VOLTAR PARA A escola causava um pouco de preocupação em Marcela. Seria a primeira vez que encontraria Maria Antônia e Maria Alice desde que tinha saído de casa, duas semanas antes. A madrasta tinha decidido deixar a casa e se mudar com as filhas para um apartamento. Marcela não tinha trocado uma palavra com as gêmeas desde que o fizera, segundo sua advogada, por orientações da mãe.
Não que a três tivessem conversas profundas antes disso, e não que isso fosse mudar, mas era desconcertante. Ainda que a interação entre as garotas fosse mínima, foram muitos anos morando juntas. Mesmo que ainda fosse tratada como uma estranha pelas gêmeas, para ela, isso tinha algum significado.
Como esperado, as duas garotas passaram por Marcela como se ela não existisse, rumo ao grupinho que estava posicionado no mesmo canto de sempre no pátio.
À exceção, é claro, de Jonas.
— Oi. — Cumprimentou ela, aliviada por ele estar ali. Tinha se acostumado à presença calmante do garoto e ao conforto que lhe trazia.
Um momento estranho se instalou entre os dois, pois Marcela sabia que com Jonas postado ao seu lado, sua invisibilidade havia sido comprometida. Ela tentou comunicar para ele, com o olhar, que não se sentia confortável para nenhum tipo de demonstração pública de afeto. Ainda que já tivessem se beijado mais de uma vez. A última coisa que queria naquele momento era um alvo postado em suas costas.
— Oi — ele disse, interpretando perfeitamente sua expressão. Marcela se arrependeu imediatamente de não aceitar o abraço que ele parecia pronto para lhe dar.
Os dois lançaram um olhar para o ponto do pátio em que o grupinho se congregava.
— Antônia e Alice se recusam a olhar na sua cara? — Jonas perguntou, indo direto ao ponto.
— Sim. Minha advogada, quer dizer, sua mãe — ela sorriu para ele —me disse que as coisas não estão muito boas para a madrasta no processo. Estão tentando fazer um acordo para não ter que prestar contas do que ela fez com a minha herança desde que meu pai faleceu. Isso tem gerado... animosidade.
— Mas era o esperado, não? Sua madrasta já sabia que teria que dar explicações sobre o dinheiro.
— Eu não sei o que esperava... de todo modo, a doutora Marta me explicou que, ao contrário do que Andrea sempre me disse, o dinheiro do meu pai era importante para que elas sustentassem o estilo de vida luxuoso que levavam. Agora que Andrea não tem mais acesso à minha herança condição de tutora, as coisas não são tão simples.
Não que as gêmeas estivessem demonstrando algum tipo de fraqueza. Ainda estavam exibindo seus acessórios de última moda, os rostos idênticos maquiados e cabelos perfeitamente arrumados, com certeza no salão.
As garotas do grupo – Sofie, Bárbara e Lua – lançaram olhares gelados para Marcela, como se fossem capazes de ouvir a conversa. Outrora, isso teria sido o bastante para apavorar a garota, mas não mais.
Era mais difícil ser intimidada quando se tinha uma casa de verdade para voltar depois da escola, rede de apoio e, bem... confiança. Em si mesma, mais do que qualquer outra coisa.
Marcela sabia exatamente quem era, e um ou outro comentário maldoso de uma menina malvada na escola não seria mais o bastante para assustá-la. E qualquer que fosse o desconforto que sentia na presença das gêmeas, isso não significava que Marcela não estava pronta para se defender de qualquer ataque, embora preferisse evitar o confronto.
— Decidi que não vou pedir a restituição do dinheiro que foi usado — ela contou a Jonas, voltando seus olhos para ele.
— O quê? — Jonas se exasperou, jogando os ombros para trás — Por quê?
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Cinderela às avessas
Dla nastolatkówPalácios, vestidos brilhantes e sapatinhos de cristal não fazem parte da realidade de Marcela Leone. Órfã de mãe desde bebê e de pai pela metade de sua vida, a garota foi obrigada a convencer seu coração sonhador de que não há fadas madrinhas ou prí...