Capítulo 43 - O Momento da Liberdade

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O tempo parecia passar de forma mais lenta do que o normal naquele dia. O relógio na parede do quarto de Clara marcava os minutos com precisão, mas para Luísa, cada segundo arrastava-se como se estivesse preso em uma maré de ansiedade e expectativa. Ela sabia que aquela tarde seria decisiva. Os médicos retirariam os tubos que mantinham Clara respirando mecanicamente, e o coração de Luísa estava dividido entre o medo e a esperança.


Ao lado da cama, Luísa olhava para Clara, que continuava com os olhos semiabertos, mas visivelmente cansada. O corpo dela ainda estava frágil, e as máquinas ao redor não a deixavam esquecer o quão grave havia sido o acidente. O barulho constante dos monitores fazia o quarto parecer uma extensão do próprio hospital – frio, impessoal, mas, ao mesmo tempo, era ali que Clara estava viva. E isso era o que mais importava para Luísa.


Do lado de fora da sala, ela ouvia o som de passos apressados, de vozes abafadas, provavelmente da equipe médica se preparando para o procedimento. Era um momento delicado, e a tensão no ar só fazia o estômago de Luísa se contorcer. Ela respirava profundamente, tentando manter a calma, mas o nervosismo era evidente. Suas mãos suavam levemente, e a cada olhar que trocava com Clara, sentia o peito se apertar de uma maneira indescritível.


— Vai dar tudo certo, amor... — murmurou Luísa suavemente, embora a própria incerteza de suas palavras a incomodasse. Ela queria mais do que tudo acreditar nisso.


Logo, a porta do quarto se abriu lentamente, e três pessoas entraram: dois enfermeiros e a médica responsável pelo caso de Clara. Eles usavam máscaras e toucas cirúrgicas, como sempre, mas havia algo no jeito que se moviam que indicava o quão crítico seria o momento.


— Boa tarde, Luísa — disse a médica com uma voz firme e calma, enquanto ajustava os instrumentos que estavam em suas mãos. — Estamos prontos para retirar os tubos da Clara. O processo vai ser tranquilo, mas requer muito cuidado, e precisamos que você fique tranquila também.


Luísa assentiu, sentindo a garganta seca. Suas palavras estavam presas, e ela sabia que, por mais que quisesse dizer algo, não tinha forças para falar naquele momento. O medo de algo dar errado a paralisava, mas ela precisava manter a confiança por Clara.


A médica se aproximou da cama, observando Clara atentamente antes de fazer qualquer movimento. Clara, por sua vez, olhava para cima, os olhos mais atentos do que antes, como se estivesse se preparando mentalmente para o que estava por vir. Ela parecia ansiosa, mas também decidida. Mesmo que estivesse fraca, o desejo de finalmente respirar sem a ajuda das máquinas era visível em seu olhar.


— Clara — disse a médica com suavidade, inclinando-se para que a paciente pudesse ouvi-la melhor. — Vamos retirar os tubos agora, mas preciso que você fique completamente relaxada, ok? Isso é importante para evitar qualquer complicação. Entendido?


Clara piscou lentamente, confirmando com um pequeno movimento da cabeça. Ela parecia exausta, mas havia determinação em seus olhos. Sabia que o momento era crucial, e faria de tudo para colaborar.


A médica, então, começou o procedimento com extrema cautela. Um dos enfermeiros ajudou a ajustar os aparelhos, enquanto o outro se preparava para monitorar os sinais vitais de Clara com ainda mais precisão. O silêncio no quarto se tornou absoluto, exceto pelos sons sutis dos monitores e do próprio respirador, que logo deixaria de ser necessário.


Luísa assistia a tudo de perto, com as mãos entrelaçadas no colo, as unhas cravadas suavemente na pele enquanto tentava conter a aflição. Ela observava cada movimento da equipe médica, seus olhos saltando de Clara para os profissionais, buscando algum sinal de que tudo estava indo bem.


A médica, com delicadeza e precisão, começou a remover o tubo traqueal, tirando-o lentamente para não causar nenhum dano ou desconforto adicional. Clara fechou os olhos por um momento, o rosto contorcendo-se levemente em dor. Luísa sentiu o estômago revirar ao ver aquele pequeno gesto de sofrimento, mas sabia que era necessário. Ela precisava ser forte.


O processo, que durou apenas alguns minutos, pareceu uma eternidade para Luísa. Cada segundo que passava era uma nova onda de ansiedade, até que finalmente o tubo foi completamente retirado. O silêncio que se seguiu foi preenchido apenas pelos bip contínuos dos monitores e pela respiração suave de Clara, agora natural, sem a ajuda de máquinas.


— Pronto — disse a médica, recuando um pouco e observando Clara com atenção. — Clara, você está indo muito bem, mas agora precisamos que você não tente falar, ok? Sei que deve estar ansiosa para isso, mas sua garganta ainda está muito sensível por causa do tubo. Por enquanto, mantenha-se calma e respire devagar.


Clara abriu os olhos e piscou, ainda ofegante. Ela queria desesperadamente dizer algo, qualquer coisa, para expressar o que estava sentindo, mas sabia que a recomendação da médica era importante. O esforço para falar poderia causar danos adicionais, e isso era o último que queria. Com um olhar cansado, mas de alívio, ela assentiu, indicando que compreendia.


Luísa observava tudo com uma mistura de alívio e preocupação. A respiração de Clara estava finalmente estável, mas a fragilidade do momento ainda era evidente. Ela não sabia se deveria sorrir ou chorar. Aproximando-se da cama, ela pegou delicadamente a mão de Clara, que estava mais fria do que o normal.


— Você foi incrível, amor — disse Luísa, mesmo sabendo que Clara não poderia responder. — Estou tão orgulhosa de você...


Clara piscou novamente, e seus lábios esboçaram um pequeno sorriso. Seus olhos, agora mais focados, estavam fixos nos de Luísa, transmitindo tudo o que ela não podia dizer em palavras. Luísa sentiu o coração se aquecer ao ver aquele sorriso, por menor que fosse. Era um sinal de que Clara estava ali, com ela, lutando e resistindo.


A médica fez mais alguns ajustes nos aparelhos e se aproximou de Luísa, mantendo um tom sereno.


— Ela está se recuperando muito bem, Luísa — explicou. — Mas como mencionei antes, a Clara ainda não poderá conversar. Precisamos dar um tempo para a garganta se recuperar completamente. O processo de remoção do tubo pode deixar a área bem sensível.


Luísa assentiu, olhando para Clara, que parecia tentar se concentrar em respirar calmamente. Os olhos dela estavam atentos, mas havia sinais claros de exaustão.


— E quanto tempo até ela poder falar normalmente de novo? — perguntou Luísa, sua voz carregada de preocupação.


— Depende de como a recuperação evoluir, mas não deve demorar muito — respondeu a médica. — O mais importante agora é que ela não force nada. Só o fato de estar respirando por conta própria já é um grande avanço. Com um pouco de paciência, tudo vai se resolver.


Luísa olhou para Clara com olhos brilhando de emoção. Sabia que o caminho ainda seria longo, mas o pior já havia passado. Ela apertou suavemente a mão de Clara, que a segurou de volta com delicadeza. Mesmo sem palavras, aquele gesto dizia mais do que qualquer coisa que Luísa pudesse ouvir.


— Vai ficar tudo bem — disse Luísa, com a voz embargada de emoção, as lágrimas se acumulando em seus olhos. — Nós estamos quase lá. Você é forte, amor. Vamos passar por isso juntas.Clara, sem forças para falar, apenas olhou para Luísa com gratidão e amor nos olhos, enquanto as lágrimas discretas de ambas se misturavam naquele silêncio cheio de promessas e esperança.

À Prova de Fogo ( ROMANCE LESBICO )Onde histórias criam vida. Descubra agora