Capítulo 4

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Acordo no dia seguinte, como previsto por mim no dia anterior. Levanto e arrumo a cama como sempre, vou ao banheiro faço minha higiene e logo depois escovo os dentes, depois tomo um banho rápido.

Quando termino visto meu uniforme rotineiro, e dou um jogada nos cabelos, e faço um make rápido. Para que eu seja mais realista, hoje não é um dos meus melhores dia.

Abro a porta do meu quarto, e caminho calmamente até a cozinha, quando chego já vejo a Sophia tomando seu café da manhã. Ela me fita, como se quisesse dizer alguma coisa.

-Pode dizer, eu te escuto. -Digo sem olhar para ela. Encho meu copo com capuccino de refil.
-Tá, então Sara, me desculpa, eu não deveria ter lhe dito tudo aquilo, eu não suporto este clima chato entre nós duas, somos amigas. -Ela se desculpa e devido ao meu humor baixo sou direta.
-Tudo bem. -Me sento na mesa e deixo meu capuccino de lado. Começo a fitar o nada.

Será que um dia alguém irá me amar ? Acho que não, sou esquisita, ciumenta, possessiva, órfã, e tenho um ódio súbito por coisas que me fazem feliz, eu nunca fui feliz, e se eu for vou desconfiar dessa felicidade. Eu só queria fugir um pouco, criar um lugar só meu, um momento só meu, uma playlist só minha, e aí sim me fechar eu meu mundo. Não é que eu ligue para amor, mas as vezes eu me sinto sozinha.

-Sara ? Esta tudo bem ? -A Sophia me tira do meu transe pessoal com sua voz tranquila e suave.
-Aham, esta.-Forço um sorriso, e me levanto.-É melhor irmos, vai que chegamos atrasadas.

Pego minha mochila e a Sophia me acompanha sem questionar.

Incrível como um sorriso pode disfarçar milhares de coisas, eu posso até sorrir, mas este sorriso nunca significará o que eu sinto em meu coração, é simples, são somente duplo sentido.

-Vai ter competição de surf. -A Sophia me tira do meu transe enquanto caminhamos pelas ruas calmas de Fortaleza.
-Hum, legal. -Digo com desdém, sei que não sou profissional e nunca ganharia uma competição.
-"Hum, legal" só isso? -Ela me olha com seus olhos verdes arregalados - Você manda mó bem em cima daquela coisa que vocês chamam de prancha, e você diz "Hum, legal" ?? -Ela fala como se fosse a primeira guerra mundial.
-Sophia, não tenho interesse, não sou profissional. -Olho para frente e avisto o colégio, e dou graça aos céus.
-E precisa ser profissional? Não mesmo. Se inscreve vai, toma umas aulas se quiser, por mim, pelo menos tenta poxa...-Ela faz uma carinha que eu acabo cedendo.
-Tá, eu vou pensar. -Digo e reviro os olhos.
-Oba, obrigado. -Ela dar pulinhos. E vai encontrar suas amigas purpurina, e lá vou eu sozinha por este meio de pirralhos hipócritas.

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As aulas ocorrem naturalmente, dessa vez eu resolvi ficar na minha e só estudar, eu não iria filar, vai que eu encontro aquele garoto esquisito de novo ? Deixa-me no meu canto.

O sinal estridente soa, hora de sair deste inferno. Saio dali para que a Sophia não me veja, eu quero ir no parquinho, passar um tempo só, sei lá, só para pensar...

Passo por vários alunos, até conseguir chegar ao muro do colégio e pular, pulo sem dificuldade, e quando chego ao chão, vou direto a árvore de sempre. Plugo meus fones de ouvido e ali eu me perco em meus pensamentos.

Eu poderia traçar traços da felicidade em minha vida, bom, eu poderia né? Mas, me acostumei com tudo, com a infelicidade, com a solidão, e com outras coisas que concerteza não são boas, eu me encontro num poço sem fim, não dá mais para voltar; este poço tem nome, auto mutilação. Adolescentes hoje em dia encontra em pequenas lâminas uma forma de aliviar sua dor, dor essas de perdas ou rejeitamentos.

Amor. Não sei bem o que é amor, ou o que amar, ou o que é ser amada. Vejo o amor como uma metáfora, nunca cresci ao redor de amores. Não creio em conto de fadas, sou uma adolescente que nunca teve uma crença em contos de fadas; não sou satisfeita com meu corpo, com minha aparência, com meu jeito. Comer é difícil pra mim, sorrir de coração, é impossível.

Sinto que estou sendo observada, e quando ergo minha cabeça o mesmo garoto estranho de antes está me fitando.

-Maldito, me tirou do meu transe. -Penso.

-Gótica suave...-Ele sorri fraco e vem em minha direção.
-Af.-Reviro os olhos.
-Animada você hein ? -Ele se senta ao meu lado.
-Garoto, eu não te dou intimidades suficientes para você se sentar ao meu lado. -Digo e me afasto um pouco dele.
-Calma, não mordo não. -Ele ergue as mãos em sinal de rendição.
-Não insinuei isso. -Indago.
-Que seja. -Ele sorri despojado e me fita. -Como é seu nome ?
-Gótica suave, num já disse ?! -Replico impaciente.
-Nome verdadeiro. -Ele faz cara de sério.
-Sara.-Digo seca.
-Ah, prazer Rafael.-Ele estende a mão para me cumprimentar e eu ignoro.-Nossa.

Ficamos em silêncio, ele lendo o livro patético dele e eu ouvindo minhas músicas calmamente.

-Vamos ficar nessa tensão toda ?-Ele me olha e me pergunta.
-Não sou de papo, não percebeu ?-O olho indiferente.
-Grossa. -Ele revira os olhos e se levanta.
-Já vai tarde -Sussurro baixo.
-O que disse ? -Ele se vira e me olha com um olhar malicioso.
-Nada ue.-Dou de ombros.
-Hum.
-Gay! -Sussurro baixo novamente, e creio que ele não escutou.
-Ah, Gay né ? -Ele dar meia volta e eu me levanto, mas tentativa falha, ele me imprenssa na árvore e passa seus lábios pelo meu pescoço, sinto sua respiração desajustada e isso me causa um certo arrepio, tento sair dessa cena constrangedora e ameaçadora, mas sou impedida pelo mesmo que me encaixa dentre suas pernas e me beija, um beijo malicioso, com mordidas, correspondo o beijo, mas, por que eu quero, não sei o que estou sentindo, mas eu desejo este beijo. Quando ele sente que o beijo já está cheio de desejo é promissor ele se afasta.
-Por que fez isso ? -Pergunto incrédula.
-Você me chamou de gay, só fiz lhe provar o quão sou gay. -Ele me olha.
-Af, primeiro você me tira do meu mundo mágico, e depois me beija, ah, qual é ? -Reclamo.
-Você criou um mundo mágico, por que sua vida real é trágica. -Ele me solta uma piscadela e sai, fico com a maior cara de ué.

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Chego no meu trabalho eufórica, Mirna uma garota que converso de vez enquando nota minha euforia e me encara.
-Aprontando ? -Ela indaga e eu a olho incrédula.
-Não, longe dos meus alcances. -Replico e me sento na minha mesa de serviço.
-Sei. -Ela me olha com uma cara de "Estou ligada em tudo Sara Maia". -Aqui Oh, o Gustavo deixou isso para você. -Gustavo é o meu patrão, ele é loiro, de bom físico, um deus grego na mente de muitas meninas, mas nunca me interessei por ele, desde quando entrei aqui, tenho uns 10 meses de serviço e nunca me peguei babando pelo Gustavo. Peguei os papéis na mão de Mirna, e os entreolhei, fiz o sempre, liguei pros clientes, passei ligação e em 4 horas eu seria liberada.

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Cheguei em casa cansada, vou pro meu quarto e tiro a roupa do colégio, sim, eu fui trabalhar com o uniforme do colégio, é rotina isso, o Gustavo nem reclama.

Entrei no chuveiro, e em segundos me peguei pensando naquele tal de Rafael, o beijo dele, o toque, o olhar triste cinzentos, o jeito dele, isso me deixou louca. Não sei por que, não vou me permitir, não quero me permitir.

Sou interrompida pela Sophia que grita loucamente do outro lado da porta.

-Calma, calma Sophia. -Saio do box e me enrolo na toalha, abro a porta e coloco somente minha cabeça do lado de fora da porta.-O que é ?
-É do, é do orfanato. -Ela estava tentando pegar ar, pois sua respiração estava desregulada, ele estendia o telefone fixo. -Seus pais Sara.

Meu coração foi a mil, gelei por um momento, e senti que um buraco se abria em meu coração.

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