Um som agudo, mais muito baixo rompera do mesmo ponto em que veio o tiro do canhão. Depois de alguns segundos eu percebi que o som agudo era, na verdade, um zumbido.
Puxei as duas machadinhas do meu cinto.
— Se preparem, está vindo algo aí! — eu falei.
Pelo canto do olho eu vi a Zoe posicionar o chicote, o Kyle embainhar a espada e Misty preparar uma flecha no arco.
O zumbido aumentava, não perecia um enxame de abelhas, porque o som de um enxame de abelhas eu conheço muito bem. O zumbido aumentava.
Uma massa cinzenta surgia em meio às distantes árvores que se aglomeravam à uns quinze metros de distância, foi aí que eu percebi que não se tratava, mesmo, de um enxame de abelhas, mas sim de um enxame de vespas.
Em meio à nuvem escura de vespas um rapaz vinha gritando e sacudindo as mãos, nos mandando correr. Olhei para trás e vi a cara de espanto dos meus amigos, eles viram minha cara de medo. Todos entenderam o recado.
— Zoe, nós vamos correr, — eu disse — desta vez eu te avisei!
Começamos a correr ainda na direção que íamos no caminho, sem nenhum obstáculo à nossa frente, o garoto continuava correndo junto com as vespas, eles estavam à cerca de cinco metros da gente.
De repente, nenhum sinal de caminho, ou estrada, ou, seja lá o que for que nós estivéssemos seguindo, tudo o que víamos à nossa frente agora era floresta. Nós mantemos o passo, ainda correndo, entrando na floresta.
Galhos, arbustos e folhas me acertavam em cheio, meus braços coçavam, meu pescoço e meu rosto ardiam em chamas, mas eu continuei correndo. Quando eu me dava o luxo de olhar para trás, eu via as vespas se aproximando cada vez mais. Eu já podia ver o rapaz, ele era Rick, o Tributo do Distrito 4, ele estava com uma mochila lotada nas costas, ele sacudia as mãos involuntariamente tentando espantar as vespas, que nesse momento eu já sabia que não eram vespas, elas eram teleguiadas.
Teleguiadas são vespas, criadas pela capital para serem usadas na guerra dos Dias Escuros. Elas parecem vespas comuns, mas são maiores e têm o veneno infinitas vezes pior ao das vespas. Eu já vi muitos Tributos morrem nas mãos — digo, nas patas — desses insetos em outras edições dos jogos, e posso dizer, a morte é horrível.
Eu já estava cansado, essa floresta parecia ser infindável. Minhas pernas sangravam de cortes causados pelos espinhos de arbustos, meus braços estavam repletos de enormes bolhas amareladas, minha cabeça doía, mas o pior começara agora, algumas teleguiadas conseguiram nos alcanças, suas ferroadas doíam mais que cem facadas, eu me contorcia de dor mesmo correndo. Eu chorava, as lágrimas voavam no ar se misturando às folhas secas e às teleguiadas.
Eu vi Misty cair no chão, ela estava completamente vermelha, seus braços totalmente arranhados, sua bochecha estava com uma bolha enorme proveniente da picada de alguma teleguiada. Eu não resisti tinha que ajudá-la, corri até ela e segurei no colo, Kyle tentou me impedir, eu não deixei, ele disse que eu corresse, as teleguiadas me picavam vorazmente. Eu olhei para trás e vi a Zoe também caída no chão, eu corri até ela, ela não estava respirando, a nuvem de vespas acabara de se aproximar, o Rick passou correndo por mim, eu me levantei e continuei a correr, as teleguiadas me acertavam em todos os lados.
Tudo em minha volta girava como em um carrossel de desespero, formas coloridas serpenteavam pelo ar, o som do meu coração estava tão audível quanto a minha própria voz. Eu vi o Rick cair, seus braços ainda sacodindo durante a queda, ele estava com a cara redonda de picadas. A minha visão escurecia, então eu tropecei no corpo inerte do Rick, caí espalhando as folhas secas que ardiam em contato com a minha pele, fiquei deitado no chão, observando as teleguiadas tomarem conta do corpo musculoso de Rick. Tudo girou de uma vez só, e escureceu. A última coisa que eu ouvi, foi o som distante do canhão.
Eu abri os olhos devagar, olhei em volta, eu estava no lago próximo da minha casa, o sol brilhava como nunca, as ondas do lago refletiam a luz nas rochas que o rodeavam, pinheiros e carvalhos se espalhavam pela grama que circulava o lago, se transformando em uma floresta. Ao longe eu podia ver Circe brincando com o Argos de pega-pega, eu me levantei, minhas costas doíam, mas nenhum sinal de picadas ou hematomas pelo meu corpo, eu vi minha mãe lavando roupa nas pedras da cachoeira da lagoa. Era um sábado perfeitamente ensolarado, o dia de lavar roupas.
— Arion, meu filho! Agora que você acordou, pode me fazer um favor e trazer o sabão que eu deixei no carro, por favor? — ela gritou do outro lado da lagoa.
Confirmei com a cabeça e fui andando até o carro, eu estava descalço, podia sentir a grama em meus pés, e depois, a areia quente da estrada, passei pela Circe, ela me olhava estranhamente, o Argos não estava mais com ela.
Uma pequena sombra me seguia, até ela dar algumas voltas e pousar no meu ombro, eu pude saber que era o Bill. Era tão reconfortante ele estar em meu ombro.
O sol de verão queimava as minhas costas, e tudo só piorava quando aquele vento quente batia na minha cara.
Eu pude ver a caminhonete do meu pai estacionado no meio do caminho, abri a porta do carona e peguei o sabão caído no chão do carro, saí, e, quando eu ia fechar a porta, uma voz grossa rompeu. Meu pai.
— Arion, o que você está fazendo aí? — ele estava no banco do motorista com uma garrafa de cerveja na mão, o seu péssimo hábito.
— Eu vim pegar o sabão que a mãe pediu, pai, por quê? — respondi.
— Sua mãe não pediria sabão a você, Arion! — ele deu dois longos goles na cerveja.
— Porquê, não, pai? — perguntei.
— Porque ela está morta, seu irmão está morto, eu estou morto!
Nesse momento nós estávamos no palco em frente ao Prédio da Justiça, toda a plateia, todas as pessoas do nosso Distrito nos encarando, as bolas de vidro estavam cheias de papéis boiando em sangue, eu não estava entendendo nada, todos os holofotes focavam em mim, mas de repente eles focaram em outra pessoa, meu pai estava sentado bem à minha frente no trono do Presidente Snow, segurando uma pistola, ele sorriu para mim com aquele sorriso invejável, pôs a pistola na boca e acionou o gatinho. O estouro ribombou em meus ouvidos, tudo girou e girou.
Em minhas mãos estava a pistola que há pouco meu pai usara. O seu corpo ensanguentado se moveu e abriu os olhos. Ele segurou no cabo da pistola e me olhou.
— Quem me matou foi você!
Eu apertei o gatilho.
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No Labirinto
FanfictionSinopse: Arion é um adolescente de dezesseis anos, que se safou muito bem de ser chamado nas últimas três edições dos jogos. Ele vive no Distrito 7 e sai todas as manhãs para sua jornada exaustiva de trabalho. Ele é o único dos irmãos que vai trabal...