21. PERMUTA

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Corro pelas árvores, imaginando o pior. Meus pés mal tocam o chão enquanto galhos e folhas passam por mim como borrões. O som do rio à frente se mistura com o pânico pulsando em meus ouvidos. Cada sombra entre as árvores parece esconder um perigo iminente.

Quando chego à beira do rio, ofegante, Mei está lá, trêmula e pálida como cera, andando de um lado para o outro no barranco. Seus olhos estão arregalados e ela murmura palavras inaudíveis, parecendo estar em transe.

Nim está sentado à raiz da mesma árvore onde descansei horas atrás. Ele possui uma postura derrotista, mas levanta a cabeça quando percebe minha presença. Seus olhos, que primeiro brilham com alívio por me rever, rapidamente escurecem em desespero.

— Você apareceu — ele diz. Não há emoção em sua voz.

— Eu... Eu estava... Eu precisava...

Ele levanta a mão para dispensar minha tentativa patética de justificar minha ausência no acampamento.

— Esqueça isso. Temos novos problemas agora.

Estou tão atordoado que nem ligo mais para o que Hearley me contou no refeitório. Minhas palavras saem quase automaticamente.

— Eu vi o Encantador.

Nim assente lentamente.

— Nós também.

— Ouvi um grito — continuo, minha voz entrecortada. Ele aponta os olhos para Mei, que ainda anda em círculos, esfregando as mãos nos braços e murmurando de forma incompreensível. — Onde está Chen?

Nim baixa a cabeça e fixa os olhos no chão, recusando-se a responder. Mas seu silêncio é mais eloquente do que qualquer palavra.

Minhas exigências vacilam com o súbito entendimento do que se passou aqui.

Passo por Mei e ponho-me em frente a Nim, respirando fundo para tentar estancar o negror corrosivo que mais uma vez se instalou em meu peito.

— Para onde?

— Para onde você acha? — Ele suspira.

Sacudo a cabeça, tentando afastar os pensamentos sombrios.

— Não pode ter sido para a ilha. Pelo menos... não ainda.

Ele franze a testa.

— Porque não?

— É melhor falarmos disso em particular — digo em voz baixa, espiando Mei de esguelha.

— Está tudo bem. Mei não é uma ameaça. Podemos confiar nela.

Franzo o cenho, surpreso com a defesa inusitada.

— Você, defendendo Mei? — Arqueio uma sobrancelha.. — O que foi que eu perdi?

Ele suspira novamente, dessa vez com um toque de exasperação.

— Estivemos em companhia um do outro no hospital enquanto você estava desacordado. Ficamos caminhando pelo bosque à sua procura nas últimas quatro horas. Tivemos muitas oportunidades para conversar e nos acostumar um com o outro.

— Tá, mas Hearley...

— Eu sei. Ela me contou o que ele falou pra você — interrompe-me. — Assuntos da minha família são sempre difíceis.

Se tivéssemos nos esbarrado horas atrás, eu certamente ficaria furioso com ele e faria questão de manifestar isso. Agora, essa questão não está mais no topo da minha lista de preocupações.

— Se quer saber — digo —, no seu lugar eu também deixaria isso enterrado.

Ele solta um riso amargo.

Neblina - Livro IOnde histórias criam vida. Descubra agora