O sol começava a despontar sobre o Rio de Janeiro, anunciando o fim do inverno com sua luz suave e promissora. As primeiras horas da manhã eram envoltas em uma calma peculiar, como se a cidade estivesse despertando lentamente de um sono profundo. A luz filtrava-se através da janela quebrada do apartamento de Sofia, desenhando padrões de ouro sobre o chão de madeira desgastada. O calor da primavera ainda estava distante, mas o frio do inverno dava sinais claros de que estava se despedindo, deixando para trás uma aura de esperança e renovação.
Sofia estava na cozinha, com os cabelos presos em um coque desajeitado e o rosto marcado pelo sono. O café borbulhava na panela, enchendo a cozinha com um aroma acolhedor e familiar. A luz matinal filtrava-se por entre as frestas da janela, transformando o ambiente em uma tela de tons dourados e quentes. Ela ligou a TV para buscar um pouco de distração, esperando que o noticiário matinal pudesse desviar sua mente dos pensamentos que a atormentavam.
A tela da TV piscou para a vida, e imagens vibrantes de ondas e surfistas em ação preencheram o espaço. Um repórter, com um tom entusiástico e contagiante, destacou o sucesso de Daniel em Portugal. Sofia franziu a testa, o café quase transbordando da panela enquanto seus olhos fixavam a tela. O repórter falava sobre a última competição de surf, elogiando Daniel por seu desempenho impecável e sua crescente popularidade. "Daniel Moreira está arrasando nas competições," dizia o repórter, seu entusiasmo quase palpável.
As palavras ressoavam como um eco distante, uma lembrança dolorosa de um passado que Sofia tentava esquecer. Cada elogio, cada foto de Daniel sorrindo e celebrando, parecia um contraste cruel com a sensação de vazio que ela sentia. Ela tentou ignorar a sensação de traição, focando em preparar o café, mas a imagem de Daniel em sua prancha, a expressão de triunfo estampada em seu rosto, era uma ferida aberta que não cicatrizava.
Enquanto o café passava, a cozinha parecia silenciosa demais, como se o mundo lá fora continuasse em movimento enquanto ela estava presa em um instante de estagnação emocional. Sofia afastou a panela do fogo, seu olhar perdido nas ondas que dançavam na tela da TV. A cada manhã, as notícias sobre Daniel e suas conquistas em Portugal chegavam até ela, um lembrete constante de que sua vida havia se tornado uma sombra do que havia sido.
Mensagens esparsas de Daniel apareciam em seu celular, cada uma delas um frágil fio de conexão entre dois mundos distantes. "Estou pensando em você," dizia uma mensagem recente. "Sinto sua falta." As palavras eram carregadas de saudade, mas soavam vazias, como se Daniel estivesse falando de um lugar distante, onde Sofia não fazia mais parte da realidade dele. Ela tentava responder, mas as conversas logo se tornavam monólogos, e as mensagens de Daniel se perdiam no meio do caos de sua vida atual.
Através de amigos em comum, Sofia ouvia histórias sobre a nova vida de Daniel em Portugal. Um velho conhecido comentou casualmente sobre a incrível performance dele, e Sofia tentou disfarçar a dor com um sorriso forçado. "Ele está realmente indo muito bem," disseram. "Você viu as fotos dele? Parece estar aproveitando cada momento."
Cada relato era como uma faca afiada, cortando ainda mais fundo na dor que Sofia tentava esconder. Ela se agarrava ao pequeno conforto dos dias que se alongavam e das promessas que a primavera carregava, tentando encontrar algum vislumbre de esperança entre as ondas do passado e os ventos do futuro. O inverno estava se despedindo, mas dentro de Sofia, o frio ainda se mantinha firme.
O vento gélido da traição soprava dentro dela, mesmo com as cores da primavera começando a tomar conta da cidade. As árvores estavam começando a florescer, e o Rio de Janeiro parecia respirar aliviado, mas Sofia não conseguia sentir o calor dessa mudança. A traição tinha nome e rosto: Júlia. A mesma amiga que sempre surgia de repente, a mulher com quem ela havia desconfiado que Daniel tinha algo mais. E agora, essa suspeita se tornara realidade, um peso esmagador em seus pensamentos.
Sentada em sua cama, Sofia encarava a tela do celular, onde notícias sobre Daniel dominavam os portais de surf e esportes radicais. "O astro do surf brilha em Portugal," dizia uma manchete, acompanhada por uma foto de Daniel rindo e celebrando seu sucesso. Era como se nada tivesse mudado na vida de Daniel, enquanto Sofia sentia que o chão sob seus pés havia desaparecido.
As mensagens de Daniel, quando chegavam, eram tentativas frágeis de manter uma conexão. "Sinto sua falta," ele escrevia. "A competição está intensa, mas você está sempre na minha mente." Essas palavras soavam como um eco distante, um lembrete da distância emocional que agora separava os dois. Sofia lia e relia, tentando encontrar alguma emoção genuína nas palavras de Daniel, mas tudo parecia distante e descolorido, como se ele estivesse falando de um universo paralelo.
A mídia não ajudava. Imagens de Daniel sorrindo, abraçado a outros competidores e festejando seu sucesso, reforçavam a realidade dolorosa de que ele seguia em frente enquanto Sofia permanecia presa na dor da traição. Cada vez que o nome de Júlia ecoava em sua mente, uma raiva fria se misturava à tristeza, tornando a aceitação da verdade ainda mais difícil.
- Você viu a última dele? - perguntou Letícia, uma colega de faculdade, enquanto passava por Sofia no corredor. - Ele está arrasando, né? Deve ser incrível estar com alguém tão famoso.
Sofia apenas deu um sorriso forçado, sem responder. "Estar com alguém famoso" era o oposto do que ela sentia agora. Ela não estava mais com Daniel - pelo menos, não de verdade. O que restava era apenas o reflexo do que eles haviam sido.
Enquanto isso, Marcos se tornava uma constante reconfortante em sua vida. Ele estava sempre presente quando ela mais precisava de alguém, oferecendo um apoio silencioso e sem julgamentos. Marcos fazia-a rir com piadas bobas e oferecia ajuda com os estudos, seus gestos simples eram como um bálsamo para a dor que Sofia tentava esconder. Ele surgia em momentos inesperados, como uma brisa suave da primavera que oferecia consolo.
Apesar da presença de Marcos, a dor da traição e a distância emocional ainda eram impossíveis de ignorar. A presença dele era reconfortante, mas não era suficiente para apagar o que Sofia sentia. A traição de Daniel com Júlia ainda estava fresca, e o sucesso de Daniel, estampado em todas as manchetes, tornava essa dor ainda mais insuportável.
Sentada no ônibus a caminho da faculdade, Sofia olhava para fora da janela. As árvores floridas e o céu azul anunciavam um novo começo, mas dentro dela, o inverno ainda reinava. A primavera estava trazendo vida e cor ao mundo ao seu redor, mas o frio da traição ainda mantinha seu coração em um estado de congelamento emocional. Talvez um dia ela conseguisse deixar o frio para trás e abraçar a primavera que florescia ao seu redor. Talvez, mas o futuro ainda estava envolto em mistério e incerteza.
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Quatro estações
RomansaSofia e Daniel viveram um amor de verão, ardente e promissor, mas quando o outono chegou, a distância esfriou o relacionamento e as folhas da confiança começaram a cair. Mas será que o amor pode sobreviver às cicatrizes que o tempo deixou? "Quatro E...