"Não me ligue. Nunca mais." PARTE II

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Nick

Nick. Trinta e dois anos. Solteiro. Nick. Trinta e dois anos. Solteiro.
Oh, lá vamos nós de novo, pensei, enquanto me sentava à mesa, aplicando o Photoshop num par de seios para um artigo sobre operação plástica. Que infeliz eu sou. Sou mesmo um infeliz. A ansiedade me corroía. Onde está sua mulher, Nick? Ah, não, você não é casado. Filhos? Claro que não. E aquele estúdio de arte que você tanto ambicionava? Só se for em sonho.
A porta da minha sala estava fechada e a persiana, abaixada. Estava trabalhando como uma criatura enfurecida e desfigurada que passara tanto tempo nas trevas que se transformaria em cinzas se colocasse um pé para fora.
Não queria ver Chloe andando para lá e para cá no escritório e olhando para mim como se eu tivesse acabado de sair da bunda de um pombo. Era por isso que fizera a mim mesmo aquela promessa sobre relacionamento com colegas de trabalho. Não seria surpresa se meu próximo chá contivesse arsênico dentro... Ela faltara uns dias ao trabalho depois de termos terminado, e eu bem que torcia para que nunca mais voltasse, mas voltou.
Uma mensagem instantânea na minha tela me tirou bruscamente da minha espiral de autopiedade. Era de Tom.
- DEIXA DISSO, CABEÇÃO. NÃO FICA TRISTE :-( Suspirei e sorri. Era um bobo, mas gostava dele
- Vou ficar bem, Tom, relaxa. Vamos beber uma cerveja mais tarde. O que você acha?
- SIM, SIM E SIM. NA VERDADE, VAMOS BEBER SETE CERVEJAS E DORMIR EM ALGUMA CAÇAMBA POR AÍ. QUE TAL?
- Uma saída noturna perfeita.
- FALAMOS MAIS TARDE, CABEÇÃO.
Não pude deixar de sorrir ao pensar nas pessoas ao meu redor e no quanto eram fantásticas. Não fantásticas em termos de mudar o mundo, ou mesmo de mudar suas roupas íntimas, mas estava satisfeito por tê-las em minha vida. Tinha muita sorte em conhecê-las. Mesmo que jogassem coisas em mim e me chamassem de nomes relacionados com testículos.
Peguei o telefone para mandar um SMS para Ross:
Ross. Tom e eu vamos beber em Balham hoje à noite. A partir das seis no Sheep's Head. Você pode ir? Avise os rapazes. Nick.
Os rapazes. Pensei no que me teria levado a chamá-los assim. Acho que, no fundo, ainda somos rapazes, e ter passado dos 30 não mudara isso. Mesmo que agora a gente use sapatos almofadados com solas especiais e fechos de Velcro e tente não cair no ônibus, seremos sempre "os rapazes". Algum dia, porém, este rapaz teria de crescer...
Eram quatro da tarde, faltava apenas uma hora para eu poder sair do trabalho e me divertir. Meu telefone tocou; era uma chamada interna. De repente, temi que fosse Chloe. Merda. Peguei
o fone já tremendo, mas era Ant, graças a Deus. Nunca pensei que fosse ficar feliz em ouvir a voz dele.
- Nick, você pode passar na minha sala? - perguntou.
Oh, não. Provavelmente eu estava metido em algum problema, pensei, colocando o fone no gancho. Ia ter de passar pela redação. Passar pela minha ex, que provavelmente tentaria grampear meus lábios ou fazer furos extras no meu nariz. Cabeça erguida, Nick. Cabeça erguida. Senti uma pontada aguda de arrependimento pela tolice que fora não ter respeitado a regra de não sair com colegas de trabalho.
Abri a porta e atravessei a redação, com o coração batendo acelerado no peito. Dava para vê- la pelo canto do olho, mas não olhei. Não ia dar corda às mentiras dela. Após o que me pareceu uma eternidade, alcancei finalmente as escadas que davam na sala dele. Aliviado, respirei fundo, mas estava bem curioso quanto ao que estaria por vir.
- Vamos, Nick, dá para você se apressar? - gritou ele, brincando, do alto de seu escritório, arruinando minha tentativa de ser discreto. Àquela altura, mesmo quem não tivesse me visto passar sorrateiramente agora sabia que eu estava ali.
Subi as escadas correndo e, ao chegar lá em cima, dei-me conta de que estava em péssima forma, pois fiquei quase sem fôlego. Ele vestia uma camisa azul-escuro com riscas horizontais, o que não favorecia nem um pouco sua barriga cada vez mais proeminente.
- Sente-se, Nick! - ordenou ele, com um sorriso tão largo que parecia ocupar todo o seu rosto. Quando acontecia de sorrir, era sem dúvida com vontade, mesmo que isso não acontecesse com frequência.
- O que foi, chefe? - perguntei, esticando as pernas e colocando as mãos no tronco.
- Duas coisas, na verdade. A primeira é perguntar a você por que está tão triste. - Ele empurrou na minha direção um prato de chocolates e biscoitos e tive a terrível sensação de que estava numa espécie de sessão de aconselhamento da direção. Mas as conversas de homem para homem dele acabavam sempre no ridículo.
- Eu, triste? Sério? - perguntei, fingindo não entender.
- É, você. Olha só para a sua cara, está precisando fazer a barba. E nem está mais passando suas roupas.
Ele tinha razão. Era Chloe quem costumava passar minha roupa.
- Vamos lá. Já soube de você e Chloe. - Enfiou um punhado de chocolate na boca, com ar de quem sabia tudo.
Não ia mesmo conseguir escapar, ia?
- Vou ficar bem. De qualquer jeito, já faz alguns dias...
- Semanas, Nick. Algumas semanas. E você está com cara de quem não toma banho desde então - disse, sem rodeios, cruzando os braços.
Eu tomara banho... e não fazia assim tanto tempo, ou será que fazia? - Bem, tenho ótimas notícias para você. Ela vai embora.
Oh, graças a Deus, pensei. Tive vontade de gritar de alegria. Isso era fantástico. Ocultei meus sentimentos.
- Que pena. Para onde ela está indo?
Ele espiou por cima de meu ombro numa tentativa desajeitada de verificar se ela não estava olhando, e então se inclinou na minha direção e sussurrou. - Não diga para ninguém, Nick... E vai ser um choque. Ela está se mudando para ir viver com o antigo namorado, um cara que conheceu na universidade, ou coisa parecida. Penso que as "negociações" com certeza se iniciaram quando vocês ainda estavam juntos...
Que grande merda. Traído. Mais uma vez. Então era por isso que ela estava se comportando daquele jeito. Não sabia direito como lidar com aquilo. Minha mente foi de volta àquela primeira vez em que almoçamos, quando ela falou de amor e de como já o experimentara.
Eu estava furioso. Estava sendo invadido por uma fúria avassaladora e incontrolável e tudo que podia fazer era ficar sentado em frente ao meu chefe e ser "profissional". Como é que ela se atrevia a me acusar de traí-la quando era exatamente o que ela estava fazendo com outro cara?
- Desculpe, cara. Não devia ser eu a contar isso a você, mas é que não aguento mais ver você nesse estado e acho que você está precisando de uma sacudida para seguir em frente, entende?
Assenti com a cabeça, mas o que eu realmente queria era descer as escadas correndo para confrontá-la. Ela tentara fazer parecer que a culpa por ela ter ido embora era toda minha, e quase me fez acreditar nisso. Eu já não entendia nada. Sentia que já não entendia ninguém...
- E a segunda coisa... - Ant interrompeu meus pensamentos na hora certa. Antes que eu implodisse de raiva e entrasse em combustão espontânea e destruísse a sala dele. Um pé dependurado no abajur de mesa e pedaços do meu corpo espalhados na cara dele.
- Sim, Ant, o que é?
- Sarah, a editora da SparkNotes, vai embora. Vai viajar.
Tive um flashbackda festa de Natal e de como Chloe soubera daquilo muito tempo antes. Ora, Chloe. Mas o que isso tinha a ver comigo?
- Estou à procura de um novo editor. É um cargo importante. E tenho uma pessoa em mente, mas preciso que você me convença. - Ele sorriu de novo.
Já estava começando a pensar que afinal ele não era assim tão mau. Uma onda de entusiasmo percorreu meu corpo, ele devia estar falando de Sienna. Queria pular da cadeira e contar-lhe fervorosamente o quanto ela era maravilhosa. O quanto se esforçava. O quanto ela merecia aquilo mais que qualquer outra pessoa na empresa. OK, não era a editoria de uma grande publicação nacional, mas já era espantoso para uma garota de 25 anos que achava que não havia nada à sua frente a não ser administrar medicamentos e erguer paredes de almofadas.
As possibilidades começaram a pipocar em minha cabeça. Como ela ficaria em sua própria sala, como poderia trazer novos ares para a revista, como teria mais dinheiro para ela e o pai poderem ter uma vida melhor. De repente, mais que qualquer outra coisa, desejei que ela pudesse conquistar tudo aquilo.
Ele olhou para mim na expectativa.
- Bem, e então Nick, você conhece o trabalho dela melhor que eu. O que você acha? Ela está preparada?
- Meu Deus, Ant, se está. Está mais que preparada. Ela é uma superestrela, é talentosa, ela, ela é incrível... - fiz uma pausa, quase sem fôlego.
Ele ergueu uma sobrancelha, desconfiado. - Está bem, cara, calma.
Fiquei corado. Sentia o rosto arder.
- Vá embora, saia daqui - ordenou, com um riso abafado.
- Vai escolhê-la, não vai? Vai, por favor, diga que sim - implorei, debruçado sobre a mesa dele, derrubando uma pilha de papéis no chão.
- Ainda não tenho certeza, Nick, mas, assim que souber, aviso você, combinado?
Provavelmente vou tratar disso amanhã.
- Combinado. Acho melhor assim - falei.
De repente, me sentia leve e fresco ao sair pela porta e descer as escadas. Imediatamente vi Sienna sentada em sua mesa escrevendo como uma maníaca. Estava tão entusiasmado. Chloe não estava lá, graças a Deus. Certamente fora preparar uma bebida, e então fui até Sienna e sussurrei em seu ouvido. Era estranho, há muito tempo eu não fazia aquilo.
- Olá, superestrela!
Ela deu um pulo e depois olhou em volta, nervosa, como se eu não devesse ficar perto dela no trabalho.
- Nick. O que foi? - perguntou, rindo timidamente.
Pisquei para ela e me afastei, indo para a minha sala. Ela pareceu confusa por um momento e depois continuou a digitar. Estava tão feliz por ela. Precisava evitá-la, pois sabia que lhe contaria tudo se estivesse com ela.
As cinco horas chegaram e partiram. Abri lentamente as persianas para ver que 90 por cento das mesas estavam vazias, incluindo a dela. O silêncio reinava na redação. A luminária de luz fria estava falhando daquele jeito que dá dor de cabeça. Olhei para o elevador e fiquei lembrando do momento em que saí de lá e ela se tornou parte da minha vida.
Às cinco e meia da tarde me levantei e deixei o escritório. Ainda tinha algum tempo antes de encontrar os rapazes, então pensei que ficaria sentado no carro um pouco e ligaria para minha mãe. Já fazia tempo que não conversava devidamente com ela. Ainda havia sol, mas a luz já estava ficando mais tênue, com listras cor-de-rosa cortando o céu. Eu me sentira um trapo durante toda a tarde, mas agora me sentia mais feliz.
- Hum... com licença. - Uma voz profunda e áspera me tirou daquele momento. Sem dúvida, era um sotaque londrino, mas com um toque refinado. Assim como a pessoa que proferia aquilo. Olhei em volta, de pé junto ao carro. Quem poderia ser...?
De repente, um maltrapilho saiu lentamente do outro lado do carro. Tinha um ar de dar medo, mas era um rosto familiar... Embora eu não conseguisse lembrar exatamente... Aquilo me incomodava. Numa mão ele segurava uma lata de Coca-Cola, na outra um saco cheio de algo que parecia pesado. Livros, talvez? Parecia zangado. Oh, não. O que ele ia fazer comigo?
- Você é Nick? - perguntou, apontando para mim com a lata. Derramou um monte do líquido castanho no teto do meu carro, que efervesceu na pintura. Merda. Estaria bêbado?
- Hum, sim. Por quê?
- Preciso entrar no seu carro - disse, num tom atravessado.
Acho que não, amigo. Ele tinha cara de morador de rua. De jeito nenhum eu deixaria que um sem-teto doido entrasse no meu carro. Nem pensar. Eu lá tinha cara de ser mais um índice nas estatísticas criminais?
Mas sou muito idiota, apertei o botão errado do chaveiro e destranquei automaticamente as portas. Entrei em pânico, e o tempo que gastei olhando para o chaveiro retardou consideravelmente meu tempo de reação. Antes que tivesse oportunidade de apertar o botão que trancava, o sujeito já abrira a porta do passageiro e entrara. Ah, merda.
Ele sentou no banco, olhando fixamente para a frente, e eu fiquei sem saber o que fazer por uns momentos, passando o peso de um pé para o outro, antes de ir correndo para o outro lado do carro. Agarrei-o pelo braço magro e tentei puxá-lo para fora com toda a minha força. Meu lábio superior começou a transpirar. Bem-vindo a Londres. Perigo em cada esquina. Por dentro, eu me xingava por não ter sido mais cauteloso.
Continuei a puxar, mas ele parecia ter criado raízes no lugar, com um pé firmemente ancorado no lugar para as pernas. Minhas mãos começaram a ficar suadas e escorregar na pele do braço dele. Eu não conseguia. Ouviram-se vários resmungos, não sei se meus ou dele.
- Pelo amor de Deus, sai daí! - gritei, na esperança de que alguém ouvisse e viesse ajudar.
- Não. Me ouça - disse ele, mas comecei de novo a tentar puxá-lo. Agora ele estava se agarrando no teto do carro, e era impossível arrastá-lo para fora. O carro balançava ligeiramente sob o peso da briga. Cheguei até a apoiar a perna na porta para fazer de alavanca, mas ele se agarrava com unhas e dentes e não cedia. Desisti, batendo as mãos nos joelhos, sem fôlego e pensando no que faria a seguir. Talvez pudesse dar um soco nele? Não sou um homem violento, mas era autodefesa, certo? Fechei a mão e me preparei.
- Quem é você, porra? - berrei, minha voz ecoando atrás de mim pelo estacionamento. Eu parecia uma garota.
- Amigo, dá para se acalmar? Sou Pete. Você me conhece.
Não fazia a mínima ideia de quem ele era. Pete. Pete. Quem seria ele? Olhei para ele com atenção. O rosto dele tinha aquele aspecto enrugado de quem passa muito tempo na rua; havia rugas ao redor dos olhos que o deixavam mais velho do que na verdade era. Vestia uma camiseta preta desbotada e um jeans cheio de buracos. Então caiu a ficha.
Era Pete de Sienna. O morador de rua com quem ela sempre conversava. Aquele cara com quem eu achava que ela perdia tempo. Mas estava com uma aparência muito melhor que antes - mais robusto, barbeado. Mas ainda não completamente arrumado... Fiquei totalmente confuso.
- Ah, droga, desculpe - estendi a mão, mas ele a recusou, zangado.
- Deve se desculpar mesmo, sua besta - bufou, agitando os ombros para a camiseta assentar- se de novo no lugar. - E agora, vai deixar que eu fique para que possamos conversar?
- Por quê? - perguntei, ainda um pouco abalado com aquele contratempo. Continuava sem saber o que ele queria de mim.
- Porque tenho algo para lhe dizer.
Um arrepio me percorreu a espinha. Por que ele queria falar comigo? O que estava acontecendo?
- Então está bem, diga - concedi, sentando-me no lugar do motorista.
Ele imediatamente ajustou o banco, colocando-o praticamente na posição deitada. Oh, por favor, sinta-se em casa. Depois, colocou os pés para cima apoiando os tênis sujos no console. Pelo amor de Deus... Até me arrepiei. Lavara o carro havia pouco tempo.
- O que você quer? - Eu sabia que ele era "amigo" de Sienna, ou o que quer que fosse, mas, se querem saber, comportava-se muito mal.
- É sobre Sienna - começou a dizer, virando-se para mim e me fitando nos olhos. Os olhos dele me remetiam ao inverno, eram frios e penetrantes. De repente, perguntei-me como ele aguentara esse tempo todo.
- Então vamos lá, desembucha. Tenho de sair, amigo. - Eu estava doido por uma cerveja e não tinha tempo para aquilo. Nunca demonstrara muito interesse quando Sienna me falava dele. Agora me sentia mal por causa disso.
Ele suspirou e olhou para baixo, para o lugar dos pés, que estava agora cheio de marcas de sujeira marrom. Reparei que sua mão direita tremia ligeiramente. Parecia que estava bastante nervoso. O que me deixou bastante nervoso.
- Ela ama você. - O quê?
- Eu disse que ela ama você. - Quem?
- Sienna, pelo amor de Deus. Pensei que você fosse mais inteligente. - Como é que você sabe?
- Ela me disse. Quer dizer, ela sempre me diz isso. O tempo todo. Ela sempre, sempre, amou você - dizendo isso, levantou abruptamente a mão direita e me respingou de novo com Coca- Cola.
Nem me incomodei. Queria abraçá-lo. Queria pegar aquele homem magrela nos braços e agarrá-lo com força por ter-me dado a melhor notícia da minha vida. Nunca me sentira tão feliz.
- Está brincando comigo? - Não.
- Tem certeza? - Sim. Recostei-me com força no banco e passei as mãos pelo rosto.
- Por favor, me conte mais - implorei, virando para ele de novo e esperando que aquilo tudo não tivesse sido somente fruto da minha imaginação.
- Nem sei bem por onde começar. Ela ficaria furiosa se soubesse que estou fazendo isso. Espero estar fazendo a coisa certa.
Fiquei sem palavras, então só conseguia concordar com a cabeça. Agora ele podia pôr os pés sujos onde bem entendesse. Nem ia ligar se pisasse em minha camisa nova ou nas cortinas caras, desde que simplesmente me contasse...
- Ela está apaixonada por você desde que o conheceu e nunca superou isso. Bem, ela disse que estava tocando em frente quando estava com aquele cara... como ele se chamava mesmo?
- Ben - guinchei, depois de um pigarro.
- Isso, esse. Seja como for, eu já não aguentava mais. Eu perdi minha mulher, Nick. Ela morreu num acidente de trem. O tipo de amor que eu sei que ela sente por você é igual ao que eu tinha pela minha mulher, Jenny. Não podia fingir que não sabia e não fazer nada. Já tem cinco anos, pelo amor de Deus. - Ele inclinou a cabeça para trás e derramou as últimas gotas de Coca na garganta. - O que você tem a dizer? Fiquei com a impressão de que você também sentia algo por ela. Quer dizer, quem não sentiria? - Ele olhou para mim como tentando investigar. Esperançoso.
- Mas é claro que eu a amo - revelei, pousando as mãos com força no volante e acionando sem querer a buzina. Ambos demos um salto.
Eu estava completamente trêmulo. Tinha de me acalmar.
- O que... o que... o que vou fazer? - perguntei a ele, gaguejando.
- Diga a ela, pelo amor de Deus, e rápido está bem? Ela é um anjo - disse ele, sorrindo ao pensar em Sienna. - Você é um homem de sorte - acrescentou.
Eu concordava. De muita, muita sorte. Ia falar com os rapazes esta noite e amanhã falaria com ela. E ia fazer com que tudo fosse perfeito.
- Tem ideia do que ela fez por mim? - perguntou ele, meio emocionado.
- Não. Não. Na verdade, nem imagino. - Para ser sincero, eu ficara cheio de ouvi-la falar da preocupação que tinha por esse sujeito. Dizia a ela que já tinha muito com o que preocupar-se. Eu estivera tão envolvido com meus problemas nas últimas semanas que nem reparara que ela ainda se encontrava com ele.
- Ela me tirou das ruas, Nick. Arranjou para mim uma assistente social e agora já tenho um lugar onde dormir. Estou num albergue. E pode ser até que eu consiga emprego e um dia uma casa só para mim. E tudo graças a ela... Eu me sinto muito mal por nunca ter agradecido a ela tudo o que fez por mim. Da última vez em que nos vimos, brigamos feio. Não sei o que dizer para resolver as coisas, mas tinha de fazer algo por ela, assim como ela fez por mim... Vá atrás dela, Nick- ele disse, começando a abrir a porta.
- Espere, não vá embora. - Eu queria saber mais. Eu achava que já sabia tudo, mas nos bastidores ela salvara aquele homem do esquecimento frio. De uma vida de carência e fome.
- Você sabe o que fazer agora. Tenho de ir - falou e saiu rapidamente do carro, batendo a porta atrás de si. Vi quando pôs o saco no ombro e desapareceu na noite.
Ela me ama. Caí sobre o volante imaginando o que deveria fazer a seguir. Aquilo era muito especial. Tinha de esperar pelo momento certo. Fiquei ali sentado no carro por uns momentos. Uma parte minha queria cancelar o drinque e dirigir até qualquer lugar onde pudesse refletir.
Percebi que estava nervoso demais para dirigir, mas senti que podia voar.

Esta é uma história de amor (Jessica Thompson)Onde histórias criam vida. Descubra agora