O calor do fim de tarde fazia o asfalto parecer líquido, refletindo o sol que começava a se pôr. Luísa ajeitou o capacete sobre a cabeça e respirou fundo, o cheiro familiar de fumaça misturado com suor invadindo suas narinas. Era mais um dia comum na rotina da corporação de bombeiros, mas para Luísa, cada dia trazia consigo uma nova camada de exaustão. Depois de mais de uma década de trabalho, ela sabia que era importante se manter firme, mas o peso do passado sempre parecia um pouco mais forte a cada salvamento.
O chamado da vez era um incêndio pequeno, mas todo incêndio podia esconder surpresas. Ao chegarem ao local, Luísa liderou sua equipe com a competência que todos esperavam dela. As chamas se alastravam em uma casa antiga no centro da cidade, e o cheiro de queimado já dominava o ambiente. Enquanto os outros bombeiros se preparavam para apagar o fogo, Luísa foi informada de que havia uma vítima no interior da residência.
Com movimentos rápidos e precisos, ela entrou no prédio. As paredes de madeira estalavam sob o calor, e a fumaça densa dificultava a visão. Encontrou o homem desmaiado próximo à cozinha, provavelmente tentando controlar o fogo por conta própria antes de perder a consciência. Luísa o carregou para fora com agilidade, entregando-o aos paramédicos que já esperavam do lado de fora. Foi só depois, quando o fogo estava completamente sob controle, que ela notou o desconforto na pele do braço esquerdo. Uma queimadura leve, mas que precisava de atenção.
No hospital, a cena era sempre a mesma: enfermeiros correndo de um lado para o outro, pacientes esperando atendimento nos corredores, médicos exaustos tentando manter o ritmo. Clara estava em um desses corredores, conferindo os prontuários dos pacientes do plantão, quando ouviu o burburinho de que a equipe de bombeiros havia trazido uma vítima de queimadura.
Quando finalmente deu de cara com Luísa, percebeu que a vítima não era a única a precisar de cuidados. A maneira como a bombeira segurava o braço e a expressão fechada denunciavam o incômodo. Clara a reconheceu de imediato, já tinha ouvido falar de Luísa no hospital, como a bombeira destemida que parecia nunca se machucar, apesar dos riscos constantes. Clara se aproximou e, sem rodeios, pediu que Luísa se sentasse para examinar o braço.
Esse primeiro encontro foi breve e direto. Clara cuidou da queimadura com a eficiência de alguém que estava acostumada a lidar com situações de emergência. Luísa, por sua vez, manteve-se firme, agradecendo secamente antes de sair do hospital. No entanto, algo naquele encontro ficou na mente das duas, como uma fagulha que ainda não se tornara chama, mas que já estava presente.
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À Prova de Fogo ( ROMANCE LESBICO )
RomanceClara: Uma médica recém-formada de 26 anos, que acabou de começar sua residência em um hospital público de uma grande cidade. Clara é dedicada, metódica e tem um coração enorme, mas a pressão da medicina e a constante luta para equilibrar vida pesso...