Capítulo 20

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Felipe

Era a minha primeira vez no cinema. Parecia tão surreal quanto eu imaginava. O tamanho da tela, as poltronas, a escuridão da sala, tudo! Assistimos a um filme de ação, e era incrível a qualidade do áudio e da imagem. Parecia até que eu estava dentro do filme. Foi uma das melhores experiências da minha vida.

- Gostou do filme? -Gabriel me perguntou assim que saímos da sala.

- Foi demais! -Respondi, empolgado. -Todas aquelas naves, tiros e efeitos especiais!

- Tu é muito fofo, sabia, moleque? -Gabriel falou, passando a mão na minha cabeça, enquanto sorria. Ele me abraçou de lado.

- Ih, qual é, Gabo, tá vacilando? Sai fora que o irmão é meu! -André se colocou entre nós dois e passou um dos braços ao redor da minha nuca. Ele estava com a feição seria, mas eu não sabia se ele estava realmente falando sério, ou apenas brincando.

- Larga mão de ser ciumento! O Felipe agora é meu irmão também. Se ele é seu irmão, ele é meu.

- Nada disso. O Felipe pertence única e exclusivamente à minha família. Não dividimos com ninguém.

- À sua familia, não, né? A você. Você é o único parente que me sobrou. -Respondi, pensando meio alto. Os dois ficaram calados por mais tempo do que eu imaginava. -Eu falei alguma coisa errada? Desculpa, eu...

- Não, você não tem que se desculpar por nada. Tá tudo bem... Vem, eu tenho uma surpresa pra você. -Ele apressou o passo e me levou junto. Chegamos em uma loja de roupas. -Aqui você pode escolher o que quiser.

- O que eu quiser? -Fiquei surpreso.

- É! Vem, vamos começar a escolher algumas peças.

- Não, espera, eu... Eu não quero. Já tenho roupas o suficiente.

- Ah, mas roupa nova nunca é demais, né? Fora que aqui as roupas são de marca, tem uma qualidade melhor... -André tentou me convencer. A verdade é que eu estava constrangido. Eu não estava acostumado a esse tipo de coisa. Minha mãe comprava roupa pra mim só no natal e às vezes no meu aniversário.

- Não precisa, de verdade. Eu não quero incomodar...

- Ei, olha pra mim. -André segurou o meu rosto. -Você não incomoda. Nunca! Ouviu bem? Compre essas coisas porque agora você pode fazer isso. Nós temos dinheiro. Eu sei que essa não é a realidade de muita gente, eu entendo e respeito isso, mas essa não é mais a sua realidade e você também precisa entender. Eu sou seu irmão mais velho e gosto de cuidar de você. Além do mais o meu pai deixou o cartão dele comigo justamente pra isso. Agora vamos!

Entramos na loja e eles me ajudaram a escolher muitas peças de roupa. Na verdade, a maioria eram eles quem escolhiam pra mim. Eu achei bem legal, eles tinham bom gosto. Gabriel e André cuidaram muito bem de mim no shopping. Eles toda hora perguntavam se eu estava bem, se eu queria alguma coisa, se queria água, comer ou ir ao banheiro... Ah, e quando eu ficava nervoso por causa da quantidade de pessoas, o André segurava a minha mão até o nervosismo passar. Era muito estranha a sensação de me sentir amado e cuidado por outras pessoas que não fossem a minha mãe. Eu nunca tive amigos. Na minha antiga escola, ninguém falava comigo, e eu era proibido de sair pra brincar na rua, então ter outras pessoas, principalmente outros garotos, mais velhos, com uma condição financeira melhor que a minha, que vivem em outra realidade, agindo daquele jeito comigo... De alguma forma, eu não me sentia digno daquele tratamento. Confesso que ainda havia um certo bloqueio em mim. Era como se eu não conseguisse relaxar por completo com eles, ou me entregar àquela relação, como se em algum momento aquilo fosse acabar, ou a qualquer instante eles fossem me abandonar, igual a todos os outros.

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