Capítulo vinte

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 "Que bom que a acústica aqui é tão ruim," sussurrei, tirando meu pé do sapato e colocando em cima do dela. Estava escuro, mas as toalhas de mesa certamente eram curtas o suficiente para alguém poder ver, caso olhassem para nós. 

Ela levantou as sobrancelhas um milímetro. Não sei se era a situação, ou a mulher, ou o vinho, ou uma combinação dos três, mas eu me sentia ousada. "Espero que a mente delas seja suja o suficiente para colocar as palavras certas na minha boca," falei, alisando devagar a pequena parte da perna dela que eu conseguia alcançar com o dedo do pé por baixo da barra de sua calça. Foi a primeira vez que nos tocamos, além dos apertos de mãos. 

Podia sentir ela me olhando – e os olhares de alguns outros clientes também – mas recusei olhar para cima, em vez disso, colocando um pouco de creme no meu café, mexendo-o, e levando a colher à boca. Deslizei-a para dentro e a lambi até deixá-la limpa, com um gesto exagerado. Seria algo engraçado sob circunstâncias normais, mas espero que o álcool e a atmosfera estivessem ao meu favor. Se eu pudesse deixar a lauren desconfortável ao menos a metade do que ela me estava deixando, então eu ganharia. 

 Claro, o tiro estava terrivelmente saindo pela culatra. Eu não sabia dizer se o olhar dela a era totalmente uma atuação ou não, mas eu estava toda arrepiada. Mesmo com minha meia-calça e o tecido da meia dela, eu podia sentir o calor da sua pele em meu pé. De repente, minha boca ficou muito seca. À luz baixa, seus olhos pareciam escuros. Era impossível dizer se suas pupilas tinham mesmo ficado maiores, ou se, talvez, outra coisa estivesse crescendo Não, não, não.

 Sai dessa, camila! Afastei o pé abruptamente, limpando a garganta e ajeitando-me na cadeira. O encanto foi quebrado. O carro chegou alguns minutos depois, e deixei que ela me levantasse e me guiasse até lá fora, com sua mão na minha cintura. Sim. Lá estava. E tão cedo, também. Mais tarde, nosso relacionamento seria descrito como "furacão". 

Eu tinha certeza disso. Ela tinha um apartamento no centro da cidade, em um daqueles arranha-céus com porteiro. Um porteiro de verdade. Nestes dias e nesta era. Olhei para ela e o cumprimentei, sorrindo e apoiando-me nos braços de lauren. Fingia estar um pouco mais bêbada do que realmente estava. O porteiro me cumprimentou e me deu um sorriso como se soubesse de algo. 

 O tempo no elevador parece que demorou uma eternidade. Um silêncio pesado permeava o ar. Passei os dedos pelos cabelos, minha cabeça ainda tonta por causa do vinho e a emoção do fingimento. O porteiro pensou que fossemos um casal.Todos iriam pensar que éramos um casal. Eu precisava admitir que havia certo prazer perverso nesta coisa toda. "Qual é a graça?" lauren falou, e percebi que eu estava sorrindo como uma idiota. "Não sei," respondi. 

 "Tudo." Ela pareceu um pouco incomodado quando finalmente chegamos ao nosso andar e saímos do elevador. Não sabia o que eu tinha dito ou feito para aborrecê-la. Poderia também ter sido cada coisinha que eu fiz, ou uma combinação de todos os meus erros que foram se acumulando. E se ela estivesse arrependendo-se da decisão de me escolher? Esse pensamento deixou-me enjoada – por causa do dinheiro, tinha quase certeza. E, claro, porque eu nunca gostei de desapontar ninguém. Ela abriu a porta da frente e entramos. 

 A frente do apartamento parecia uma exibição de móveis. Meus sapatos faziam barulho nas madeiras polidas do assoalho enquanto eu caminhava pelo corredor, passando por uma mesinha feita de madeira preta brilhante, com uma plantinha de bambu em cima. Estava posicionada como se fosse, 

um lugar para colocar as correspondências, mas colocá-las ali arruinaria a ilusão de uma casa perfeita das revistas de desing. Mais à frente, havia dois sofás brancos impecáveis um de frente para o outro em cada extremidade de uma passadeira cinza que levava até uma lareira enorme. Tirei os sapatos e suspirei, resistindo ao desejo de massagear minhas têmporas. "Volto em um instante," disse lauren, dirigindo-se até a escada que eu presumia levar até seu quarto. "Sinta-se em casa." 

(continuar)

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