O sol da manhã batia fraco nas janelas embaçadas da pequena cozinha do apartamento decrépito onde Sofia morava com sua avó, Maria José. As vozes distantes da cidade enchiam o ar, e os barulhos de trânsito e sirenes se misturavam com o chiado baixo da televisão ligada. A avó assistia ao noticiário enquanto Sofia, já pronta para o trabalho, tomava seu café apressada, tentando ignorar o burburinho crescente de uma reportagem que passava ao fundo.
“... surfista internacional, Daniel Moreira, foi visto ontem à noite com sua companheira em uma boate da zona sul.Sofia ainda é um mistério,porém sua mudança de visual foi uma surpresa para todos,paparazzis confirmam que Daniel esteve com ela mas não saíram juntos ...”
Sofia congelou, segurando a xícara de café a poucos centímetros dos lábios. Sua avó percebeu o desconforto imediato.
— Sofia, minha filha, isso é coisa de celebridade. Não deixe essas notícias te abalarem, — disse Maria José com sua voz doce e cautelosa, sem tirar os olhos da tela.
Sofia respirou fundo e colocou a xícara na pia. Era impossível ignorar. Desde que as fotos dela e Daniel saíram nas manchetes, sua vida nunca mais fora a mesma. Havia algo cruelmente invasivo em saber que cada gesto, cada encontro, estava sendo observado, comentado e distorcido pela mídia.
— Vou indo, vó. Já estou atrasada, — disse Sofia, tentando mudar de assunto, mas sentindo um nó no estômago.
Ela saiu do apartamento e desceu as escadas correndo, desviando de fios pendurados e postes enferrujados. O calor já começava a tomar conta do dia, fazendo o ar parecer mais pesado, carregado de tudo o que ela não queria enfrentar.
No caminho para a escola onde estagiava como nutricionista, as mensagens de Vanessa surgiam no celular:
Vanessa: "Vi as fotos. Vocês arrasando, como sempre. Certeza que ele vai fazer você se arrepender de não correr atrás dele."
Sofia não respondeu. Vanessa sempre sabia como mexer nas feridas de forma indireta, disfarçada de conselhos. Ela guardou o celular no bolso, desejando que o dia fosse menos turbulento do que sua mente.
Chegando à escola, as coisas não melhoraram. Ela sabia que o ambiente deveria ser um refúgio, uma rotina onde poderia se perder nas tarefas diárias, mas a realidade era outra. As crianças que almoçavam no refeitório cochichavam sobre ela. Sofia tentou ignorar os olhares curiosos das professoras enquanto revisava o cardápio do dia. Sentia-se exposta em todos os aspectos de sua vida.
— Sofia, está tudo bem? — perguntou sua colega de trabalho, Luana, enquanto ela ajustava o jaleco.
— Sim, tudo certo — Sofia forçou um sorriso. “Não posso fugir disso para sempre”, pensou.
O trabalho era sua única fonte de normalidade no meio de todo aquele caos. Enquanto organizava os alimentos, observava as crianças almoçando e, por um instante, sentiu a tranquilidade retornar. Mas foi passageiro. Sua mente voltava para Daniel, para Marcos, para a avalanche de dúvidas que a sufocava.
Ela terminou seu turno na escola com a sensação de que tudo à sua volta estava em suspenso. A faculdade era o próximo destino, mas antes que pudesse se concentrar nas aulas de Nutrição, o telefone vibrou no bolso. Era uma mensagem de Marcos.
Marcos: "Ei, podemos conversar? Não quero te pressionar, mas preciso saber o que você está sentindo."
A mensagem a pegou desprevenida. Desde o beijo na noite anterior, Sofia sentia uma mistura de culpa e confusão. Ela sabia que Marcos merecia uma resposta, mas sua mente estava uma bagunça. Como poderia dar a ele algo que ainda não tinha resolvido dentro de si?
VOCÊ ESTÁ LENDO
Quatro estações
RomansaSofia e Daniel viveram um amor de verão, ardente e promissor, mas quando o outono chegou, a distância esfriou o relacionamento e as folhas da confiança começaram a cair. Mas será que o amor pode sobreviver às cicatrizes que o tempo deixou? "Quatro E...