a minha tia, Alyne, irmã da minha mãe.

- Tia? -Chamei com a voz fraca.

- Oi, meu amor... -Ela se aproximou de mim, passando a mão nos meus cabelos.

- Cadê a minha mãe? -Essa é a primeira pergunta que eu faço. Ela desvia o olhar e tira a mão da minha cabeça. Algo estava muito errado.

- É... Bem, ela... A sua mãe... -A minha tia tenta falar, mas suas lágrimas não deixam.

- Fala logo, tia! Eu tô ficando preocupado! -Vê-la chorar estava me deixando muito nervoso.

— A Ana infelizmente já não está mais aqui entre nós, Felipe. A sua mãe agora virou uma estrela. Ela tá no céu, meu menino. -Ela finalmente consegue falar, enquanto segura forte a minha mão. E num passe de mágica, era como se eu não estivesse mais ali. Eu estava só, numa escuridão sem fim. Eu não conseguia enxergar o que tinha ao meu redor. Estar dentro de mim, da minha pele, era a pior sensação que eu poderia sentir. Tudo deixou de fazer sentido. Eu simplesmente desliguei naquele momento.