Visita

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Sinu apareceu em nossa casa em Natal cinco dias depois. Era por volta de 16:00h. Chegou de táxi e tocou a campanhia como se estivesse à beira da morte. Eu estava ajudando Camz no banho e pedi para Fran ver quem seria. Vó Dorte estava preparando as coisas para o curativo na cicatriz da operação.

- Ô dona Laur! – Fran veio correndo – É uma loira qui parece a dona Camila i diz que é mãe dela, num sabe?

- Minha mãe?! – Camila me olhou surpresa.

- Deixe entrar Fran. – respondi – E, por favor, ofereça algo a ela enquanto espera.

Fran se foi correndo. Camila vestiu a camisolinha e foi comigo até a cama

- Quem é? – vó Dorte perguntou segurando uma pomada.

- Minha mãe! – Camila deitou-se na cama. Ainda estava chocada

- E o que aquela mulher veio fazer aqui? Se está pensando em fazer grosserias... – gesticulava nervosa.

- Fique tranquila vó Dorte. – respondi – Ela veio em paz. Tenho certeza. – peguei as gazes e luvas.

Camz e a avó não sabiam de minha "conversa" com Sinu em São Paulo.

- Meu amor, eu vou conversar com ela. Quer recebê-la? – passei a mão em seu rosto.

- Se ela veio em paz, sim.

- Ela veio. Acredite. – beijei sua testa e fui para a sala.

Vó Dorte iniciou os procedimentos para o curativo

Sinu estava sentada na poltrona da sala reparando atentamente no ambiente que a cercava. Usava um conjunto azul de saia e blusa, como túnica, e calçava sandálias de salto prateadas. Ao me ver levantou-se e tirou os óculos escuros.

- Dona Laur eu já oferici um monti di coisa pra ela, mas num quis nada! – Fran logo me informou

- Obrigada Fran. – olhei para ela - Fique tranquila. Já chegou seu horário, você pode ir embora.

- Tá! Licença. – retirou-se.

- Tem uma bonita casa Lauren. – olhou diretamente em meus olhos.

- Camila e eu temos, Sinu. Obrigada. – pausei – Camila está no quarto com vó Dorte. Faremos curativo nela.

- Quero vê-la! – seu tom era imperativo, mas se corrigiu – Por favor.

- Claro que vai vê-la, mas quero te alertar. Ela está bem diferente da moça da qual se lembra. Está mais magra, abatida, sua pele escureceu e seus cabelos caíram. Você vai sentir um impacto, mas, por favor, seja discreta. Sem cenas!

Ela fechou os olhos e respirou fundo. Estava ansiosa e triste.

- Eu serei. Por favor, deixe-me vê-la.

- Venha comigo! – segui rumo a nosso quarto.

Sinu veio logo atrás e na porta do quarto estancou. Camz levantou a cabeça para vê-la e vó Dorte mantinha o semblante sério. Sentei na cama e continuei o procedimento que vó Dorte já havia iniciado.

Sinu adentrou como quem pede licença e não conteve as lágrimas ao pousar seus olhos sobre Camila. Mas sem o escândalo que lhe era peculiar; seu choro era contido, triste, um choro de quem se arrepende e percebe que perdeu tempo demais.

- Olá meu bebê... – permanecia de pé.

- Olá mãe. – Camz respondeu serenamente.

- Boa tarde Dorte. – cumprimentou-a de cabeça baixa

- Boa tarde Sinu.

Os minutos correram tensos até que concluímos o curativo.

- OK! Acabamos aqui. – olhei para vó Dorte – Vamos deixá-las a sós. Elas precisam conversar.

- Sim. - balançou a cabeça.

Vó Dorte e eu arrumamos tudo e guardamos as coisas. A velhinha foi para sala e antes de sair olhou bem para o rosto de Camz sem nada dizer.

- Estaremos na sala meu amor. Converse com sua mãe. – beijei seus lábios rapidamente. Ela balançou a cabeça.

Ao sair do quarto disse em voz baixa para Sinu:

- Aproveite a oportunidade dessa vez.

A conversa entre mãe e filha foi longa e, ao que pude perceber, muito emocionada. Sinu não quis dormir em nossa casa, o que compreendi em função de tudo que aconteceu no passado, e por isso a levei de carro para se hospedar em Ponta Negra. Telefonei antes e fiz reserva no primeiro hotel que construímos, o qual já operava a todo vapor. No trajeto estávamos caladas, mas um inesperado engarrafamento quebrou o silêncio.

- Então, vocês têm seu próprio negócio? – perguntou olhando para o trânsito.

- Sim. E tô te levando pra um hotel que a gente fez. Uns portugueses nos pagaram pra construí-lo, além de outros hotéis.

- Camila me disse. – pausou – Vocês progrediram bastante na carreira. Fico impressionada.

- Graças a Deus!

- Sabe? – riu sozinha – Que situação! Eu, de carona no seu carro!!! – riu – Não sei se te agradeço por ter me procurado ou se te processo. – olhou para mim – Você acabou comigo em São Paulo! Nem tão cedo posso frequentar a sociedade novamente. Além do mais não aprovo esse relacionamento.

- Sinto muito, mas não pedimos sua aprovação. – olhei para ela - E me responda sobre o que é mais importante. Camila ou a sociedade?

Abaixou a cabeça.

- Mas... não consigo engolir aquilo ainda. Hum! Mudemos de assunto. – alisou a própria roupa - Lauren, me responda com toda sinceridade... – olhou para mim – Acredita que Camila conseguirá sobreviver?

- Luto por isso todos os dias. Deixei nas mãos de Deus e confio nele.

- Vou embora amanhã porque tenho que ver Alejandro, mas quero estar presente de agora em diante. Entrarei em contato com os melhores médicos da Europa e dos Estados Unidos. Darei um jeito de fazer isso e quero que cuidem de minha filha. Não entendo porque Dorte não fez isso.

- Ela sabe que Camz está sendo bem atendida, mas se quiser fazer isso, fique à vontade. Melhor pra ela se tiver mais recursos e ajuda.

- Alejandro está mal... – passou a mão nos cabelos – Quando contei sobre Camila ele ficou zonzo e depois passou mal do coração. – olhou para fora. – A família dele tem esse problema de coração fraco. Gary tinha, Dorte tem e agora bastou um estopim e Alejandro também manifesta a deficiência.

- O que ele teve? – olhei para ela.

- Um infarto. – respirou fundo – Por isso demorei a vir. Tive de cuidar dele antes. Está em casa agora, mas com enfermeira.

- Nossa! Espero que melhore logo. – falei com sinceridade – Ele também precisa se reconciliar com a filha.

- Se importa com isso? – olhou para mim como se me estudasse.

- Claro que sim! – encarei com ela – Camila tem mãe e pai vivos. Gostaria muito que pudesse sentir isso. Já lhe disse que sei o que é ser abandonada, e não queria que ela sentisse na pele.

Fomos em silêncio no resto do curto caminho que sobrava e na descida Sinu olhou para mim e disse:

- Camila tem mãe e pai! E ela vai sentir isso.

- Assim desejo!

O carregador veio buscar sua mala e ela adentrou pela recepção com a pose peculiar.


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