Capítulo 17

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Tudo em volta ficou confuso. Sentir como se minha alma deixasse o corpo. As pessoas pareciam não existir, o barulho das conversas findaram e a única coisa que enxerguei foi ele. O homem que acabou com meu coração, deixando-me enterrada em um vazio de dor e desespero. Só eu sei o que sofri em suas mãos. Daniel estava aqui. Engoli seco, fitando os olhos negros, a pele morena, o cabelo bem cortado, estilo militar, o corpo forte e bem trabalhado na academia e nos treinos de MMA. As tatuagens, mesmo escondidas na camisa de linho branca, fascinavam. Sua mão tocou o lado esquerdo do peito, próximo ao coração, onde meu nome foi gravado, como prova do seu amor.
Ninguém nunca vai te arrancar do meu coração. Essas foram as suas palavras enquanto segurava a sua mão no estúdio de tatuagem. Senti saudades dessa época, do que fomos e do que nunca mais vai voltar. Éramos felizes juntos. Minha mãe costumava dizer que éramos almas gêmeas, que tiveram a sorte de se reencontrarem na infância. Meu pai falava que era bobagem e que devíamos nos unir a quem nos enxergasse realmente. Ele me enxergou por muitos anos mas algo mudou. Unidos por alma e separados pelo destino. A dor em meu braço me fez voltar a realidade e quando olhei para as mão que segurava firme e tremi. Jamie sabia que o Daniel estaria aqui. Toquei meu pescoço onde ele mordeu e entendi o pedido para não esconder nada com maquiagem. Até mesmo a roupa foi escolhida para isso. Jamie queria marcar território. Mostrar o quanto me tinha. Fazer meu corpo de vitrine para as suas inseguranças.
— O que você quer provar com isso? — Sussurrei e ele apenas sorriu de lado. Ali estava a máscara que sempre usava quando a situação era de vulnerabilidade. Não voltei a olhar para o Daniel e sentei ao lado do Jamie enquanto cumprimentava e era apresentada aos convidados. Os nomes e rostos não fixaram em minha mente e pouco importava se era Jonh ou Carl. Estava preocupada em como meu casamento ficaria a partir desse jantar. Não quero acreditar que foi o Jamie a planejar isso mas estava na cara. Ao lado do Daniel estava Micaela. Uma mulher deslumbrante com o qual Daniel se envolveu estando comigo. Me senti pequena e exposta. Não sabia onde colocar minhas mãos e para onde olhar.
— Quando o Carl contou que o Jamie estava casado, devo confessar, não acreditei. — Uma mulher falou olhando para mim. Passou alguns segundos antes de perceber que falava comigo.
— Não gostamos de perder tempo. — Respondi. Senti a mão do meu marido alisando minha coxa devagar. Eu quis afastá-lo mas deixei que me tocasse. Não quero dar margens a interpretações equivocadas.
— Como se conheceram? — A mesma mulher perguntou. Olhei para o Daniel rapidamente e bebi uma taça de champanhe. — Ninguém sabia que estava namorando. — Jamie não respondeu. Ele queria que eu falasse. Queria observar tudo.
— Fiz um trabalho na empresa do Jamie e o meu melhor amigo trabalha com ele. Foi esse meu amigo que nos apresentou. — olhei para o Jamie e vi seu desconforto. Aquilo me matou por dentro.
— E foi muito bem sucedida, hein? — Micaela falou. Ela me encarava com tanto ciúmes que dava pra sentir a quilômetros.
— Sim. Tive muita sorte em conhecer o Jamie e ele se interessar por mim.
— Eu sou o único sortudo aqui. — Jamie falou e segurou meu rosto antes de me beijar. Foi tão estranho e constrangedor. Eu queria enterrar minha cabeça na areia. Mas retribui o beijo e ele pareceu se acalmar um pouco. A pouco tempo estava tão feliz e cheia de expectativas quanto imaginei viajar com o Jamie. Coloquei todas as minhas fantasias a bordo e deixei me levar. Todos começaram a falar entre si e tentei focar na taça de champanhe que não ficava vazia por mais de um minuto. Em determinado momento as pessoas riram de alguma piada do Daniel mas não consegui prestar atenção. Olhei para o Jamie e ele estava sério. Carrancudo. Segurei sua mão e alisou meus dedos.
— Eu te amo. — murmurei e ele me olhou mas não falou nada.
— Daniel contou que vocês dois cresceram juntos. Que coincidência não é? — A esposa do tal Carl falou novamente olhando para mim. A mulher parecia não conseguir ficar de boca fechada. E o pior é que estava sempre puxando assunto comigo. Eu só queria ficar tranquila no meu canto até isso acabar. Nem quis olhar o Jamie nessa hora. Posso imaginar a cara que está fazendo. Todo contorcido de raiva.
— Qual é a coincidência? — Perguntei sem muita simpatia.
— Estarmos reunidos aqui. — Que se foda! Coincidência uma puta. Respirei fundo. Minha cabeça não estava em seu melhor momento.
— Eu e o Daniel éramos vizinhos. — Falei sem querer dar mais detalhes.
— Não apenas vizinhos amor. — Jamie rosnou — Ele se voltou para a mesa e olhou para o Daniel. — Estavam noivos até que apareci e a tomei pra mim.
— Jamie... — sussurrei e ele me encarou. Todos na mesa ficaram em silêncio e eu me senti uma puta. Ele deixou claro que estava com os dois ao mesmo tempo.
— A vida é assim. — Daniel falou. — Os relacionamentos terminam, ciclos se fecham e outros recomeçam. — Beijou a Micaela. — O que seria da vida sem os tropeços e recomeços? — Daniel estava me preservando. Eu olhei com agradecimento e ele entendeu. — O pai da Tita que era o meu padrinho dizia que tudo que é certeza era incerto. Eu nunca entendi essa merda. — Todos riram. Jamie apertou a minha coxa e cravou as unhas na carne. Eu respirei fundo. Eu tentava me focar na conversa mas não conseguia. — ... Não é Tita? — Daniel falou mas não tinha escutado.
— Desculpe não entendi.
— Estou falando sobre a Dinda e o último álbum que lançou. O conto, não é? — neguei.
— "Nós" foi o último. O Conto foi antes.
— Eu preciso ouvir essa Diva — Carl falou animado.
— Não tenho nada dela aqui. — Tentei falar com entusiasmo. Olhei para o Jamie e notei que ele estava olhando uma mulher no bar e que ela retribuía. Aquilo me matou por dentro. Eu tirei a minha mão de sua perna e me afastei o quanto consegui. A comida chegou mas nada me desceu. Levantei e Jamie segurou meu braço.
— Vou ao banheiro. — Avisei e não esperei que falasse nada. Corri daquela lugar. Entrei no banheiro e quis bater em alguma coisa. Passei a mão molhada em minha nuca tentando esfriar minha cabeça. Minha vontade era sumir daquele jantar idiota. Eu não conseguia pensar direito e precisava de alguma coisa mais forte que champanhe. Olhei meu reflexo no espelho e parecia a noiva cadáver. Puta merda! Meus olhos estavam cansados da viagem e escuros ao redor. O batom tinha saído e para piorar, Jamie quase arrancou minha pele com os dentes. Meu pescoço estava com manchas roxas por toda parte. Mascas de dentes no meu ombro direito. Eu não queria imaginar as costas. Por isso Daniel não me olhou. Deve ter visto a aberração que me tornei. Lavei o rosto com mais vontade e tirei o pingo de maquiagem borrada. Que desgraça. Nunca me vi tão feia na vida. Respirei fundo e tentei tirar a imagem dele olhando outra mulher. Estava difícil. Voltei para a cabine do banheiro e chorei. Eu nunca chorei tanto em tão pouco tempo. Eu tentava para mas tudo estava mal. Eu não conseguia ficar bem. Novamente voltei para pia e lavei meu rosto. Meu olho já estava vermelho, assim como meu nariz.
Deixei o banheiro e o assei pelo balcão do bar. Pedi duas doses de tequila. Virei com vontade. Se era para ficar feia e aturar aquela merda, precisa estar chapada. A tequila queimou o estômago. Quando voltei a mesa, minha taça estava cheia com champanhe. Virei tudo com vontade. Agora sim comecei a relaxar. Joguei toda a tensão para o inferno e me senti mais leve. Não fui eu que convidei o Daniel, então que se fodam todos. Olhei novamente as pessoas ao meu redor e estavam Carl, o cara que o Jamie quer colocar como chefão. Logo em seguida a esposa dele, que não sei o nome. Daniel e seu charme incontestável, Micaela e outro casal. Que se foda! Não lembrava da metade das pessoas que estavam na mesa.
— Pare de beber. — Jamie tentou pegar a minha taça mas fui rápida e coloquei fora do seu alcance.
— Não se mete comigo hoje, Jamie. Não estou muito feliz com você. — Ele fingiu sorrir. — Qual é a graça?
— Você é minha esposa, não esqueça disso.
— Nunca esqueci mas você parece não se importar com isso. — Quando bebi o champanhe fiquei tonta demais. Olhei para o lado onde tinha um deck e algumas pessoas dançando. Tocava salsa e sorri vendo um casal descoordenado. Os dois não ligavam para nada ou ninguém. Estavam felizes. Eu queria estar feliz. Pensei que essa noite seria assim com o Jamie. Nós dois sorrindo enquanto tentávamos dançar. Talvez andarmos descalços na praia, beijar muito e fazer amor a luz da lua. Como os filmes melosos e frufru. Olhei para o Jamie que me encarava buscando qualquer vacilo. Como é bonito esse puto. Todo raivoso e ciumento. Todo desconfiado e protetor. Segurei seu rosto e vi a surpresa em seu olhar. — Eu amo você. — Esperei que dissesse o mesmo mas travou o maxilar.
— Eu não acredito. — Foi doloroso demais ouvir a sua desconfiança. A única coisa que fiz para esse homem foi dar amor incondicional e olha o que recebir. Levantei e segurou em meu braço.
— Onde vai? — Também levantou arrumando a camisa.
— Banheiro. — Deixei ele lá todo pomposo. Eu não fui ao banheiro. Eu sai do restaurante. Queria dar uma volta e ficar longe do Jamie e do Daniel. Queria beber e dançar. Passei na recepção e pedi uma indicação de lugar para fazer essas duas coisas. A moça chamou até um motorista particular para me levar. Tudo na conta do Jamie. Eu achei um máximo porque não sabia se o cartão que o Jamie me deu passava aqui. Mas não importava. Já fui em muitas baladas sem um real no bolso e sempre bebia horrores. Em quinze minutos já estava no bar pedindo um drink e por sorte o cartão era internacional. Ou seja, tudo por conta do marido rico. Pequei minha taça cheia e fui para o meio da pista de dança.

Louca ObsessãoOnde histórias criam vida. Descubra agora