Capítulo 39

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Brie teve que partir quando o pai a chamou e eu precisei partir quando Nicholas enfim me encontrou.

Sem as desculpas.

— Acho que mandei você desfazer essa cara — Nicholas reclamou quando eu entrei em seu Maserati.

— Também me disse para esperar onde eu estava.

Num gesto inconsequente, procurei e apertei o cinto de segurança. Nick me olhou de modo estranho enquanto eu estava em meu “processo de proteção”.

— Como eu iria imaginar que você estaria no meio de um monte de neve? O carro não vai até lá.

Analisei o carro. Não havia entrado ali muitas vezes, em geral, nunca precisávamos usar um carro. Somos velozes o suficiente para não precisarmos de automóveis.

— Onde você guarda esse carro? E onde está aquele Hyundai vermelho? — perguntei olhando para as pessoas que andam tranquilamente atrás do vidro fumê.

— Aluguei uma garagem. O vermelho está à cinquenta e quatro quilômetros daqui, em Big Falls. Nunca se sabe quando vamos precisar de outro carro — Nicholas desviou o olhar para mim por um momento e piscou.

Observei o modo como ele movimenta as mãos pelo volante, tão familiarizado, como se estivesse dirigindo por horas.

— Big Falls — repeti. — Quantas outras “Falls” Minnesota guarda?

— Não sei — respondeu Nicholas rodopiando o volante para dobrarmos uma curva, então emitiu um inaudível “Oh” ao perceber que era uma pergunta retórica. — Quantas você conhece?

Olhei para os vidros. Não para as pessoas nas ruas, somente para os vidros escuros com marcas empoeiradas denunciando o pouco uso do veículo.

— Conhecer? — guardei essa palavra em uma das gavetas que não pensei em incinerar. O que eu conheço? Nada. É isso que haverá no arquivo Conhecer. Será meu arquivo predileto! — Nenhuma.

— Hum. Oregon também tem algumas Falls. Klamath Falls. É um lugar bacana.

— Quantos carros você tem?

Nick pensou um pouco, movendo os dedos no volante como se os usasse para contar.

— Cinco. Acho — Nicholas olhou para um carro estacionado no acostamento e algo dentro dele fez POP! — Com o velho Tahoe, seis. É. Seis. Acho.

— Hum. Onde você consegue tanto dinheiro? — não lembro de ter feito essa pergunta à Nicholas antes. Ele é rico e eu abuso um pouco de sua riqueza, era só isso que eu pensava. — Maseratis e velhos Tahoes não caem do céu.

— Já trabalhei em muitas coisas, rapaz. Sou formado em advocacia, engenharia ambiental, química, sei muitas coisas de arquitetura e coisas de mais do mundo. Servi ao exército. Na Primeira Guerra Mundial eu estava lá. Na Segunda, também. Fingi minha morte em ambas — ele riu e eu recebi uma dose de suas lembranças, sem querer.

Vi Nicholas deitado, coberto de sangue e lama. Homens armados, se escondendo. Alguns perguntando em sussurros se não poderiam resgatar Nicholas — que eles chamaram de Donegan — daquele “buraco”. Um homem disse: Nosso melhor homem, morto. Arames farpados estavam à centímetros do rosto de Nicholas. Chovia. O tilintar das balas reverberando à muitos pés dali, por um breve instante, foi tudo o que se ouviu. Quando os homens se foram, Nicholas se ergueu, tirou as vestimentas do exército e correu como um vampiro, esguichando lama para todo lado.

Balancei a cabeça negativamente. Nicholas não percebeu.

— Tenho mais de quinhentos anos e profissões de mais. Obviamente, guardei uma boa quantia e investi alguma parte em imóveis, o que dá algum lucro.

Primavera & Chocolate (livro um)Onde histórias criam vida. Descubra agora