— Certo — Normani fala enquanto enche uma bacia de água — agora você toma banho com essa mistura aí.
— Eu não vou tomar banho de sal grosso! — respondo desesperado para Normani.
Escuto Taylor gargalhar da sala de estar e encolho os ombros, ficando encabulado de repente. Porque todo mundo de repente resolveu tirar uma com a minha cara?
— Você vai sim — É Camila que abre o primeiro sorriso desde que toda a merda aconteceu — detenção com Austin aos sábados, por um mês, Law? Cowell pegou pesado demais.
— Pelo menos ainda estou dentro do time — faço uma careta — poderia ter sido pior.
Hoje é sábado à tarde. Tive a minha primeira detenção de manhã e foi tão ruim quanto poderia ter sido: eu e Austin brigamos, discutimos, e eu joguei um balde de água no garoto, o que aumentou minha detenção em mais uma semana. Camila faltou a semana toda, e antes de retomarmos as aulas na semana seguinte, Dinah achou uma boa ideia nos reunirmos todos para tentar animá-la. Até que funcionou, porque ela está rindo de novo, mas às custas de quem? Das minhas.
E apesar de ter molhado Austin das cabeças aos pés na detenção, quem precisa de um banho de água fria para processar tudo o que tem acontecido sou eu. Não consigo acreditar que vou ter que aturar o ex-quarterback por mais quatro sábados.
— Você tem algum outro tipo de banho para afastar o mal olhado? — Dinah pergunta a Mani — Isso seria útil.
— Sabe o que funciona mais do que banhos, Dinah? — Ally tem um sorrisinho sacana no rosto prestes a rir — uma boa oração!
Camila ri com carinho.
— Só funciona pra quem crê, Allycat.
O novo apelido de Ally funciona. Melhor que X9 ou até mesmo homofóbica do ano, posso dizer que Allyson não esperava fazer alguns amigos quando esse ano começou. Ainda me lembro da garota sem jeito que encontrei na biblioteca no primeiro dia de aula.
— Ei — tento fazer Normani mudar de ideia — porque não fazemos uma leitura de tarot agora?
Normani no mesmo instante joga a água da bacia de volta na pia e todos nós nos dirigimos a sala. Cada um ocupa algum lugar no sofá e ficamos assim pelas próximas horas. De vez em quando, minha mãe desce até a sala apenas para conferir que está tudo bem e quando o relógio bate às 19h, estamos prontos para pedir pizzas e minha mãe pronta para sair.
— Onde a senhora pensa que vai? — é Taylor quem pergunta com uma sobrancelha arqueada — com essa roupa e tudo.
Minha mãe olha pra gente com um leve divertimento no olhar.
— Quer dizer que agora uma mulher adulta não pode ter encontros?
Faço uma careta.
— Mãe! — eu nem sequer sabia que minha mãe está conversando com alguém. — Quem é o cara?
— Quem disse que é um cara? — Ela arqueia ainda mais a sobrancelha — Esses dias eu estava pesquisando e descobri uma coisa chamada heteresoxualidade compulsória e eu pensei que...
— Mãeeeeee — gemo em desgosto ao pensar na minha mãe saindo com alguém. Mas, no final, é só para tirar sarro dela. Porque vê-la toda arrumada e pronta para sair enche meu coração de carinho. Por tanto tempo ela abdicou da vida dela para cuidar da gente, e agora, vê-la querendo sair e se divertir me deixa com menos peso na consciência — só não volte depois das 23h00, está bem?
— Você já foi melhorzinho, Lawrence.
Ela pisca pra mim e depois disso, não demora muito a ir embora. Me acomodo um pouco melhor no sofá, tentando colocar uma distância confortável entre Camila e eu.
— O que é heteresexualidade compulsória? — Ally pergunta pra mim com confusão estampada em seu rosto e logo abro um sorriso, querendo explicar o que pudesse para Allyson.
— É a ideia de que as pessoas são pressionadas a serem heterossexuais — falo pra ela — desde pequenos somos ensinados que o "normal" é que meninos gostem de meninas e vice-versa. É a suposição de que todos devem ser heterossexuais.
— Mas... — Ally morde os lábios enquanto se acomoda no chão, frente a Normani que está embaralhando as cartas de Tarot — você é um garoto e você é hétero.
— Eu sou? — Mordo os lábios, perguntando e atraindo o olhar de todos. Minha identidade de gênero é muito bem resolvida, obrigado. Mas minha orientação sexual? Às vezes acho que posso ser bi. Porque, convenhamos, meninos podem ser atraentes quando não estão sendo babacas, mas não sei, é tudo muito confuso. Há áreas de cinza. As coisas não são tão preto no branco. — Às vezes me pergunto se eu não poderia gostar de garotos também. Mas acho que isso ainda não aconteceu.
Sinto o olhar de Camila queimando em minha pele. Acho que preciso mesmo de um banho de sal grosso.
— Veja — Camila sorri — eu sou pan.
Engulo em seco, tentando não me animar muito. Ela ser hétero, pan, bi ou um E.T. não importa pra mim.
— Pan? — Acho que a coitada da Allyson vai desmaiar. — A sigla LGBTQIAP+ já não está grande demais?
— Nunca é tarde demais para incluir mais pessoas... — reflito. E é verdade. As pessoas precisam se sentir incluídas. Isso faz maravilhas para a autoestima.
— Pansexuais se atraem por qualquer gênero — continua Camila, tentando explicar para Allyson — seja a pessoa trans, cisgêneros ou não-binária. No final das contas, são apenas pessoas.
Sei que Allyson quer perguntar sobre pessoas não-binárias, mas acho que já está demais para um dia só. A nova informação da sexualidade de Camila se faz presente no meu cérebro e tento comprimir essa informação para que tenha a mesma importância do mosquito flutuando em cima das cartas de tarot. Nula.
No entanto, meu mundo parece ruir mais uma vez quando ela resolve soltar uma bomba no mesmo instante em que Normani está prestes a virar a primeira carta.
— Foi por isso que Austin e eu terminamos — ela fala e ao mesmo tempo que está revelando algo sobre si mesma, está também matando minha curiosidade. — Eu falei que era pan e ele surtou. Me chamou de puta e tudo.
Irritado, me levanto do sofá de forma brusca. Sentindo a mesma raiva de antes, comprimo os lábios com força caminhando em direção a porta. Porque Austin é tão idiota? Ele tinha a melhor pessoa do mundo na palma da mão dele e a tratou como lixo. Eu sei que Camila é cheia de defeitos também, ela não é perfeita, mas quando você olha pra ela, começa a se questionar coisas.
Uma vez que estou no jardim de casa, sinto a primeira lágrima a escorrer. Chateado por estar chorando, vou indo até o telhado dos avós de Camila, onde eu e a líder de torcida costumamos nos encontrar de vez em quando. Querendo um pouco de paz e sossego, até mesmo para afastar meus próprios sentimentos de mim mesmo, subo as escadas até o topo, sentindo a brisa fresca da noite em meu rosto.
Ela sente falta da irmã e por mais que tente negar, também é só uma garota que sente falta de ter uma mãe presente. Ela faz o possível e o impossível para vê-la de novo. Ela ama seus avós e o jeito que ela tem tratado Ally é bonito de se ver.
Quero entender porque as pessoas são tão mesquinhas. Porque Austin se achou no direito de fazer isso com Camila? Ninguém é tão mal assim de nascença, ou é? As pessoas nascem más e sem possibilidade de conserto conforme crescem? Porque o que Austin fez foi maldade. O olhar triste de Camila quando o assunto é trazido à tona é como uma faca enfiada em meu coração.
O meu maior medo é que minha privacidade fosse quebrada e a dela quebrou.
Quero consertar as coisas pra Camila, porque Deus sabe como o retorno às aulas amanhã vai ser difícil, mas também não há nada o que eu possa fazer e isso me mata aos poucos. Não sei porque quero tanto ajudar Camila.
Talvez um dia eu entenda meus próprios pensamentos.
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Lawrence
FanfictionLawrence Jauregui está começando uma nova vida. O último ano do ensino médio está prestes a começar e agora que ele finalmente deixou seu nome morto para trás e tem a aceitação completa de sua mãe e de seus irmãos, ele conhece Camila Cabello, a líde...