Eu sempre tive uma condição financeira muito boa, desde pequena. Meus pais são donos de diversas empresas e praticamente mandam em Madrid, mas às vezes eu só queria ter uma vida mais simples e normal, longe da elite. Estudo no colégio Las Encinas, um lugar cheio de gente rica, mas vazio de conteúdo. A maioria dos alunos só se importa com a aparência e com o status, o que me faz preferir ficar na minha, evitando criar laços mais profundos. Tem algumas pessoas legais, claro, mas muitas são insuportáveis, e eu já estou cansada de lidar com a falsidade.
Este último ano, em particular, está sendo um verdadeiro caos. O colégio está fervilhando de fofocas e brigas nos corredores. E para piorar ainda mais, caí na sala dos mais populares. Não suporto a forma como eles tratam os funcionários e os alunos bolsistas, como se fossem inferiores só por terem menos dinheiro. Isso acaba me irritando tanto que já arrumei confusão algumas vezes, defendendo quem eles menosprezam. Foi exatamente o que aconteceu hoje mais cedo.
Flashback on
Era segunda-feira de manhã, e eu ainda estava pagando o preço por ter exagerado na bebida na noite anterior. Minha cabeça latejava e meu humor estava péssimo. As aulas até que começaram tranquilas, o professor estava explicando sua matéria sem grandes interrupções. Mas tudo mudou quando ele decidiu tocar num ponto delicado: política. Bastou isso para que a sala virasse um verdadeiro campo de batalha verbal.
— Tem que ser muito burro e elitista para apoiar o capitalismo — comentou uma garota da turma, com um tom sério e cheio de convicção. Eu não a conheço muito bem, mas já tinha percebido que ela era uma das poucas que tinha um pouco mais de consciência social. — Está claro que o socialismo é o melhor sistema para a sociedade.
Antes que alguém pudesse concordar ou discordar, Isadora, a rainha da futilidade, resolveu se meter na conversa.
— Helloo, bebê — ela começou, com aquele sorriso de desdém típico dela. — Comunismo é coisa de vagabundo que não gosta de trabalhar. Nunca que isso daria certo na Espanha, só afundaria o país.
Eu já estava com a paciência no limite por causa da dor de cabeça, e o jeito condescendente dela foi a gota d’água. Não consegui me segurar.
— Então você é comunista, Isadora? — perguntei, com o tom de provocação evidente.
Ela olhou para mim, surpresa, sem entender onde eu queria chegar.
— Claro que não, não ouviu o que eu acabei de falar? — respondeu, confusa.
— Ouvi, por isso mesmo — continuei, aumentando a intensidade da provocação. — Você não gosta de trabalhar, só brinca de ser DJ. Logo, deve ser comunista, né?