five

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[Matthew]

Segui o meu caminho ainda um pouco constrangido com a situação que tinha acabado de acontecer. Às vezes fico admirado com as coisas que eu próprio digo. Perguntar-lhe se nos víamos por aí acabou por ser a coisa mais ridícula que eu podia ter feito, tendo em conta que andamos na mesma escola, na mesma turma. Pareci tão estúpido.

A verdade é que parece-me estranho estar ao pé dela. Ainda não sei a razão por que estava a chorar naquele dia, a cantar com uma voz tão nostálgica e parecendo tão vulnerável. Adorava saber mas não me sinto no direito de lhe perguntar isso. Provavelmente são assuntos pessoais dos quais não se sentirá confortável a falar comigo. Conheço-a há dois dias, por muita curiosidade que eu sinta ela não tem de me explicar os seus motivos, como é óbvio.

[...]

Ouvi o som do meu alarme. Pus uma música que gostasse numa tentativa falhada de melhorar o meu humor. Eu não sou uma pessoa matinal. Sair da cama sem ter dormido doze horas, é tortura. Para ser sincero acho que nem sete horas dormi. Fiquei entretido a ver um filme ontem à noite e acabei por perder a noção das horas. Quando me deitei já era tardíssimo para alguém que tinha aulas no dia seguinte.

Fiz tudo aquilo que faço normalmente e desci para tomar o pequeno-almoço. Ainda tentei disfarçar o sono que sentia mas acho que não me estava a sair muito bem nessa tarefa porque não conseguia parar de bocejar.

- Deitaste-te tarde, Matthew? – o meu pai falou.

- Não, pai – menti.

- Parece.

- Só estou um pouco mais cansado porque não estava habituado a esta rotina – tentei disfarçar.

- Compreendo mas sabes que agora precisas de ter muito mais descanso. Não quero que vás para a escola quase a dormir, está bem? – avisou e eu assenti – Bem, eu vou andando. Queres que te deixe na escola?

- Eu vou a pé – recusei.

- Então até logo, filho. Juízo – despediu-se.

- Até logo.

Fiquei a acabar de tomar o meu pequeno-almoço enquanto um programa qualquer de notícias que não interessavam a ninguém passava na televisão.

- Matthew, ainda estás em casa? – a minha mãe perguntou ao fundo do corredor.

- Sim, mãe – respondi no mesmo tom que ela tinha feito a pergunta.

- Eu vou andando. Precisas que te leve à escola? – gritou novamente.

- Não, mãe.

- Então até logo – despediu-se.

- Até logo – disse gritando, outra vez.

Às vezes penso que a minha família não é muito normal. Teria sido muito mais inteligente da parte da minha mãe vir ter comigo e não berrar. Para não falar que seria muito mais fácil do que eu ter de andar a esforçar a minha voz logo pela manhã quando ela sabe perfeitamente que eu não sou uma pessoa matinal.

Logo que acabei de escovar os dentes fui diretamente à sala e peguei nas minhas coisas. Estava a ouvir um barulho de fundo e só aí é que me apercebi que tinha deixado a televisão ligada. Voltei à cozinha e tentei sem sucesso procurar o comando. Não percebo como os comandos desaparecem sempre misteriosamente nesta casa. Todas as vezes que são necessários nunca estão. Levantei a toalha em cima da mesa e nada. Verifiquei o chão pois havia uma possibilidade de ter caído e ninguém o ter apanhado, mas também não estava. Acabei por desistir, porque já estava a ficar atrasado e porque não estava com paciência para o procurar, então desliguei na própria televisão.

Faltavam cerca de dez minutos para a minha primeira aula então tive de sair de casa mais apressado do que o habitual. Andei sempre em passo apressado até que finalmente cheguei a casa do Nash. Da casa dele até à escola só deveríamos demorar uns três minutos e ainda faltavam seis. Acho que nunca tinha vindo da minha casa até aqui tão depressa.

- Que te aconteceu? Já estamos mais atrasados que o normal – Nash falou.

- Eu sei. Desculpa, atrasei-me um pouco – expliquei enquanto começávamos a andar.

- Tudo bem. Só disse porque fiquei preocupado.

- Tu preocupado comigo? – perguntei surpreendido.

- É claro que não. Estava preocupado em chegar atrasado, como é óbvio.

- Sim, viraste aluno aplicado agora?

- Sempre fui – respondeu convencido.

- Olá, pessoal – Shawn disse a sorrir e aproximou-se de nós assim que chegamos à escola. Não sei como ele faz isto mas consegue estar bem-disposto o tempo todo. Este rapaz até de manhã mantém a mesma simpatia que tem durante o resto do dia. Eu só acordo assim uma vez no ano que é quando me deito a horas decentes.

- Olá – eu e Nash respondemos.

- Aquela não é a vossa amiga? – Hayes perguntou apontando para uma rapariga a sair de um carro.

- Sim. Autumn? – Nash chamou-a e logo esta lhe sorriu e veio na nossa direção. Outra pessoa que acorda com boa disposição matinal, gostava de ser assim. Já tentei mas não sou capaz. Eu preciso de dormir e ter de vir para aqui ser torturado aumenta e muito o meu mau humor.

- Olá, rapazes – cumprimentou-nos.

- Olá – respondi e fiz a minha melhor tentativa de sorriso.

- Tudo bem, Matt? – perguntou-me.

- Estou só com sono, nada de mais.

- Não me digas nada. Também me deitei um pouco tarde ontem e agora arrependo-me – contou.

- Junta-te ao clube. Aqui o Matt faz isso praticamente todos os dias – Nash disse e deu-me uma palmada na nuca.

- Pois. Vamos ter com outros? – sugeriu.

- Sim, vamos lá – Shawn confirmou.

Hayes saiu e foi ter com os seus amigos. Eu, o Nash, o Shawn e a Autumn dirigimo-nos à sala dos alunos onde os restantes rapazes, e a Madison estavam. Faltava muito pouco para tocar e eu tentei mentalizar-me de que ia ter de passar várias horas na escola.

- Olá, rapazes e Madison – cumprimentei-os.

- Olá, Autumn – Madison disse.

- Olá, Madison – sorriu – Desculpa. Preferes que te chame Mads, certo?

- Se não te importares – Madison ou Mads respondeu.

O som familiar e torturante da campainha soou e quis atirar-me de uma ponte. Ter aulas de Matemática faz-me começar a ter pensamentos suicidas e é apenas o terceiro dia de aulas. Nem quero ver quando chegar ao final do ano.

Fomos para a sala e passado pouco tempo o professor entrou, dando início à minha tortura.

[...]

Finalmente a aula acabou. Óbvio que não foi muito má tendo em conta que foi a primeira aula mas só de pensar no que vou passar daqui para a frente começo a ter medo.

Saímos os três da sala e fomos ter com o nosso grupo. Logo os rapazes começaram a falar com a Autumn que me deixou contente por eles a tentarem integrar no grupo. A situação dela não deve ser nada fácil. Ter de mudar de escola e ainda por cima não conhecer ninguém deve ser muito mau.

- Matt, vens comigo à papelaria? Preciso de ir comprar minas para a minha lapiseira – Autumn pediu.

- Sim, tudo bem – sorri e fomos andando.

- Desculpa ter-te incomodado para vires comigo mas é que não conheço isto muito bem e és a pessoa com quem me sinto mais à vontade.

- Sou? – perguntei e sorri. Saber que ela se sentia bem comigo deixava-me feliz já que esse sempre foi o meu objetivo, fazê-la sentir-se integrada.

- Sim, tu e o Nash foram as primeiras pessoas a falar comigo.

- Pois – limitei-me a dizer.



Autumn | MEOnde histórias criam vida. Descubra agora