Esperança

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Tentei tranquilizar meu bebê com palavras doces e água com açúcar. Levei-a para lavar o rosto e quando pareceu mais calma sentamos na cama e olhei para ela segurando suas duas mãos.

- Pronto, meu amor, agora que você se acalmou pode falar comigo. Que aconteceu afinal?

Ela respirou fundo, olhou para mim e disse:

- Eu fui no banco porque queria saber de meu dinheiro. Achei estranho, pois não recebi o histórico bancário do mês passado, o que aliás foi uma feliz coincidência. Chegando lá não consegui acessar minha conta no caixa eletrônico e procurei o gerente. Daí ele me informou que a conta havia sido encerrada no dia 14 de fevereiro.

- O que?? – perguntei chocada – Como?? Você não sacou dinheiro no mês passado??

- Sim, só que foi na véspera deste dia e depois não mais. Pensei em sacar de novo só hoje. – sua expressão era de profunda tristeza.

- Mas como, Camz? Quem pode fechar sua conta a sua revelia?? Como?

- Foi meu pai! – uma lágrima fugiu de seus olhos.

- Mas como conseguiu isso? A conta não era sua??

Ela respirou fundo, silenciou e respondeu:

- Você vai me chamar de idiota...

- Eu jamais faria isso. – toquei seu rosto de leve – Pode falar.

- Minha conta aqui no Brasil foi aberta quando eu era menor de idade. Meu pai transferiu uma parte do meu dinheiro para ela e a outra deixou em Londres, no nome dele. Mas eu não me importava com isso. Então ele era meu representante legal e responsável por aquela conta. Eu tinha liberdade para gastar, mas ele era o principal correntista. Quando fiz dezoito anos eu deveria ter aberto minha própria conta e me desvinculado da anterior, mas esqueci desse detalhe, e daí, tão logo deve ter chegado ao Brasil, ele foi no lá, transferiu o dinheiro para sei lá onde e fechou a conta. – olhou para mim temerosa e disse chorando – Não tenho nada mais além de poucas moedas na bolsa.

- Ô meu amor, não chora. Vem aqui. – ela novamente se jogou nos meus braços – Eu não estou zangada com você e nem te acho idiota. Você é que nunca pensou que seu pai pudesse fazer algo assim. Mas me fala, ele pode fazer isso mesmo? É lícito? Você não deveria ter assinado algo?

- Mas eu assinei. Eu vi minha assinatura lá.

- Como?? O desgraçado falsificou! – respondi revoltada.

- Não. Eu deduzo que foi um papel que mamãe me pediu para assinar uma vez lá em casa. Pouco antes de ela viajar no final do ano. Ela disse que era um abaixo assinado do condomínio por causa de sei lá o que, eu nem lembro, sei lá, mas de fato o papel estava em branco. Só pode ter sido isso. Ela deixou minha assinatura guardada para usar em caso de eu teimar em sair mesmo de casa. Não sei!

- Cristo Santo! Então não podemos reverter isso?

- Não.

Permanecemos abraçadas.

- Amor, olha pra mim, olha. – ela obedeceu – Eu ainda tenho o dinheiro do prêmio, Ramirez me pagou os trabalhos em Bonsucesso e deu tudo certo hoje lá no Arthur. Eu to empregada. – sorri.

Ela sorriu também limpou os olhos.

- Ai amor, eu nem perguntei, que horror! – beijou-me – Estou feliz por você. – sorriu.

-A gente vai viver mais apertada, mas não vamos passar fome. E pode deixar, eu te dou dinheiro. Não quero que tenha vergonha de me dizer quando precisar. Mas mesmo que não diga eu te dou. Hoje mesmo eu vou correr pro banco e fazer um saque e dar pra você. – beijei-a – Mas acho que você precisa falar com vó Dorte o mais rápido possível. Ela nem deve saber dessa canalhice. E não procure seus pais, porque é isso que eles querem. Outra coisa também, vamos transformar a minha conta numa conta conjunta que aí você pode sacar dinheiro quando precisar.

- Eu vou ligar para vovó amanhã. E não quero que tire dinheiro a essa hora.

- Fica tranquila linda, eu vou num pulo e volto.- beijei seu rosto – Lave esse rostinho de novo e me dê um tempo. Eu vou aproveitar e comprar um lanche pra gente fazer ao invés de jantar. Tudo bem?

Ela sorriu tristemente e disse:

- Tudo.

Levantei e fui para a rua. Saquei dinheiro e comprei um lanche simples para nós. Em casa tínhamos frutas e pensei em complementar com elas. Senti imenso ódio de Alejandro e Sinu e tive vontade de esbofeteá-los até cansar. Como poderiam ser tão desgraçados assim? Camz me perguntou sobre o dia de hoje e ouvia a tudo com interesse, embora passasse o resto das horas triste. Dormimos abraçadinhas

Demorei a pegar no sono com medo de dificuldades financeiras. Tive medo de que na carência, ela desistisse de mim e me deixasse, como era o tão esperado sonho de seus pais. De repente, parecia que uma pedra se colocara a nossa frente e tudo havia parado, mas preferi pensar que Deus sabe a hora certa de todas as coisas;, no dia em que ela descobre o golpe do pai eu havia sido empregada. Talvez a mensagem oculta em tudo isso fosse: esperança!

My only love.Onde histórias criam vida. Descubra agora