XXIV

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Os cavalos pousaram silenciosos no labirinto, um corredor antes da casa do feiticeiro.
–Tá na hora de conhecer nossa futura rainha.-disse Lucian com um sorriso malicioso.
Os gêmeos estavam vestidos ambos com um casaco preto que ia até os joelhos, uma calça de couro, azul para Lucian, roxo para Lindolf, e uma camisa preta de botões. O casaco estava repleto de armas, e ambos estavam calçando um par de botas com lâminas escondidas.
Lindolf fez uma careta e desceu de Gerard. Ele observou o corredor diante de si.
Lucian desceu e olhou ao redor confuso.
–Lindolf, qual é o problema? Está com medo dos pesadelos?-perguntou sorrindo.- Ou está com medo do feiticeirinho?
Lindolf virou de frente para o irmão e lhe deu um soco rápido e feroz.
–Cale a boca bastardo inútil.-Apesar do que tinha acabado de fazer, sua voz não demonstrava raiva, não do irmão.
Lucian tocou no queixo e mexeu o maxilar. Então sorriu.
– Belo golpe. Mas você esta me devendo por essa.
Lindolf bufou.
–Eu não gosto dessa idéia.
O outro gêmeo franziu o cenho. Apesar de serem irmãos gêmeos, as vezes eram tão diferentes, que um não conseguia entender o que o outro estava pensando.
–Se você preferir...podemos deixa-lo ir. -disse Lucian sério–Apenas pegar a garota.
Lindolf olhou para ele como se estivesse louco.
–Não é disso que estou falando.-disse com uma expressão de nojo–Apenas...não gosto da idéia de uma rainha.
Lucian suspirou e encarou o irmão tentando entender onde ele queria chegar com aquela conversa.
Lindolf olhou para Lucian, e ele estremeceu. Conhecia essa cara, era a mesma que ele fazia quando sentia raiva de algo por que achava que estava errado, quando estava sendo enganado.
–Se ela for rainha, nosso pai se fortalece, e então permanece como rei, por muito, muito tempo.-disse ele baixo com uma ponta de veneno na voz.
Lucian colocou as mãos que estavam cobertas por luvas grossas pretas dentro do casaco, em um dos bolsos, e sentiu uma pequena lâmina fria nele. Ele ergueu uma sobrancelha para o irmão questionando-o.
–Sim , Lindolf, eu sei disso. Ele será imortal até que outro venha e tome seu trono.
Lindolf sorriu com malícia. Então seu sorriso desapareceu e seus olhos escureceram em uma expressão sombria e triste.
–E nós?-Perguntou.
Lucian abriu a boca para responder o óbvio mas então fechou. Ele tinha razão. Eles faziam tudo pelo rei. Desde pequenos, ajudavam em execuções de vampiros, sereias, lobos e os poucos feiticeiros que encontravam. As vezes até caçavam os feiticeiros eles próprios. Haviam planejado boa parte da estratégia para pegar Sophie, além de ter que fazer de tudo para que ela chegasse ao rei, inteira, intacta. E no final o que eles seriam? Depois de entregarem Arthur, quando Sophie estivesse no trono, e seu pai morto, o que eles ganhariam?
Lucian balançou a cabeça. Era bobagem. Eles eram os príncipes, tinham poder, abaixo do rei do mundo dos sonhos, vinha eles. Eram temidos. E depois disso tudo estariam do lado de seu pai, triunfantes. Ele não podia pensar naquilo.
–Isso é besteira. Não nego que tenho ambição, mas ja somos poderosos, e importantes. Além do que, depois disso tudo, teremos mais. E não sei você, mas eu faço isso por prazer.
Lindolf fez uma careta.
–É claro que também faço isso por prazer...
–Então qual é o problema?!-interrompeu Lucian, ja querendo terminar aquela conversa que os estava atrasando.
–O problema,-disse Lindolf no mesmo tom de voz feroz que o irmão–É que normalmente, os príncipes...viram reis.
...
Sophie despertou com um barulho, sentiu-se momentaneamente assustada, porém isso logo passou ao ver onde estava.
Arthur dormia calmamente ao seu lado, seu braço estava ao redor dela fazendo com que, mesmo no frio congelante que fazia no labirinto a noite, ela se sentisse aquecida e protegida. Seus rostos estavam a pouco mais de um centímetro um do outro, e ela podia sentir sua respiração bater com a dela, e sorriu.
Mas estava na hora, ela deveria fazer aquilo, deveria deixa-lo. Não podia deixar que seu pai e ele se machucassem por sua causa. A única saída, era ela se entregar.
Era o que deveria fazer. E iria.
Passara boa parte da noite nos braços de Arthur, sem toca-lo mais do que o necessário, pois se o fizesse...ela não conseguiria ir embora.
Agora sentia que uma faca partia seu coração em pedacinhos, sentia-se desolada e solitária, iria deixar tudo o que tinha de bom, tudo o que amava para trás, mas faria isso para salva-los.
Ela retirou os braços de Arthur com calma e levantou-se da cama silenciosa.
Suspirou. Ele permanecia lindo de qualquer maneira, e exibia um sorriso leve no rosto.
Sophie mordeu o lábio para reprimir o choro. Estava pensando qual seria a reação do garoto ao acordar e não vê-la ao seu lado. Ele estava melhor, ela sabia disso, e provavelmente tinha esperança de tira-los dali, de salvar a todos, inclusive Dinny. Mas era exatamente por isso que ela precisava partir neste momento, antes que ele a convencesse a ficar.
Ela se aproximou da cama e se ajoelhou diante dele.
–Cuide do meu pai por mim-sussurrou.–E...obrigada por todos esses anos, entenda que você tem me salvado por quase toda minha vida. Agora eu tenho que retribuir.
Ela beijou a testa dele com leveza e afastou uma mecha de cabelo dourado de seu rosto.
–Adeus Arthur.
Então levantou-se e pegou um pedaço de papel que guardava em seu vestido, colocou-o em cima da cômoda ao lado da cama e saiu do quarto sem olhar para trás. Essa era sua escolha.
Os corredores que levavam a saída da casa do feiticeiro estavam escuros, e pareciam mais frios que nunca.
Sophie estremeceu ao chegar na sala. Observou a cortina de água que estava silenciosa naquele momento, as flores no vaso em cima da mesinha, os móveis ao redor da sala. Ela sabia o que iria fazer.
Pegou um casaco que havia encontrado em uma de suas gavetas, no quarto que estava hospedada-o feiticeiro a presenteara com varias peças de roupas-, e verificou se as armas estavam onde havia deixado.
Então suspirou, estavam lá. Ela retirou uma adaga dourada que havia achado em cima da cômoda do quarto de Arthur, havia uma inscrição nela, que só naquele momento Sophie notou. A luz que apaga a escuridão, selada no último batimento de um coração.
Ela franziu o cenho, mas deu de ombros e guardou em uma das botas que usava, havia pegado-as junto com o vestido roxo com inscrições que o feiticeiro a dera. Ela colocou o casaco e olhou uma última vez pela sala, e foi em direção a porta.
–Opa. Onde você pensa que vai sonhadora?-perguntou uma voz atrás de si, e ela congelou com a mão na maçaneta.
Então virou-se deparando com um garoto alto, vestido com um casaco preto e calça azul. Seus olhos eram negros como a noite, os cabelos da mesma cor, perfeitamente penteados. Sua expressão demonstrava divertimento, e ao mesmo tempo arrogância.
Ela reconheceu aquela feição arrogante, era como a que Arthur fazia na maioria das vezes, porém o garoto a sua frente transpirava uma frieza, crueldade e melancolia quase doentia.
Ela estremeceu.
–Quem é...-sua voz falhou ao ver outro garoto aparecendo por trás do primeiro. Ele era idêntico ao mesmo, com excessão do cabelo, que era ondulado e cor de areia, e a expressão severa e quase maníaca. Quase não. Era maníaca.
Ela reconheceu os dois mesmo sem nunca te-los visto pessoalmente.
–Vocês são Lindolf e Lucian,-sua voz soou tremula e fraca–os gêmeos.
O garoto de cabelos negros sorriu encantado.
–Vejo que nosso irmãozinho falou bastante a nosso respeito-ele a encarava sem parar, como se pudesse vê-la por dentro.
O outro irmão fez uma cara de nojo.
–Nada de conversas. Temos que leva-la para o castelo.
–Claro Lindolf.-disse o de cabelos negros, que pareceu desapontado por um segundo, mas logo sua expressão ficou séria.–Temos que leva-la, para o rei.
Sophie poderia ter gritado, assim talvez Arthur acordasse e a salvasse, ou Dinny. Ela estava com medo. Muito medo. Sabia o que aconteceria dali em diante. Mas não fez nada. Era isso que deveria acontecer.
O garoto de cabelos negros-Lucian, deduziu ela- se aproximou inexpressivo e tocou suas costas com uma mão, como se fosse leva-la para uma dança, e ela sentiu um choque de imediato. Ele sorriu para ela, um sorriso quase amistoso, o outro irmão se aproximou dela e jogou um pano sobre a mesma, e então tudo se apagou.

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