Não é fácil curar um coração partido. Tampouco esquecer sentimentos deixados para trás. As cigarras cantavam preguiçosamente, as folhas das árvores se balançavam e o ar da província tranquila me recebeu, envolvendo os meus cabelos em um movimento suave. Mas nada daquele cenário mágico me fazia sair do estado de tristeza em que me encontrava.No dia seguinte ao fatídico dia em que despedacei o coração daquele que eu amava, viajei junto com mamãe, Yuina e Tia Miya para Fukuoka, onde morava minha avó materna. Desde então, fazia uma semana que eu estava aqui, cercada pelo verde e pelo cenário tranquilizador, retirado de um filme do Studio Ghibli.
E ver esse cenário maravilhoso e não ter com quem compartilhar era o que mais me doía. Quando a noite caiu e o céu abrigou as estrelas, que brilhavam livremente sem o impedimento das luzes da cidade, meu celular captou a luminosidade delas. No primeiro dia, busquei o contato de Aono, indecisa sobre a vontade de enviar ou não enviar, mas não precisei quebrar tanto a cabeça. Meu contato estava bloqueado.
Senti as lágrimas rolarem pelas minhas bochechas, encarando a foto de perfil vazia. As conversas antigas me receberam com um acalento triste, risadas, fotos da Nyakko e um passado que ameaçava não voltar mais. Aono também havia saído do grupo com o quinteto, e apesar de sempre ter os meus amigos para compartilhar detalhes da viagem, principalmente as gêmeas curiosas - que me intimaram a enviar atualizações diárias -, não era a mesma coisa. Ele não estava lá.
- Sophie, querida, já está pronta? Não podemos chegar atrasadas no templo.
Assenti e encarei o meu reflexo no espelho. Com a época de festivais, era comum que os moradores do bairro da vovó se reunissem em celebrações destinadas ao Deus da Chuva. Todo ano, uma jovem era escolhida para ser a sacerdotisa responsável por dançar em agradecimento às proteções alcançadas, e esse ano, mesmo após muitos pedidos meus para que a matriarca repensasse a escolha, vovó me escolheu.
Após a briga com Aono e o "rompimento" da nossa amizade, passei a me sentir culpada e retomar sentimentos que parte do meu coração já havia aterrado. Se eu não estivesse ali... Se não tivesse tomado o lugar de Sophie, as pessoas não sofreriam. O namoro com Kentin não estaria ameaçado. Aono conseguiria encontrar a fagulha da vida ao se envolver com Kana. Ele não precisava de mim. Ninguém precisava.
- Sophie, querida, você está... Linda. - Hanako sorriu ao olhar para a composição de roupas que eu usava. Vovó havia sido bastante rigorosa em relação às vestes tradicionais, não abrindo mão de nenhuma peça. Ao encarar o espelho, me vi vestida como uma verdadeira sacerdotisa, com um hakama¹ de cor vermelha, hakamashita branco e fitas da mesma cor que prendiam o meu cabelo. Meus olhos haviam sido pintados com sombra clara, e os lábios em um tom de vermelho-rosado. Encarando o reflexo de Hanako, que me olhava como uma mãe orgulhosa olha a sua filha, senti o quão doloroso era estar tomando o lugar de outra pessoa.
O céu estava estrelado e refletido no caminho de pedras que me levou até o centro do santuário. Em meus ouvidos, habitava a música suave que envolveu as minhas mãos ocupadas com sinos. Meu corpo se moveu suavemente, seguindo o ritmo da melodia doce que me apresentou aos moradores que observavam a neta de Ichikawa.
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Minha Nova Vida Sendo a Estrangeira
Fanfiction"Essa não é uma história típica dos contos de fadas. Troque a maçã envenenada por uma tentadora taça de vinho. A bruxa maléfica, por uma donzela da sociedade. E o mais importante: a mocinha não é a personagem principal. Até agora." Emilli não acorda...