Eu estava saindo de nossa sala de jantar quando me deparei com o Príncipe Thomas, em pé em frente à porta. Ele cumprimentou Victória e abriu um sorriso desajeitado quando me viu. Eu pensei que pudesse escapar, caso abaixasse a cabeça e passasse quieta por ele, mas logo senti seu toque em meu braço, que de forma delicado, soava como um pedido de desculpas.
— Posso falar com você?
Parte de mim queria evitar aquilo. No entanto, era algo com que teríamos de lidar, se fôssemos mesmo casar um com o outro. Então apenas concordei e saímos juntos dali. Como eu era uma de suas peças, talvez nossa conversa não chamasse tanta atenção das outras garotas, então fiquei um pouco menos nervosa. Ou pelo menos acredito que sim. No fim das contas, paramos naquele mesmo corredor em que tínhamos nos falado em minha segunda noite no palácio. Ficamos alguns minutos parados em silêncio, até que ele simplesmente se aproximou e tocou meus lábios com os dele.
Meus olhos quase pularam para fora e antes mesmo que eu fizesse algo suspeito, ele sussurrou que havia câmeras ali nos observando. Eu estava entre a tensão e a sensação de alívio por seu rosto permanecer ali, próximo ao meu, evitando que minha cara assustada fosse o que as câmeras registrariam. Ao levantar a vista pude ver seus olhos, que me pareciam tristes.
— Peço perdão por minha reação ontem — sussurrou para não ser ouvido por ninguém mais além de mim. — Não é que você seja uma má opção, é só que eu queria fazer isso por mim mesmo, se é que me entende. — Suspirou. — Você era uma opção. Gostei de você. Só... — fez uma segunda pausa, molhando os lábios. — Só que eu mesmo queria conquistar alguém para mim em vez de meu irmão escolher uma e eu simplesmente ter que fazer o que acabei de fazer.
— Você me beijou...
— Sim. Temos aquelas fotos nos bastidores e agora podemos dar a entender que algo aconteceu nesse meio tempo longe das câmeras. Liam disse que eles também têm imagens nossas daquela noite, na enfermaria e no seu quarto.
— Você me beijou.
— Sim. Por quê? — ele perguntou. Sua voz soava bem diferente de como seu corpo reagia. Qualquer um que nos observasse podia ver ele com a mão acariciando meus cabelos, como se fôssemos um casal apaixonado.
— Nunca... Eu... Quero dizer...
Foi então que seu rosto ficou pálido. Pude ver sua cor ir embora e sua mão aos poucos deixar meu cabelo.
Sim, eu nunca havia sido beijada por alguém antes, o que não é bem uma surpresa. E bem ali, sem emoção, sem aviso, sem nada, ele tinha tomado isso de mim. Foi bobo, eu sei. Nada além de um simples toque de lábios. Mas aconteceu. Ele tinha me beijado e eu senti como se tivesse roubado isso de mim.
"Nunca?", pude ouvir seus olhos dizerem, e quase ouvi as palavras em uma voz baixa e fraca. Eu apenas concordei com a cabeça e o nervosismo nele ficou bem mais evidente. Não demorou até que ele tomasse minha mão e me levasse dali, até um lugar privado.
— Sinto muito... Eu não sabia... Se tivesse suspeitado, eu não teria me atrevido. Eu juro! — disse andando de um lado ao outro da sala. — Fui um idiota! Peço mil desculpas.
— Tudo bem...
— Não! Sei que não está tudo bem. Se fosse com April, eu quebraria a cara do indivíduo que a tratasse assim.
— Não é a mesma coisa...
— Sim, é sim! Já comecei mal. Sempre faço a coisa errada. Qual meu problema? — continuou brigando consigo mesmo.
Ele ficou andando em círculo e indo de um lado ao outro da sala, até que desistiu e se sentou em um banco. Só então parei para olhar o ambiente em que estávamos. Uma espécie de sala de desenho. Tinha latas de tintas, panos manchados e várias telas espalhadas pela sala. Uma das mesas estava repleta de pincéis, mais pincéis do que achei ser necessário para usar por uma vida inteira. Nas paredes, vários desenhos emoldurados, pareciam ter sido feitos por crianças. Uma árvore, o sol, uma família com três crianças e dois adultos. Porém, quanto mais se olhava, melhor o artista ficava. Desenhos a lápis de árvores com muito mais detalhes que os outros, rostos, pinturas...
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Jogos da Ascensão - Livro 1 da Duologia Jogos da Ascensão
RomanceO mundo de Danitria já foi dividido em camadas. Mesmo que essas teoricamente já não existam, ela e sua família ainda vivem como formigas: trabalhadores braçais, que formam a base da sociedade, destinados a servirem os membros das camadas mais altas...