XXI

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— Levante-se e sente-se aqui. — Disse Luisa cochichando.

Me levantei e com o corpo ainda abalado me sentei.

Ela então se prontificou me empurrando por um longo caminho dentro daquele local.

Descemos rampas e mais rampas, até ela me colocar no carro.
Ela me lançou um sorriso.

— Me considere uma ótima amiga. Não são todas que fazem sexo com enfermeiros. — Riu.

A olhei sem entender e ela deu de ombros. Ligou o carro.

— Trouxe uma roupa para você. O Pedro ligou mais cedo. Disse que iria te buscar às 20:00, eu disse que você não poderia ir às 20:00 por conta de contratempo. Perguntei o local e eu disse que você estaria lá às 21:00. O local é o Bistrô Vegas. Droga, já são 21:04. — Disse olhando no relógio em seu pulso.

Prosseguimos um longo caminho até chegarmos ao local. Eu já havia me trocado rapidamente no carro. Estava abalada.

Ela me deixou lá fora e me entregou algo.

— Isso é um celular. Eu irei te ligar, você deve atender, apertando esse botão, o.k.?

Assenti.

Entrei no local e vi Pedro sentado a uma mesa próxima. Sorri.

Ele então se levantou e afastou a cadeira para que eu me sentasse.

— Obrigada pela gentileza, senhor. — Sorri.

— Adoro seu jeito de moça antiga. — Falou olhando em meus olhos. — Achei que não viria, confesso que fiquei preocupado.

— Tivemos um problema. — Corei.

— Pedi vinho. — Disse erguendo sua taça. — Você gosta?

— Já degustei. — Meu olhar estava direcionado em seu belo par de olhos azuis.

Ele então encheu minha taça e lançou um sorriso.

Conversamos sobre diversos assuntos, os quais eu não tinha conhecimento. Porém não queria ser indiscreta. A todo momento eu tomava vinho e estava um pouco zonza e feliz.

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Acordei e Luisa estava me observando.

— Que mancada! Achei que pessoas de outro século não bodavam. — Seu olhar demonstrava surpresa e preocupação. — Você vomitou e falou várias coisas a noite inteira.

Não entendi o que seria bodar, porém meu estado de confusão e minha dor de cabeça estavam tão altos que nem fiz questão de perguntar.

—Você deve estar com ressaca! - Disse ela depois de me observar por algum tempo.

— O que seria ressaca?

— Quando você bebe muitas bebidas alcoólicas e fica bêbada, no dia seguinte certamente estará com dor de cabeça imensa. Isso é ressaca.

— Minha cabeça realmente dói muito.

— Vou na farmácia comprar algo que ajude. Já volto. Não saia de casa.

Ela então saiu.

Eu ainda usava o vestido vermelho que usei na noite anterior. Deixava meu busto amostra e era bem impróprio para meu verdadeiro século. Porém, como eu não estava no século XIX não reclamei. Reclamar não ia me fazer voltar.

Minha cabeça doía tanto que eu não tinha a mínima vontade de levantar. Eu cheirava a vômito. Céus! Que vontade de vomitar.

Corri em direção ao banheiro ignorando a dor de cabeça e me agachei ao... Ao trono. Não. Vaso... Sanitário. Vomitando tudo que podia haver. Já não saía nada além de um líquido amargo.

Me sentei ali mesmo e comecei a chorar.

Ouvi o que Luisa me disse ser a campainha. Como iria atender cheirando a vômito.

Ignorei e corri para atender. Destranquei a fechadura e abri. Lá estava ele: Pedro. Seu semblante demonstrava preocupação.

— Me explique. Tudo que você disse em nosso jantar é verdade?

Eu estava confusa, até onde me lembro não havia dito nada de mais.

— Você viajou no tempo, Flora? É isso? — Estava sério.

Eu não entendi tamanha seriedade em seu olhar. Ele então voltou a me olhar.

Eu não respondi, apenas baixei os olhos.

— Me responda, Flora! — Disse em um tom sério.

Continuei olhando para o chão.

— Flora! Olhe para mim! Você. Viajou. No. Tempo? — Falou pausadamente. Seu tom era de nervosismo.

— Eu... Eu não sei dizer. — Falei levantando o olhar e olhando diretamente em seus olhos. Não queria confessar.

Ele então entrou e se sentou no sofá. Eu permaneci em frente a porta.

— Me desculpe. — Seu tom diminuiu. — Quando te vi na sala de exames, senti que te conhecia. Senti que você pertencia a mim. Já ouviu falar em "amor a primeira vista"? Nunca acreditei nisso, mas quando te vi... Não sei explicar, mexeu comigo.

Direcionei meu olhar à ele.

— Achei estranho quando me chamou de senhor Soteli quando foi ao consultório. Mas não te achei louca ou coisa do tipo. — Deu um sorriso bobo. — Nunca pensei que sentiria assim por alguém que mal conheço. — Colocou as mãos na cabeça. — Eu não parava de pensar em você, até que te vi sentada chorando porque estava perdida. Eu senti como se a chave para o amor fosse você. Pareço louco, eu sei. — Ficou em silêncio durante um breve tempo. — Ontem você bebeu demais, me senti horrendo por abusar da sua inocência. Eu não devia ter deixado você beber, me perdoe. Você tem esse jeito inocente que me cativa. Nós não fizemos nada demais, eu juro. Você me disse coisas que parecem totalmente verídicas sobre o século XIX. E eu liguei alguns fatos. Me senti estranho quando você me falou. Eu não... Não sei explicar. Só sei que o que senti nem a medicina pode explicar. — Suas palavras pareciam sinceras.

Continuei calada, pensando no que poderia dizer. Então começaram a escorrer lágrimas de meus olhos. Então me sentei ao seu lado. Ele me abraçou brevemente e deu um beijo em minha testa.

— Descobri que há um casarão bem antigo pertencente a uma família que possui o sobrenome Soteli. — Falou por fim. — Fica um pouco longe daqui, mas é aqui na cidade. Podemos ir até lá tentar descobrir alguma coisa.

Um sorriso se formou em minha face demonstrando gratidão.

— Sou muito grata por confiar em mim, obrigada. Mas quero esperar Luisa chegar, ela me ajuda tanto. — Falei.

— Tudo bem. Você se importaria se eu esperasse aqui dentro com você? — Sorriu.

— Seria um prazer. — Sorri e olhei no fundo daqueles olhos azuis.

No fundo daqueles olhos, eu sentia. Era o Augusto.

Um silêncio amedrontador se formou entre nós.

Limpei a garganta.

Nada além do depoisOnde histórias criam vida. Descubra agora