XXIII

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Morte...vida...morto...vivo...
...
Uma pequena luz surgiu da escuridão, olhos verdes o encaravam, seus olhos preferidos, cheios de sonhos...cheios de vida...morte...vida...
...
Dinny bufou.
–Com certeza eram eles.-disse, jogando-se em uma cadeira na sala de estar.
–Os gêmeos...por que?-perguntou Sophie confusa.
Arthur estava desacordado a três dias. Após desmaiar, Sophie o levou para dentro e Dinny observou a ferida no braço dele. Parecia superficial, mas a espada que havia feito o corte continha veneno.
Desde então, o feiticeiro havia dado antídotos para Arthur, na esperança de ver melhoras. O resultado fora positivo, mas Arthur ainda não acordara desde que havia desmaiado. Tinha momentos de delírios enquanto ficava brevemente consciente.
–Eles são a pura maldade, talvez piores que o pai.
Sophie estremeceu.
Piores que o pai.
–Eles estão trabalhando para ele então? Para o rei Aurum?
–Sim. Com certeza, minha cara sonhadora.
A garota balançou a cabeça.
–Você acha que eles seriam capazes de...matar...ele?
Dinny encarou a janela que dava para fora de sua casa. O dia estava claro. Ele imaginou como seria um dia normal novamente, com Lunna.
–Não sei por quê não mataram dessa vez.
...
–Se passaram três dias. Você acha que ele esta vivo?
Lucian estava sentado em uma cadeira na sala de música do castelo, de frente para um piano antigo, brincando com os dedos no teclado e tirando um breve som melancólico das mesmas.
Era uma sala escura como todo o castelo, e na realidade como qualquer lugar da Capital. Estava localizada em uma das torres do castelo de cristal, o que a fazia ter um formato circular. Duas janelas largas estavam dispostas por ela como a única forma de iluminação. E por mais que fosse uma sala de música, não haviam muitos instrumentos, além do piano e de um violoncelo.
–Não o subestime, irmão. Você viu o que aconteceu da última vez.-disse Lindolf.
Lucian tocou no peito esquerdo onde ele sabia que havia uma cicatriz por baixo da roupa e sentiu um frio percorrer pelo corpo.
–Tem razão. -ele passou mais uma vez as mãos pelo teclado –Mas então o que faremos?
–Primeiro pare com esse barulho irritante, sabe que odeio música.–Lindolf fechou com força o piano, dando tempo somente para Lucian tirar a mão.–Segundo, vamos sair essa noite com Gerard e Lyn para fazer uma visitinha a nosso querido irmão mais velho. Se ele não estiver em condições de nos ver...veremos então sua bela dama.-Ele abriu um sorriso de lado maldoso.
Gerard e Lyn eram os cavalos alados dos dois, entre todos os cavalos que seu pai possuía, os garotos escolheram eles, ja que tecnicamente pertenciam a uma linhagem real, e eram filhos do cavalo alado do rei, Argentum. Gerard era um cavalo cinza de crina negra e olhos também negros, Lyn era fêmea, também cinza, porém com a crista branca e olhos roxos. Lucian recebera varias criticas da parte do pai por ter escolhido uma fêmea, ja que Argentum possuía três filhos. Porém o cavalo mais novo, que era branco com a crista dourada, pertencera a Arthur antes dele ir embora, e Lucian sentiu a resistência por parte dele em obedecer suas ordens, além do mais, ele não queria ficar com nada que ja tivesse sido do irmão que ele tanto desprezava. No final o rei aceitou sua decisão, apesar de não ter ficado muito feliz.
Lucian deu de ombros.
–Papai está mais ansioso do que nunca esses dias.-disse levantando-se e indo em direção a janela.
–Claro que está, a humana está quase em nosso alcance, tudo o que ele mais esperou desde que se tornou rei...
–Está quase se concretizando.–Disse uma voz vinda da entrada da sala.
Os gêmeos viraram na mesma hora e encararam o semblante imperial do pai.
–Vossa majestade-fizeram uma longa referencia a ele.
–Vejo que ainda aprecia música Lucian-disse ele com uma cara de nojo.
Lindolf repetiu a careta do pai.
Lucian apenas o encarou, frio e impassível.
–Infelizmente, e para sua sorte, Sarah também gostava. O que significa que Sophie também deve apreciar.-Aurum se aproximou do piano e ergueu uma sobrancelha.
–Como vão com...seu desprezível irmão?
–Estamos quase lá vossa majestade -Adiantou-se Lindolf –infelizmente descobrimos que o ser desprezível tem suas técnicas. Estamos em seu rastro desde que chegou no labirinto, a humana está com ele.
–Não subestime Arthur, logo vocês aprenderão que ele não é fraco. Afinal, tem o mesmo sangue que nós, apesar de ser um traidor.- o rei sorriu.– Pena que ninguém o conhece o suficiente para reconhece-lo quando for condenado a morte por traição... Traição do sangue real. Ingrato!
Ambos os gêmeos sentiram  o ódio nas palavras do pai e ambos se deliciaram com elas.
–Vamos pega-lo para a vossa majestade.-disse Lucian sorrindo.
–Vão...e dessa vez nada pode dar errado.- ele se aproximou de Lindolf ficando a meio centímetro de seu rosto, seus olhos emanavam loucura.– Se não...-sua voz era um sussurro carregado de fúria, ele passou para Lucian – isso não terá um final feliz.
...
A mão de Arthur estava gelada. Sophie encarava o rosto do garoto entre suspiros. Seus cabelos dourados estavam jogados pelo rosto, a sobrancelha inclinada em uma expressão de tristeza, a boca estava pálida e as maçãs do rosto elevadas comprovavam o estado dele. Sophie afastou uma mecha de cabelo de seu rosto e desenhou o contorno até o queixo do rapaz, que terminava em uma covinha. Ela sorriu triste.
Ele era familiar para ela com certeza, todo o tempo a protegendo, desde quando era pequena. Ele havia salvado a vida dela mais vezes do que ela sabia.
Agora era hora de salva-lo. Ela não tinha certeza do que estava sentindo, mas sabia que não podia perde-lo, não queria viver para ver ele se machucar novamente.
–Me perdoe Arthur...-sussurrou ela –Mas eu preciso...preciso deixa-lo.
Foi como se ele estivesse consciente, e talvez tivesse, Sophie não sabia ao certo, como um movimento leve ele abriu os olhos e encarou Sophie com medo.
–Não.-disse com a voz fraca.
Ela não pode evitar as lágrimas que vieram. Ela devia fazer isso. Por Arthur. Por seu pai. Por tudo o que amava.
–Eu preciso...
Ele apertou a mão dela e respirou fundo.
–Aquele maldito me envenenou, mas eu...-ele tossiu e Sophie estremeceu–eu estarei de pé em breve...Sophie não faça isso...por seu pai...
–É por ele que tenho que fazer isso...
–...Por mim.
Ela balançou a cabeça negando. Não podia deixa-lo, mas tinha que faze-lo.
Ela soltou a mão de Arthur da sua e recostou-se na cadeira onde estava desviando o olhar para a janela, olhar para ele só tornaria as coisas mais difíceis.
–Não faça isso comigo Arthur.
–O que? Faça o que?
Ela olhou para ele por um segundo e viu algo em seu olhar que fez seu coração correr dentro do peito, mas logo desviou.
–Não torne tudo mais dificil-disse.
–Sophie.
Ela permaneceu encarando a janela, que dava para o jardim do lado de fora. Ja era noite, e ela se perguntou onde estaria seu pai naquele momento.
–Olhe para mim, Sophie Catherine Salvatore.- sua voz soou firme fazendo-a olhar para ele imediatamente.
Arthur sentou-se na cama e ela se levantou alarmada para ajuda-lo.
–Ei! O que está fazendo? Você está machucado e...
Ele segurou seu rosto com firmeza e a fez olhar no fundo dos seus olhos.
Ela encarou seus olhos verde azulados, que apesar do estado de saúde dele, possuíam um brilho feroz.
–Não faça nada -eles estavam a pouco mais que três centímetros um do outro. –Me deixe protege-la. Você é ...tudo...o que...eu tenho.-ele sussurrou.
Ela soltou o ar que não sabia que estava prendendo e fechou os olhos.
–Arthur...
Ele afrouxou o aperto sobre seu rosto e beijou a testa de Sophie, que estremeceu com o toque.
–Sophie.-ele disse com o mesmo tom de voz que a mesma.
Então fez uma careta de dor soltando-a e caindo na cama novamente.
–Arthur!
Ele gemeu e tossiu.
–Ahg, eu vou acabar com aquele...-foi interrompido por mais uma tosse.
Sophie correu para uma cômoda que tinha no canto do quarto e pegou um copo com um liquido cor de rosa que Dinny havia preparado.
–Beba isso.- disse entregando a Arthur.
Ele bebeu e suspirou no último gole.
Então virou a cabeça no travesseiro e olhou para Sophie, segurando sua mão.
–Fique comigo esta noite, sinto que não vou dormir e gostaria de companhia.-ele pediu.
Ela sorriu para ele.
–Claro.
Ela sentou-se na cadeira mas Arthur protestou.
–Não...- ele se encaminhou para um dos lados da cama e deixou espaço para ela.
Ela olhou para ele. Isso seria inadequado em qualquer outra situação, mas naquele momento... Ela sentiu que simplesmente deveria aproveitar todo e qualquer momento com ele. Por isso deitou-se ao lado de Arthur.
Eles permaneceram se olhando por muito tempo, em silêncio, um contemplando o outro. Sem se tocar, ao mesmo tempo que sentiam a energia correr em volta deles os unindo.
–Não me deixe.-sussurrou Arthur, e pela primeira vez, Sophie viu a fragilidade no fundo dos seus olhos, o ponto fraco no muro que ele havia construído em volta de si.
Ela suspirou e abriu um sorriso fraco.
–Não vou.-sussurrou de volta, mas no fundo ela sabia, apesar de não querer...estava mentindo.

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