NADA SE COMPARA

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Me lembro daquele dia como se fosse ontem. Tinha chegado da escola. Tinha nove ou dez anos não me lembro bem, acho que foi no dia do acidente. Eu tinha nove anos, então foi definitivamente no dia do acidente. Naquele dia meu pai deveria ter ido me buscar no colégio, mas ele não apareceu então o pai de um colega me deixou em casa. O caminho até a porta de entrada parecia longo demais. A mochila era pesada nas minhas costas, mas caminhei avidamente. Ao chegar na entrada meu cachorro não apareceu. A última vez que eu o vi foi de manha quando ele latia e chorava.

"Charlie, Charlie, Charlie, Charlie, Charlie, Charlie, Charlie"

- Charlie, onde você está? – falei chamando por ele.

Uma voz em minha cabeça dizia aquele nome sem parar. Procurava pelo cachorro branco e enorme que sempre me recebia com amor, mas ele não apareceu. Havia uma música alta sendo tocada no rádio. Uma música romântica do Foreigner. A música estava realmente alta.

Joguei minha mochila em cima do sofá e olhei em volta. Cheguei aos pés da escadaria e pensei em subir as escadas, mas por algum motivo decidi seguir até a cozinha. Ao chegar na cozinha vi uma movimentação estranho no quintal. As longas portas de vidro com adesivos de estrelas e lua pairavam lá no alto.

Me aproximei da porta de vidro e observei em silêncio o mesmo homem estranho da lembrança anterior. O homem que eu não conhecia. Ele estava com a roupa daquele dia. Roupa social e gravata, mas ele parecia sujo de sangue. Ele cavava um buraco e parava as vezes para limpar o suor da testa. Mais abaixo vi ele deitado no chão. Imóvel. O cachorro estava sem vida jogado logo aos pés.

Sem piscar eu observei atento enquanto o estranho homem se movia para cima e para baixo tirando terra do buraco e jogando em cima da grama verde. Tudo o que eu podia pensar era "porque aquele homem está arruinando o gramado? Mamãe vai mata-lo".

Alguns segundos depois o homem jogou a pá no chão e em seguida olhou para o lado e pareceu mover a boca e foi quando do nada minha mãe apareceu. Ela se abaixou ao lado do meu pai e ambos jogaram o cachorro dentro do buraco.

- Charlie! – falei baixo tocando o vidro. Eu iria sentir falta dele.

Assim que ele jogou o cachorro no buraco eu dei dois passos para trás e sai da cozinha. Sabia que iria me encrencar se aquele homem e minha mãe vissem que eu estava lá. Quando coloquei a mão no corrimão da escada para subir senti uma mão tocando meu ombro.

- Mason – falou uma voz conhecida.

Olhei para trás e vi Lea. Ela colocou o dedo na boca para que eu não fizesse barulho. Ela segurou em minha mão e nós começamos a subir as escada em silêncio. Antes que déssemos mais do que três passos senti duas mãos fortes me segurarem e me puxarem para trás. Não foi com violência. Era o homem estranho. Olhei atrás e vi que minha mão estava logo atrás dele. Agora de perto podia ver que ele estava realmente sujo de sangue. O homem se ajoelhou na minha frente e colocou as mãos em meu ombro. Aquilo me incomodava.

- eu amigão, você precisa guardar um segredo – falou ele colocando o dedo na minha boca. Sabia que iria me encrencar por ter visto aquilo no jardim. Lea estava logo atrás de mim e ela parecia assustada. Ela estava de braços cruzados e eu podia jurar que seus lábios temiam. Do que minha irmã tinha tanto medo?

Ainda estava sentado ao lado de Ursie encostado na parede. Ursie tampava a boca. Ela parecia surpresa com a cena que ela viu. Ela tinha um sorriso malicioso em seu rosto.

- está rindo do que? – falei olhando pra ela.

- e você ainda pergunta? – falou ela tirando a mão na boca.

- pare de rir. Ele vai ouvir – falei levantando os braços – me ajude a levantar.

- OK – falou ela me ajudando a ficar de pé – ele beija bem?

Deus AmericanoOnde histórias criam vida. Descubra agora