O hospital continuava sua rotina, o som dos passos apressados dos enfermeiros ecoava pelos corredores, misturando-se ao barulho de máquinas e monitores. A luz que entrava pela janela era suave, um sinal de que o dia ainda estava começando. Naquela manhã, Luísa decidiu se permitir um momento fora da sala. O cansaço a dominava, mas não era apenas físico; a dor de ver Clara naquele estado a consumia por dentro. Então, ela saiu para tomar um café, ainda que hesitante em deixar Clara sozinha, mesmo por um breve instante.
Ao se afastar, Luísa olhou uma última vez para a porta do quarto, respirou fundo e seguiu para a pequena lanchonete do hospital. Enquanto estava ali, seus pensamentos giravam em torno de Clara. Cada segundo longe dela parecia uma eternidade, e mesmo tentando afastar os piores pensamentos, o medo estava sempre à espreita. Seu coração, apesar de forte e resiliente em tantos momentos, agora parecia frágil, como se estivesse constantemente prestes a desmoronar.
Ela pegou o café, sentou-se em uma das mesas isoladas e segurou a xícara entre as mãos, o calor tentando trazer algum conforto. No entanto, a angústia permanecia. Luísa olhou pela janela e, por um instante, imaginou Clara ali com ela, sorrindo e fazendo algum comentário sarcástico sobre como aquele café não era "digno" de uma manhã juntas. Aquela Clara forte, cheia de vida, parecia tão distante agora.
Enquanto ela estava perdida nesses pensamentos, algo inesperado aconteceu. Luísa viu, de longe, um grupo de médicos e enfermeiros saindo da sala de Clara, conversando entre si de maneira preocupada. Seus corações pareciam mais acelerados do que o normal, e isso chamou a atenção de Luísa imediatamente. Um aperto gelado subiu por sua espinha, e o café, antes tão quente, já não tinha sabor.
Ela franziu o cenho, sentindo uma onda de pânico crescendo em seu peito. Deixou o café intocado na mesa e levantou-se apressadamente. Suas pernas, antes tão firmes, pareciam hesitar a cada passo, enquanto seu coração batia forte e rápido. "O que aconteceu?", perguntou-se, lutando contra o medo crescente. Uma série de pensamentos horríveis inundou sua mente: "Será que Clara teve uma parada cardíaca? Será que algo deu errado enquanto eu não estava lá?".
Luísa começou a andar mais rápido pelos corredores, empurrando gentilmente as pessoas que encontrava em seu caminho, até que começou quase a correr. Ao se aproximar do quarto, viu mais médicos saindo, conversando em vozes baixas, o que a deixou ainda mais desconcertada. Era como se o chão estivesse se abrindo sob seus pés, como se o mundo ao seu redor estivesse desmoronando em câmera lenta.
Ela parou na porta do quarto de Clara e, antes de entrar, ouviu a voz de uma médica. Seus pés congelaram no chão. O som era claro, mas as palavras não faziam sentido em sua mente atordoada. Sentiu como se estivesse presa em um pesadelo, sem saber o que esperar. O medo de abrir a porta e encontrar Clara em um estado irreversível fazia seu coração martelar contra o peito.
Finalmente, tomando coragem, Luísa empurrou a porta. O que viu a deixou sem palavras.Ali, deitada na cama, envolta por todas as máquinas e fios, estava Clara. Mas desta vez, algo era diferente. Seus olhos estavam abertos. Não apenas abertos, mas vivos, alertas. E o olhar de Clara foi direto para os de Luísa, como se tivesse esperado por esse momento durante todo o tempo que esteve inconsciente.
Luísa congelou no lugar. Por um segundo, não conseguia acreditar no que via. Sua mente lutava para processar o que estava diante dela. "Clara acordou", pensou, o coração acelerando ainda mais. O rosto de Clara estava pálido, mas seus olhos brilhavam com uma intensidade que Luísa reconhecia tão bem. Ela tentou sorrir, mas as máquinas ao redor a impediam de falar ou de fazer qualquer movimento maior.
— Clara... — a voz de Luísa saiu baixa, trêmula, quase como um sussurro, enquanto se aproximava da cama, o medo de machucá-la ou de interromper aquele momento a mantinha hesitante.
Ela deu alguns passos à frente, mas a emoção a deixou paralisada. Lágrimas começaram a encher seus olhos antes mesmo que ela pudesse controlá-las. Era um alívio tão grande vê-la ali, finalmente acordada, mas ao mesmo tempo, era devastador vê-la tão vulnerável, presa àqueles tubos e monitores.
Clara, sem poder falar, tentou mexer os dedos da mão, que estavam descansando ao lado de seu corpo. Seu olhar não deixava o de Luísa por um segundo sequer. Era como se, com o simples contato visual, ela estivesse dizendo tudo o que não conseguia expressar com palavras. Uma força silenciosa, uma promessa de que, apesar de tudo, ela estava ali e lutando.
Luísa aproximou-se devagar, com a respiração irregular, sentindo as lágrimas descerem por suas bochechas. Ela se ajoelhou ao lado da cama, e com toda a delicadeza do mundo, pegou a mão de Clara entre as suas. Os dedos de Clara estavam fracos, mas ela ainda conseguia apertar, ainda que de forma sutil.
— Eu... eu pensei que tinha te perdido — sussurrou Luísa, suas palavras saindo com dificuldade enquanto tentava controlar o choro. — Você... você me assustou tanto, amor.
Ela sabia que Clara não podia responder, mas o olhar de Clara dizia tudo. Havia amor, havia preocupação, e talvez até um pedido de desculpas silencioso pelo susto. Luísa inclinou-se um pouco, colocando a testa sobre a mão de Clara, sentindo seu calor, mesmo com toda a frieza do hospital ao redor. Ela fechou os olhos por um momento, deixando que as lágrimas caíssem livremente, mas agora, eram lágrimas de alívio.
Clara, por sua vez, fez o melhor que pôde para transmitir a Luísa que estava ali, que estava lutando, e que, por mais difícil que tivesse sido, ela ainda estava ao lado dela.
A médica, que estava de pé ao lado da cama, observava a cena com um pequeno sorriso de compaixão. Quando Luísa finalmente levantou a cabeça, enxugando rapidamente as lágrimas, a médica falou em um tom suave.
— Clara é uma lutadora — disse ela, com uma voz gentil. — Ela reagiu muito bem após a cirurgia. Vamos continuar monitorando, mas, por agora, o pior já passou.
Luísa assentiu, o alívio irradiando de seu rosto. Mas ao mesmo tempo, havia uma vulnerabilidade ali. Ver Clara naquela condição, mesmo acordada, era um lembrete cruel do quanto as coisas poderiam ter sido piores.
— Eu vou cuidar de você, amor... — murmurou ela, olhando nos olhos de Clara com um olhar determinado e carinhoso. — Não vou sair do seu lado até você estar totalmente bem.
Clara tentou mover os lábios, mas as máquinas a impediam de falar. No entanto, um pequeno sorriso se formou em seus olhos, um sorriso que Luísa conhecia bem. Mesmo em meio à dor e à dificuldade, Clara ainda estava presente, ainda era a mesma mulher forte e determinada que ela amava.
Luísa apertou a mão de Clara com mais firmeza, como se quisesse garantir que ela nunca a soltaria novamente.
E assim, naquele quarto silencioso, embora as máquinas continuassem a monitorar cada movimento de Clara, havia uma sensação de esperança que preenchia o ar. A luta ainda não havia terminado, mas, juntas, elas sabiam que poderiam superar qualquer obstáculo.Aquele olhar entre elas, aquele simples contato, era a promessa de que, apesar de tudo, elas continuariam lado a lado, em cada passo do caminho.
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À Prova de Fogo ( ROMANCE LESBICO )
RomantiekClara: Uma médica recém-formada de 26 anos, que acabou de começar sua residência em um hospital público de uma grande cidade. Clara é dedicada, metódica e tem um coração enorme, mas a pressão da medicina e a constante luta para equilibrar vida pesso...