— Você tem vênus em Gêmeos, Lawrence — é a primeira coisa que eu escuto de Normani quando entro no carro naquela manhã de quinta-feira. É apenas a segunda semana de aula e eu já fiz uma amiga crente e uma amiga mística. Tenho certeza que estou no caminho certo para sobreviver o resto do semestre e o resto do ano.
— Eu tenho o quê?! — pergunto com cara amarrada de sono por ter acordado mais cedo por causa de Ally e passado até de madrugada jogando Fifa 13 depois de sair do telhado — você está me xingando, por um acaso?
E eu preciso mencionar aqui: descer do telhado foi muito mais difícil do que subir. Camila riu da minha cara quando minhas pernas tremiam na escada para descer.
No entanto, antes mesmo de Normani abrir a boca para me explicar o que isso significa, percebo uma quarta presença no carro. Eu congelo, abro a boca uma ou duas vezes e olho para Ally pelo espelho retrovisor. Meu coração bate acelerado como nunca bateu antes e eu pressiono minhas costas contra o acolchoado do carro, como se tentasse me fundir a ele e desaparecer de repente. Me sinto invadido, como se alguém tivesse acabado de me dar uma rasteira. Será que vai Ally ficar chateada se eu sair do carro e ir andando pra escola?! Bufo, puto da vida. Me manter afastado dos populares vai ser mais difícil do que eu pensava.
— O que ela está fazendo aqui?! — Não escondo a surpresa e a irritação no meu tom de voz quando a líder de torcida me encara com um sorriso de desculpas.
— Porque não disse que Camila é sua vizinha? — Ally que pergunta antes de dar a partida no carro — não vai fazer mal dar carona pra ela também.
— Você virou motorista de Uber por acaso?! — Quando vejo os olhos de Ally lacrimejarem, mordo os lábios com força. Porra, Lawrence, parabéns, conseguiu fazer Ally chorar as 7h40 da manhã!
— Desculpe — a voz de Camila se faz presente pela primeira vez e é como um soco no meu estômago, porque ela parece estar tão chateada quanto Ally — Era Austin quem costumava me buscar, mas... Eu posso ir andando, não tem problema.
Ressentido, suspiro. Caminhar daqui até a escola é uma bela caminhada. Fazendo isso todos os dias e posso ficar tão bonito e musculoso quanto Troy Bolton. Até que não é tão ruim...
— Não — Ally fala firme no volante como se fosse uma mãe dando ordem — ninguém sair desse carro. É estúpido você ir andando quando todos nós vamos para o mesmo lugar.
Acho que estúpido é o máximo que Ally é capaz de xingar.
De qualquer forma, quem pode negar alguma coisa para uma baixinha irritada e furiosa? Ninguém, porque todo mundo cala a boca e apenas Normani consegue quebrar o silêncio constrangedor que se forma no carro:
— Vênus em Gêmeos, Lawrence...
No caminho até a escola, descubro que vênus é o planeta que rege o amor, portanto, todas as ações que posso tomar nesse campo é de acordo com o signo de gêmeos. O que eu acho uma baboseira total porque de acordo com Normani pessoas do signo de gêmeos são comunicadoras e se tem uma algo que eu não sou é comunicador, além de espontâneo. A única coisa que ela acertou é que pessoas de gêmeos são criaturinhas indecisas, tem dificuldades em manter compromissos e (errou de novo) tem uma tendência a flertar. Eu não flerto. Eu fujo de garotas bonitas.
Aproveitando que hoje chegamos mais cedo, vou direto à sala do orientador educacional para falar sobre as disciplinas que quero trocar porque hoje depois da escola tenho consulta com a minha psicóloga. Ainda não acertamos o dia da consulta, mas estamos decidindo alguma coisa entre segunda ou quinta-feira.
Deixo Ally, Normani e Camila pra traz, que, na verdade, vai correndo em direção as outras líderes de torcida assim que chegamos porque a morena com o cabelo pintado de loiro, que descobri chamar Dinah, já estava esperando por ela no estacionamento.
— Eu estava me perguntando quando ia ver você — o orientador é baixinho, quase do tamanho de Ally. Usa óculos em formato meia lua e me lembra Merlin, o mago. Exceto talvez, pela idade. Chuto que o homem deve estar na casa dos quarenta. Anderson Harris é o que está escrito em seu crachá. — Bem-vindo a minha sala, Lawrence.
Do jeito que ele me cumprimenta, parece que eu acabo de entrar na Batcaverna. Sua sala tem uma bandeira LGBTQ+ ao lado da bandeira Trans penduradas em um mural e quase que me sinto acolhido. Apesar da mensalidade ser cara e minha mãe estar se desdobrando para pagar, acertamos em ter me mandado para cá, eu tenho que admitir.
— Ah — vou entrando e me sentando na cadeira frente a mesa — estava?
— Sim — ele assente — você é um aluno interessante.
Reviro os olhos e faço uma careta. O que está errado comigo hoje?!
— Eu não digo isso por causa da sua identidade de gênero, se é o que está pensando — mordo os lábios com força, sabendo que é inevitável o fato da equipe da escola saber do meu nome morto porque é o que está escrito em meus registros. Ainda não conseguimos mudar meu nome na minha ID e quem quer que visse a minha certidão de nascimento, saberia — eu digo isso porque no seu registro da escola anterior mostra notas altas em disciplinas de exatas e vejo que você cursou Robótica nas eletivas do seu freshman year, mas tudo o que pegou aqui em Coral Bay foi carpintaria, finanças e Matemática Avançada.
Eu acho que as notas altas eram a única forma de fugir da realidade. Quanto mais eu sofria, mais eu me exilava das outras pessoas e sentava no meu quarto para estudar e esquecer do mundo. Chris era o único que conseguia quebrar essa barreira e me chamar para fazer outras coisas, como jogar futebol ou caminhar na luz do sol. Desde que ele foi embora, não tinha me dado conta do quanto sentia falta dele e dessas pequenas coisas. Mas pelo visto, sinto sim.
— Eu já frequento uma psicóloga — sei que alfinetar um adulto é errado, ainda mais alguém que está tentando te ajudar, mas não consigo evitar, parece que levantei da cama errado hoje — e ela já me auxiliou a tentar mudar as disciplinas e na verdade, é isso o que vim falar com você.
Harris dá um sorrisinho maroto e diz:
— Eu só estava esperando você pedir — ele ri — e eu acho sensato você escolher algum esporte para fazer... Temos natação, a equipe do time de rugby e acho que você ouviu falar que estamos sem quarterback.
Natação?! Ele ficou LOUCO?! Perdeu a cabeça?
Acho que tem mais de dez anos que não entro numa piscina.
— Desculpe — falo de imediato — acho que não consigo lidar com esportes agora.
— Tudo bem — o homem responde — o que é uma pena, adoraríamos ter mais uma pessoa LGBTQIAP+ no time de futebol. A garotada aqui é bem aberta, sabe... temos jogadores gays.
Olho pra ele como se tivesse crescido uma segunda cabeça no homem. Se houvesse uma pessoa fora do padrão hétero cis no time de futebol da minha antiga escola, ela seria comida viva ou colocada pra ser queimada como as bruxas eram no século dezesseis.
Suspirando e voltando para o assunto inicial como se nunca tivesse feito aquela sugestão absurda, Anderson Harris pergunta:
— Então, você quer mudar todas as disciplinas eletivas?
— Todas — de repente, me lembro de algo: — Todas menos Matemática Avançada.
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Lawrence
FanficLawrence Jauregui está começando uma nova vida. O último ano do ensino médio está prestes a começar e agora que ele finalmente deixou seu nome morto para trás e tem a aceitação completa de sua mãe e de seus irmãos, ele conhece Camila Cabello, a líde...