Laços Reforçados

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— HUD! — ELA GRITA para o garoto que começa a descer do prédio pelos parapeitos das janelas. — Sou eu: Lucy. Ei! — continua, com um sorriso que se alarga a cada instante.

— Quem é Hud, Lucy? — indaga Ben, confuso.

Quem?! Meu irmão, oras! — exclama ela, em pura expectativa e andando em direção à fachada do manicômio, acenando com a mão, para poder ser vista.

Irmão? Olho para o menino que ainda desce com uma agilidade impressionante os últimos parapeitos e uma coisa estranha acontece. A altura da última janela — à qual está pendurado — até o chão, é relativamente alta e se ele pular dali, provavelmente implicará numa lesão em alguma das pernas. Quando ele solta as mãos, pronto para aterrissar desajeitadamente no chão, cerro os dentes com força, como se assim, conseguisse amenizar a queda.

Não sei se é por conta de toda aquela doideira que passei no deserto, ou sei lá o que, mas juro que antes do último instante dos pés de quem parece ser Hud tocarem o chão, vi sombras segurarem o garoto pela sola de seu pé descalço, oferecendo como um sustento para ele não se esborrachar no chão. Na mesma rapidez que apareceram, se dissiparam.

Olho para Lucy, para ver se ela também notou algo estranho naquilo tudo e ao que tudo indica, me parece que não. Balanço a cabeça rapidamente de um lado para o outro, tentando apagar aquilo da mente. Só posso estar enlouquecendo.

O menino, agora no chão, olha de um lado para o outro, como se procurando algo. Ao contrário de Lucy, seus cabelos ondulados são de um loiro claro. Ele tira algo de algum lugar do avental de paciente que usa e com isso amarra seus fios em um rabo de cavalo. As mechas são incrivelmente longas e as pontas batem na altura de suas costelas. Seus traços são tão finos e leves que não consigo não me perguntar: quantas vezes será que ele foi confundido como uma garota?

— Ei, Hud! Sou eu! — exclama Lucy.

O garoto olha para ela e vejo em seus olhos uma ponta de reconhecimento. Mas de repente ele fecha a cara e uma expressão de estranheza cobre seu rosto. Ágil, começa a correr em direção à saída oeste da cidade, por onde fugiu o helicóptero que levou Jorge.

Lucy parece não pensar duas vezes e corre atrás do irmão. Ben e eu vamos em seguida.

— Hud! Você não está me reconhecendo? — ela pergunta, ainda com um sorriso no rosto — Sou eu, sua irmãzinha.

O garoto não para para ouvir; entra na rota e some por entre as árvores. Reviro os olhos. Essa coisa de sair correndo e fugir deve ser de família.

Entramos pela mesma fenda entre duas árvores, pela qual ele passou. Com a movimentação da vegetação, conseguimos distinguir a direção que ele toma e é isso o que nos guia. Lucy, por sua vez, não se cansa de chamar pelo nome do irmão e a cada tempo que passa, seus chamados se tornam cada vez mais lamentosos e sua voz falha, dando lugar à uma embargada e chorosa.

Ouvir esses chamados lamuriantes dela faz com que um nó se forme em minha garganta. Olho para Ben e ele também parece compartilhar o mesmo incômodo.

Continuamos na perseguição por um tempo até que a área de árvores acaba e dá espaço para o começo das colinas roxas de lavanda. O cheiro aconchegante que esses milhões de flores exalam é muito gostoso e de certo modo me lembra... de casa. Sinto um aperto no peito capaz de me fazer em pedacinhos, mas respiro fundo e tento me acalmar.

— Hud? — Lucy diz baixo. — Hud?! — diz mais alto e assim vai repetindo o nome do irmão, cada vez mais alto até começar a berrar e chorar.

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