Capítulo I

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Mederi Cartter

Abro os olhos, ficando um segundo à mais na cama para ter certeza de que aquele som não foi fruto dos meus sonhos.

Duas batidas simplórias surgem na grande porta do quarto.

- Mederi - a voz de Davina atravessa a parede.

Levanto em um pulo e me coloco ao lado da tranca, assegurando-me que ela não entre no quarto.

- Acordei. - sussurro do outro lado da porta. Olho para o relógio digital que pende na parede. 5:42h. - É tão cedo.

- Vista-se. - ela diz, imperativa. Sinto vontade de abrir a porta e apontar o dedo em seu rosto para perguntar quem lhe deu autoridade de se sobrepor à mim, mas lembro minha situação e me contenho. - Precisamos nos reunir em oito minutos. Oito.

Escuto o som do sapato dela batendo no chão do corredor enquanto ela se afasta da porta. Ando até o banheiro e olho a parede crua. Aperto o pequeno botão lateral e a mágica acontece.

A parede se abre em uma folha dupla, virando a face espelhada para mim. Me abaixo e pego as maletas, paletas e caixas para o ritual.

Olho ao redor e vejo resquícios do descontrole de ontem. Pego as embalagens desfiguradas e jogo em um incinerador.

Me desenrolo do roupão simples de cetim azulado e entro no chuveiro. A água escorre em meu rosto e limpo o suor causado pelo pesadelo da noite passada.

Sempre o mesmo pesadelo.

Em um milésimo de segundo, sinto a água quente adentrar meu nariz e lembro do afogamento. Me desespero em meio à torrencial queda que vem do chuveiro e acabo caindo de joelhos para fora do box. Respiro fundo para acalmar meus batimentos e me levanto.

Volto para a pia e pego uma grande caixa embaixo do balcão. De dentro dela saco um pote cheio de cápsulas gelatinosas e avermelhadas.

Não.

Pego outro pote e vejo as pequenas bolas leitosas tão costumeiras. Preciso lembrar de rotular esses frascos.

Engulo a seco quatro glóbulos e guardo a caixa em seu lugar costumeiro. Prendo o cabelo atrás da cabeça e começo a pintura magistral em meu rosto.

Depois de terminada, solto meus cabelos de maneira que fiquem naturalmente volumosos, para esconder a raiz que cresceu.

Pego a pequena caixinha dupla e me olho no espelho. Ah, esses olhos. Meu pai amava esses olhos.

Com cuidado e maestria coloco a lente colorida que esconde a verdadeira Mederi.

Mederi?

Eu já nem me lembro mais quem eu fui.

Saio do banheiro já transformada e coloco um dos muitos uniformes que se encontram em um fundo roupeiro no quarto.

Escolho um vestido preto e reto com sapatos de salto baixo e um blazer com a insígnia da OCRV.

Depois de pronta, olho no relógio e vejo uma folga de dois minutos. Exatamente o suficiente para chegar na sala de reuniões.

Saio do quarto e ando em meios aos corredores movimentados da Sede. Muitas pessoas ainda cuidam do que sobrou da festa de ontem. A festa que demos para mostrar para todos os agentes que domesticamos nossos bichinhos.

Eles estavam tão bonitinhos e comportadinhos que até cogito a ideia de lhes dar um dia de folga no lugar do petisco.

Chego na sala e vejo alguns importantes membros da Organização espalhada pelo mundo. E ele também está ali. Julius.

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