NAO E A PRIMEIRA VEZ

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Sinto falta da minha inteligência, do meu modo de pensar, mas não sinto falta do jeito que eu costumava beber. Sinto falta das minhas conversas que agora não passam de poeira em minha memória. Eu tinha um jeito de ver através das minhas próprias falhas. É tão confuso, eu pensei que me conhecia, que conhecia meu jogo, mas em um amontoado de "eu" tudo o que encontro é "quem?". Tenho saudades do tempo em que eu costumava ser apenas mais um. Sinto falta de poder deitar e apenas apreciar um dia de verão, sinto falta do meu humor inteligente. Sinto falta dos bons tempos em que eu não sentia falta disso.

Era horrível não me lembrar. Era horrível não saber. Todos a minha volta sabiam mais do que eu sobre eu mesmo e eu odiava essa sensação. Ninguém me dizia o que tinha acontecido, oque foi que eu fiz, todos queria que eu descobrisse sozinhos. Já não é sofrimento o bastante estar sozinho comigo mesmo? Alguém que não conheço?

Era noite e eu estava sentado no gazebo no meio do jardim na casa de Kevin. A luz brilhava lá no alto e as estrelas estavam cintilantes e majestosas como milhares de pontos. Estava enrolado em um cobertor porque estava muito frio e na mesa a minha frente um copo de chocolate quente. Esses momentos erma raros. Kevin vivia no meu pé. O encontro que tive um minha imã Lea nessa mesma tarde tinha me intrigado. Estava tentando me lembrar de algo sobre mim e tenho a impressão que eu gostava de escrever poesia. Eu meio que tinha um jeito com palavras.

Kevin tinha feito um jantar leve com verduras e legumes no vapor com frango grelhado. Tinha ficado gostoso, mas sabor não tinha nada a ver com o que ele fazia. Tudo o que ele fazia era me irritar. Ele ficava no meu pé o tempo todo perguntando onde fui, onde estive, onde vou... tive que mentir quando cheguei em casa. Disse que fui até o shopping para tentar relaxar e tentar me livrar da visita irritante de Ava.

No fim das contas acho que não era Ava que era irritante em si, mas o modo dela agir como se me conhecesse a muito tempo. Estava com raiva da minha cabeça idiota e do meu cérebro imbecil que tinha perdido minhas memórias. Algumas perguntas pareciam não ter respostas e as respostas que eu conseguia só levavam á mais perguntas. Ao dobro de perguntas, ao triplo de perguntas... estava cheio de perguntas e respostas, só queria ficar sozinho.

- o que está fazendo ai sozinho? – perguntou Kevin chegando a gazebo me dando um baita susto.

- que susto – falei com raiva. Kevin não me deixava em paz.

- o que está fazendo aqui?

- estou tentando me lembrar de algo.

- eu osso te ajudar se quiser – falou Kevin se sentando na cadeira de frente para mim.

- sabe eu não quero sua ajuda... eu faço melhor quando estou sozinho – falei tomando um gole do meu chocolate quente.

- você ainda está irritado pela Ava?

- olha a casa é sua. Você deixa quem quiser entrar.

- ela é sua também – falou Kevin apertando os lábios.

- por favor não fica forçando.

- o que eu fiz pra te irritar? – perguntou Kevin tentando ser paciente.

- talvez nada... talvez tudo – falei respirando fundo e olhando para a escuridão do seu jardim.

- eu tive uma conversa com a Ava e pedi que por enquanto ela não apareça por aqui. Pelo menos até você melhorar.

- então é bom ela ir se acostumando porque não parece que algo vai acontecer tão cedo.

- não seja pessimista.

- não estou sendo pessimista, estou sendo realista. São coisas bem diferentes – falei me levantando.

- onde você vai?

Deus AmericanoOnde histórias criam vida. Descubra agora