Nick
Tudo começou com um prato. Chloe estava de pé na cozinha, segurando-o nas mãos quando voltei da rua. Saíra apenas para comprar grãos de cominho e pão e, quando menos espero, o maldito prato foi lançado pelo ar, errando por pouco minha orelha antes de espatifar-se em mil pedaços contra a parede atrás de mim.
– Que merda é essa, Chloe? – gritei, parado na entrada e tremendo de raiva. Foi aterrador. Quer dizer, um pouco de jogo duro e paixão inflamada era bastante divertido, mas aquilo era ridículo. Havia laranjas bem ali ao lado; ela bem que poderia ter pegado uma delas...
– Para mim, chega, Nick, já deu – gritou, segurando meu celular na mão e passando como um raio por mim em direção à escada. A tela brilhava no escuro, iluminando o rosto dela e transformando a doce e etérea Chloe no monstro de Frankenstein.
Eu não fazia a menor ideia de sobre o quê ela estava falando. Fiquei no corredor da entrada por uns instantes, gotas de chuva se infiltrando em meu cabelo e escorrendo pela minha testa. Apenas alguns minutos antes eu estava pagando no balcão da loja da esquina, falando do tempo e das últimas partidas de futebol. Não é que estivesse escapado para um bordel, ou me metido com alguma amante. Aquilo já estava me levando à loucura. E aquele prato era caro. Deixei os sacos no chão e subi a escada atrás dela.
Ela estava sentada na beira da cama, chorando. Chorando de raiva.
– Chloe, vamos lá – falei calmamente, sentando-me ao seu lado, mas ela me afastou. Com força. Senti o peito saltar quando ela me empurrou para trás.
– Não, fique longe de mim, seu merda! – berrou, agora tão alto que percebi que os vizinhos iam ouvir tudo. A maquiagem dela escorria pelo rosto. Estava com uma cara péssima.
– O que é que eu fiz? Há dez minutos você estava bem, Chloe, e agora parece até que assassinei seu gato. Como assim? Não aguento mais isso! – gritei em resposta, sabendo que perdera a paciência. Se é que ainda me restava alguma.
– Quer saber o que você fez? Não se faça de bobo! Leia isto – disse ela, esfregando a tela brilhante do meu celular em meu nariz, o que cancelou a mensagem imediatamente. E então passou por mim furiosa, deixando um rastro de raiva atrás dela.
Peguei o celular e chequei as mensagens recentes. Ah, que merda, era de Amélia:
Oi, Nick. Estou com muita saudade de você. Precisamos fazer algo em relação a esta situação. Liga para mim, por favor. Bjs, Amélia.
Depois de tanto tempo…
– E então, o que você tem a dizer em sua defesa? – falou, com a voz esganiçada, regressando ao quarto e batendo os saltos com força no chão de madeira. Eu estava chocado.
– Bem, simplesmente não me vou defender. Sim, é minha ex-namorada, de muitos anos atrás, e qual é o problema se ela ainda sente algo por mim? Não é culpa minha. – Tentei explicar calmamente, sabendo que era uma situação complicada, mas sem a menor vontade de assumir a responsabilidade.
– Nem vem, Nick. Não acredito em você. Por que ela ainda tem seu número? E o que ela quer dizer com esta situação, hein? – Ela olhou fixamente nos meus olhos, respirando com tanta intensidade que os ombros dela subiam e desciam.
Aquilo era horrível.
– Pois é, ela me enviou um SMS. Eu não mando mensagens para ela desde que nós terminamos, ainda assim a culpa é minha? – perguntei, seguindo-a enquanto descia a escada balançando meu celular no ar. Era uma cena ridícula. Completamente louca. – E, Chloe, será que dá para você tirar a droga do sapato, por favor? Assim você vai esburacar o chão.
– Não vou tirar nada, Nick, porque já estou de saída – disse ela, fumegando de raiva e atravessando o corredor com uma mala enorme nas mãos.
– Ah, Chloe, isso é ridículo. O que você quer que eu diga? – Segui-a com os braços estendidos. Já estava começando a sentir-me bastante irritado. Nunca tinham desconfiado de mim dessa maneira. E também eu nunca lhe dera motivos para desconfiar de mim. Eu até compreendia que ela se preocupasse com Sienna, mas já fazia tempo que tínhamos superado isso.
Ela começou a atirar suas coisas na mala. As velas, as almofadas, aqueles trecos esquisitos, como uns seixos, que ela dispunha em potinhos. Aquilo ela podia levar. Olhei para ela e não vi a Chloe por quem me apaixonara, somente uma jovem zangada e insegura. Tive pena dela. Sempre houvera vestígios disso em sua personalidade, mas ela conseguira compensar com o amor selvagem que me dedicava. Eu a amava. Dizia isso a ela o tempo todo, sussurrava isso em seu ouvido à noite, escrevia em Post-its e os deixava em seu almoço. Eu a amava. Ou pelo menos pensava que sim.
– Então você vai embora, assim sem mais nem menos?
– Sim, sem mais nem menos – rebateu, quase chicoteando meu rosto.
Afundei no sofá enquanto ela esvaziava sistematicamente o espaço à minha volta. Se ela tentasse levar meu CD do Radiohead, juro que...
Meu lar. Minha garota. Os dois se separavam, e eu me sentia impotente.
– Chloe, você sabe que eu a amo. Não sei o que mais posso dizer. É alguma outra coisa? – perguntei, tentando suavizar sua fúria. Percebi que me zangar não ajudaria em nada; tinha de engolir o orgulho e tentar usar as palavras para convencê-la. Persuadi-la a se afastar daquele estúpido penhasco de onde estava prestes a pular.
– Bem, seus olhos sempre estiveram em outro lugar, Nick, por isso é melhor eu ir embora. – O que você quer dizer com isso? – perguntei, genuinamente confuso.
– Quando vamos a restaurantes você fica olhando para as garçonetes, quando vamos ao parque você fica olhando outras garotas, e além disso tem todos aqueles presentes escondidos e telefonemas secretos para Sienna e agora essas mensagens íntimas... Você é um traidor idiota e horrível.
Aquelas palavras doeram como um soco. Traidor idiota e horrível. Nunca mulher alguma me dissera nada parecido. Lembrei de todas as refeições que tínhamos feito juntos e os dias no parque tomando sol. Eu olhara para outras garotas? Tenho certeza de que não... E não dava para acreditar que ela estava outra vez falando de Sienna, já tínhamos discutido esse assunto um milhão de vezes. Eu estava completamente confuso, desorientado e agora bastante zangado.
Depois de ter guardado as coisas dela que estavam na sala, ela foi para o andar de cima. Até os DVDs que havíamos comprado juntos ela levou, mas achei que não valia a pena falar nada. Fiquei sentado durante uma hora ouvindo os passos dela lá em cima. Não sabia o que fazer. O que afinal eu poderia fazer? Queria que ela ficasse? Queria? Queria mesmo ser acusado de coisas que não fizera? Queria mais daquelas discussões loucas seguidas de sexo selvagem, como dois animais desorientados?
Eu precisava de Sienna. Ela saberia o que fazer. Ela sempre sabe o que fazer. Fiquei sentado por mais algum tempo e afundei a cabeça nos joelhos, torcendo para cair no sono e aquilo não passar de um sonho. Amélia, muito obrigado...
Um tempo depois, Chloe já empilhara algumas malas junto à porta da frente, umas quatro ao todo. De lá saíam saltos de sapato, cabides, garrafas, uma escova de dentes. Todos aqueles objetos que tanto tinham me assustado quando começaram a aparecer por todo o lado...
Então ela fez a última descida pela escada. Fui em sua direção, para poder conversar. Ainda parecia furiosa. Tentei puxá-la para mim, mas de novo ela me afastou, agitando os braços para se soltar de mim. Perdi a paciência.
– Chloe, estou muito chateado com isso. Nunca traí você. Por isso mesmo acho até que é melhor assim – falei, as palavras jorrando de minha boca.
Ela encostou outra vez o nariz no meu, franziu a cara e me disse suas últimas palavras: – Não me ligue. Nunca mais.
Bem, isso ia ser interessante, considerando que trabalhávamos no mesmo lugar.
E assim foi. Pegou as malas, bateu a porta com força e ouvi as pedrinhas do estacionamento sendo esmagadas pelo pneu do carro dela quando deixou rapidamente minha casa e ganhou a rua.
Olhei para os grãos de cominho e para o pão tristemente enfiados dentro do saco azul na cozinha e pensei o que, afinal, eu devia fazer. Sentei nos primeiros degraus da escada e peguei o telefone com o dedo suspenso sobre o número 2. Tocou duas vezes e ouvi a voz dela.
– Sienna, posso passar aí?
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Esta é uma história de amor (Jessica Thompson)
RomanceUm rapaz conhece uma menina e a menina se apaixona pelo rapaz - até aí, nenhuma novidade. Mas, com Sienna e Nick, as coisas não acontecem do jeito que costumam acontecer nas histórias de amor. Tudo bem que ela o achou superparecido com o Jake Gyllen...